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SAÚDE
Cardiologista propõe a radicalização do tratamento para evitar mortes por doenças cardiovasculares
Médico quer mais rigor contra colesterol
DA REPORTAGEM LOCAL
Não basta seguir as atuais recomendações internacionais sobre
os níveis de colesterol aceitáveis. É
preciso baixar ainda mais essas
metas para evitar as mortes por
problemas cardiovasculares.
O alerta é do médico Allan Gaw,
da Universidade de Glasgow, 49,
na Escócia, que esteve nesta semana no Brasil, participando do
Congresso Brasileiro de Cardiologia, no Rio de Janeiro. Para ele, é
melhor reduzir drasticamente o
colesterol "ruim" do que manter
os níveis no padrão recomendado
pelas diretrizes norte-americanas.
No congresso, o especialista
apresentou um estudo em que
mostrou que uma abordagem
agressiva no tratamento de pacientes com síndrome coronariana aguda (infartados ou prestes a
ter um infarto) ocasiona maior diminuição dos níveis de colesterol
e, conseqüentemente, redução na
morbidade e mortalidade.
Foram acompanhados 4.497
pacientes entre 1999 e 2003, selecionados em 322 centros de pesquisa de 41 países. Entre os pacientes que receberam um tratamento agressivo -com doses
diárias de 40 mg de estatina no
primeiro mês e 80 mg a partir do
30º dia- houve 25% a menos de
mortes cardiovasculares em relação ao grupo tratado com a terapia tradicional.
As novas diretrizes do Programa Nacional de Educação do Colesterol (EUA) recomendam que
pacientes com alto risco para problemas cardíacos devam manter
as taxas de colesterol "ruim" abaixo de 70 mg/dL. As diretrizes européias e brasileiras estabelecem
como meta uma taxa abaixo de
100 mg/dL. A seguir, os principais
trechos da entrevista dada à Folha
por e-mail.
(CLÁUDIA COLLUCCI)
Folha - A redução proposta nos
níveis do colesterol vale para qualquer país? No caso do Brasil, não
seriam necessários estudos prospectivos e randomizados para que
as novas metas fossem aplicadas?
Allan Gaw - As novas metas são
baseadas em diferentes linhas de
evidência e são provavelmente
aplicáveis nas Américas do Sul e
do Norte e na Europa [.]
Folha - Qual é o critério para se
adotar um tratamento mais agressivo na redução do colesterol ruim?
Gaw - As novas metas são destinadas a pacientes de alto risco, ou
seja, aqueles que já sofreram ataques cardíacos ou que estão com
os níveis de colesterol ruim elevados, por exemplo.
Folha - Que tipo de efeitos colaterais pode causar essa terapia mais
radical ao paciente?
Gaw - Não há notícia de efeitos
colaterais importantes nessas novas terapias de redução do colesterol. Tudo o que irá acontecer é
que teremos mais eficácia na redução do risco de doenças cardiovasculares. Sempre haverá efeitos
colaterais associados ao uso de
drogas, especialmente [ ] se doses
elevadas têm que ser usadas para
atingir as novas metas [. ] Com as estatinas, que são as drogas mais comuns usadas na redução do colesterol, os efeitos colaterais são raros, mas alguns pacientes podem
desenvolver problemas no fígado
ou nos músculos [.] Essas drogas devem ser evitadas na gravidez.
Folha - Hoje sabe-se que metade
das mortes por infarto não estão
relacionadas às altas taxas de colesterol, mas sim a uma inflamação
nas paredes da artéria. O que o sr.
pensa sobre isso?
Gaw - A inflamação é a característica-chave no desenvolvimento
dos ataques cardíacos, mas o fato
é que você precisa de colesterol
para o ataque cardíaco. Até pacientes com níveis de colesterol
considerados normais podem desenvolver ataque cardíaco. [ ] Há
muitas pesquisas procurando
analisar o impacto das drogas antiinflamatórias no risco de ataque
cardíaco, mas têm sido inconclusivas. No entanto sabemos que os
níveis baixos de colesterol funcionam e podem reduzir o risco de
20% a 40%.
Folha - Ao se propor reduções ainda mais drásticas nas metas de colesterol, não corremos o risco de ficar ainda mais dependentes dos
grandes laboratórios que produzem essas drogas?
Gaw - A redução do colesterol
deve, primeiro, ser responsabilidade do próprio paciente, com
mudanças no estilo de vida, como
dieta e exercícios físicos. Nós podemos acrescentar a isso as drogas que reduzem o colesterol. Até
o momento, na maioria dos países, elas só estão disponíveis com
a prescrição do médico. Mas eu
creio que, em razão de serem tão
seguras e efetivas, elas estarão
mais disponíveis no futuro. Neste
ano, no Reino Unido, a estatina
tornou-se disponível nas farmácias sem prescrição médica.
Folha - Hoje existe uma grande
preocupação em relação à baixa
adesão do paciente ao tratamento
do colesterol. O que deveria ser feito para reverter esse quadro?
Gaw - Em razão de as drogas que
reduzem o colesterol não fazerem
as pessoas se sentirem melhor a
curto prazo, muitos pacientes param de tomá-las [. ] Estima-se que
perto da metade de todos os pacientes que começam com a estatina não vão além dos 12 meses. É
um grande problema porque, [ ] para conseguir benefícios com essas
drogas, é preciso tomá-las a longo
prazo. O melhor caminho é a educação. Médicos e enfermeiras devem enfatizar a importância do
tratamento, orientando seus pacientes [.] Os benefícios vêm mais
tarde, com o acréscimo de anos
saudáveis.
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