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Programas de caráter assistencial não garantem melhora do ensino na rede municipal, afirmam educadores
Para especialistas, falta projeto pedagógico
DA REPORTAGEM LOCAL
Para educadores ouvidos pela
Folha, as ações de educação da
prefeitura não são orientadas por
um projeto pedagógico claro, que
priorize determinados métodos
de ensino e capacitação de professores, por exemplo. Segundo eles,
a opção por programas de caráter
assistencial, como a distribuição
de uniformes e de material escolar, não garante a melhora do
aprendizado.
Na opinião da educadora Maria
Malta Campos, pesquisadora da
Fundação Carlos Chagas, a atual
gestão ainda deve à sociedade a
definição de propostas claras de
orientação curricular e capacitação de professores. "Há uma certa
desorientação. A proposta pedagógica ainda é muito genérica",
afirmou.
"Quando se constrói um CEU
[Centro Educacional Unificado]
em vez de 12 EMEIs [escolas de
ensino infantil], ou quando se dá
uniformes, é uma opção de política educacional. Mas isso não está
claro. Falta transparência sobre as
opções que são tomadas quando
se tem poucos recursos."
Ela acredita que o "entra-e-sai"
de secretários da Educação, no
início da gestão, acabou prejudicando a implantação de um plano
pedagógico para a rede. Antes da
atual secretária, Maria Aparecida
Perez, passaram pela pasta os
educadores Fernando de Almeida, Nélio Bizzo e Eny Maia.
Na avaliação da educadora Elvira Souza Lima, que presta consultoria para sete prefeituras, proporcionar boas condições materiais aos alunos melhora as condições de aprendizado, mas não resolve. "Se fosse assim, não haveria
déficit de aprendizagem no Japão
e nos Estados Unidos. É fundamental que isso venha acompanhado por uma proposta consistente de ensino."
Para ela, o material deveria ser
definido pelas próprias escolas,
segundo suas necessidades. "Em
Coronel Fabriciano [MG], por
exemplo, foi incluído um alfabeto
móvel para alunos com dificuldade de aprendizagem."
Para Célio Silva, 44, secretário-executivo da ONG Missão Criança, "os resultados desse tipo de
ação e de benefício, vistos fora de
um contexto de Bolsa-Escola, que
evita que a criança trabalhe, são
menos efetivos do que quando
eles estão em uma política integrada". "Sem políticas estratégicas, as iniciativas da educação
caem em um espaço, no mínimo,
nebuloso", avalia.
Universalidade
Mesmo com ressalvas, os educadores reconhecem a importância de programas que beneficiam
alunos pobres e suas famílias. "Há
pesquisas que mostram que as
crianças se sentem humilhadas
quando não têm o material. Isso é
um fator de afastamento da escola", afirma Maria Malta Campos.
Mas alguns especialistas consideram desnecessário o caráter universal das iniciativas.
O programa mais polêmico é o
dos uniformes. Leny Magalhães
Mrech, professora da USP especialista em educação inclusiva,
afirma que a reação dos alunos ao
receber o uniforme vai da comemoração à rejeição total. E isso
implica desperdício.
Visibilidade
Para Campos, a distribuição de
uniformes tem forte apelo popular e dá visibilidade política, o que
não acontece com outras questões que influem diretamente no
desempenho escolar do aluno,
como um professor motivado e
capacitado, menor número de estudantes por classe e um prédio
escolar bem equipado.
Elvira Souza Lima também não
considera o uniforme uma prioridade. Propiciar materiais para o
desenvolvimento da memória da
criança ou melhorar as condições
da escola para o aprendizado são
necessidades mais urgentes, na
opinião da educadora.
Em defesa da prefeitura, o ex-secretário municipal da Educação
Fernando Almeida afirma que os
três programas "tem de ser avaliados em conjunto, porque assim
fazem uma diferença notável para
os alunos da escola pública". Para
ele, essas ações devem ser avaliadas em conjunto. "Se cada uma
delas for descontextualizada, será
considerada assistencialista e
panfletária".
O programa mais elogiado pelos educadores é o do transporte
gratuito. "Estudar pressupõe a
condição de chegar à sala de aula e
de voltar para casa. Uma das principais causas de morte de crianças
na periferia de São Paulo é atropelamento. Quando a prefeitura dá
transporte a uma criança que ia a
pé para a escola, viabiliza não só a
educação, mas também a sobrevivência da criança", diz Almeida.
Monitoramento
A ONG Ação Educativa analisou os recursos investidos pelo
município em educação em 2003.
Para a entidade, a secretaria destinou "recursos substanciais a esses
programas [de educação inclusiva] e na construção dos CEUs, ao
passo que focos fundamentais,
como educação de jovens e adultos e formação, não receberam a
mesma prioridade".
"Questionamos a ênfase dada a
esses programas [de educação inclusiva] em relação às demais demandas para uma educação de
qualidade. É importante termos
uma melhor visibilidade da distribuição de recursos para compreendermos com maior clareza a
escala de prioridades da secretaria", avalia Camilla Cruso Silva,
coordenadora do programa Observatório da Educação e da Juventude da ONG.
(CC e FM)
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