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DANUZA LEÃO
Um gato
De uns 30 dias para cá, entrei
num novo universo: o dos
adoradores de gatos.
Foi assim: resolvi ter um e procurei saber com um amigo quando haveria uma feira para comprar um lindo filhote etc. e tal. Ele
foi logo me dizendo que nada disso, que o melhor gato é o vira-lata, e me deu o telefone de outro
amigo, que me deu o telefone de
outro amigo, e assim sucessivamente; aí conheci (só por telefone)
um grupo de pessoas simpáticas e
prestativas, sempre prontas a ajudar com um conselho, uma informação, uma explicação psicológica sobre o comportamento dos
gatos, e com as quais me comunico com frequência.
Aprendi que gatos não se compram, se adotam, e são os membros dessa confraria informal que
fazem a intermediação entre
quem está querendo um e quem
está com uma ninhada em casa. E
tem mais: como existem lugares
na cidade onde os sem nenhum
coração abandonam os filhotes,
eles costumam ir a esses lugares
para recolhê-los e encaminhar
para a adoção. A pessoa que me
confiou o meu tem 36 em seu
apartamento.
Antes de Haroldo -é o nome
dele- chegar, fui a uma loja especializada comprar um pequeno
enxoval, digamos assim, para recebê-lo. Cheguei em casa com um
tipo de banheirinho, areia, caminha, ração para filhote, patê em
lata, vasilhas para comida e bebida e brinquedinhos. Embatuquei
quando o vendedor me perguntou de que sabor queria a ração:
de peru, de galinha, de peixe? Nacional ou importada? E como escolher, sem conhecer seu paladar?
Quando Haroldo chegou, minha vida mudou. Ele não me larga um só minuto, e tirando a hora
em que se instala no teclado do
computador ou se coloca exatamente entre meus olhos e o jornal
ou a televisão, é uma delícia que
nem dá para contar. Tão grande
que nos primeiros dias eu não
conseguia sair de casa para não
deixá-lo sozinho. Resultado: agora tenho também uma gatinha
(ainda sem nome) no pedaço, para que ele não se sinta muito só
na minha ausência. E o pior: estou ficando gagá, e quando saio
fico querendo voltar logo para casa, tantas as saudades.
Eles retribuem e me amam de
paixão, uma paixão total e incondicional. Os dois são pequenos,
me seguem pela casa onde eu for,
se enrolam no meu pescoço para
dormir -ainda bem que não estamos no verão-, e quando o veterinário disse que seria aconselhável a castração e a esterilização, quase chorei, e telefonei para
meus novos amigos para ter uma
orientação sobre o assunto.
Sabe o que me disseram, to-dos?
Que é preciso castrar e esterilizar,
sim. Mas por que, perguntei, vocês que gostam tanto de gatos,
não têm pena?
Exatamente por isso, foi a resposta. Se não for feito um tipo de
planejamento familiar, os gatinhos que nascerem serão abandonados nos parques da cidade e
vão morrer de frio e de fome. É
por amor, por muito amor -e
consciência- que é preferível
que nasçam menos gatos, já que
não existem lares suficientes para
adotá-los.
Foi impossível não fazer um paralelo com a infinidade de
crianças abandonadas nos sinais
de trânsito e nas Febens da vida,
sem ter quem cuide delas e a cada
ano nascendo mais e mais,
algumas de mães de 13, 15 anos,
sobretudo no Nordeste, terra do
presidente Lula, que conhece o
problema melhor do que qualquer um de nós.
Conhece, mas não fala no assunto; nem ele nem uma só pessoa do governo. Por que será?
E-mail - danuza.leao@uol.com.br
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