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NOVOS TEMPOS
Sedentarismo e tempo abusivo diante das máquinas podem levar a "envelhecimento" precoce de ossos e músculos
Computador expõe criança a lesão muscular
AMARÍLIS LAGE
FABIANE LEITE
DA REPORTAGEM LOCAL
Uma geração de crianças e adolescentes que cresceu familiarizada a palavras como mouse, internet e CD-ROM ainda não aprendeu a utilizar o computador de
uma forma que não traga prejuízos à saúde. As máquinas espalham-se pelas escolas, e pais instalam o último modelo em casa sem
qualquer adaptação para o universo infanto-juvenil.
A preocupação foi um dos temas discutidos no último Congresso da Associação Internacional de Ergonomia, no fim de agosto, na Coréia do Sul, e movimenta
especialistas também no Brasil. A
chamada é para a necessidade de
padronizar uma orientação.
O problema principal do mau
uso do computador por jovens e
crianças são os efeitos futuros,
afirmam os especialistas. "A possibilidade teórica é que o uso abusivo levaria, no futuro, a um "envelhecimento" precoce de ossos e
músculos", explica Maria Helena
Kiss, livre-docente da Universidade de São Paulo e especialista em
reumatologia infantil.
O sedentarismo associado ao
uso abusivo do computador prejudica a formação de massa óssea
e muscular, o que pode trazer precocemente prejuízos como dores
nas costas e nos tendões, típicas
da terceira idade.
Essa questão é fundamental em
uma sociedade cada vez mais informatizada. Segundo o Mapa da
Exclusão Digital, realizado pela
Fundação Getúlio Vargas, o número de "informatizados" passou
de 17,3 milhões, em 2000, para
26,7 milhões em maio deste ano.
Levantamentos do Ibope mostram que o jovem brasileiro é um
dos que mais passa horas na internet, chegando, em alguns meses, a
liderar o ranking, superando os
norte-americanos e os japoneses.
Na última medição, feita em setembro, o uso na faixa etária dos
12 aos 17 anos (13h14min por pessoa por mês) supera o da população em geral (12h27min).
Para o ortopedista Sérgio Bruschini, que já atendeu crianças
com dores no pescoço e nas costas
devido ao uso do computador, a
principal causa dos problemas de
saúde relacionados às máquinas é
o tempo gasto na frente da tela.
Segundo ele, as crianças já adotavam posturas erradas ao escrever nas cadeiras escolares, ao
brincar de botão, ao aprender piano. Mas isso era compensado pela
prática de outras atividades, como natação e futebol. "A utilização moderada não leva a má postura ou lesão de esforço repetitivo. O problema é quando eles viciam em jogos e passam horas no
computador", diz Bruschini, autor do livro "Ortopedia Pediátrica
- do Nascimento à Adolescência".
O adolescente D., 15, se enquadra nesse perfil. Ele usa o computador cerca de dez horas por dia,
há três anos, e não pratica nenhuma atividade física. Aos sábados,
costuma passar até 13 horas seguidas jogando em lan houses (lojas para jogos em rede).
"Ele está obeso e desenvolveu
cifose (um tipo de desvio na coluna) devido aos maus hábitos",
afirma a tia, que é fisioterapeuta.
"Dizem que jogar demais trava os
dedos, mas eu nunca senti nada",
contesta o jovem. Segundo Kiss, a
maior "plasticidade" dos ossos e
músculos de crianças e adolescentes pode explicar a falta de dores
no presente. Além disso, a relação
de "afetividade" com o computador pode fazer com que os sintomas não façam diferença.
Um estudo feito por um grupo
da USP mostrou que nem nas escolas há móveis adaptados para
crianças e jovens utilizarem computadores (veja na página C3).
"Se a criança tiver essa consciência na escola, levará isso para
casa", afirma Lys Esther Rocha,
professora de Departamento de
Medicina Legal, Ética Médica e
Medicina Social do Trabalho da
Faculdade de Medicina da USP.
Rocha tem em casa mesa, cadeira e teclado adaptados para os filhos. Mas pais que tentarem fazer
o mesmo não terão muita facilidade: há poucos produtos no
mercado. "Há alguns anos pensamos em uma linha para crianças",
diz Rodrigo Chamorro, diretor
técnico de empresa que desenvolve móveis ergonômicos. "O projeto não vingou. Os pais não querem um móvel adaptado. Dizem
que os filhos crescem depressa."
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