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CIDADANIA DIGITAL
Programa da USP cria redes com diferentes grupos sociais, que têm papel ativo na produção de conhecimento
Internet abre universidade para a periferia
EDNEY CIELICI DIAS
DA REDAÇÃO
Francinete Quintos de Oliveira,
27, é monitora de internet no Jardim São Luís, na zona sul de São
Paulo. Ela tem uma maneira própria de explicar o conceito de rede
-com base em sua experiência
pessoal. "Na periferia, existem redes reais, as pessoas dependem
umas das outras, criam laços solidários. A internet é virtual. Mas as
duas redes somadas podem criar
uma realidade própria."
Francinete ganha R$ 400 mensais por uma jornada diária de
seis horas em um infocentro, serviço gratuito de internet do governo estadual (Acessa São Paulo).
Ela completou o ensino médio.
Agora, aperfeiçoa seus conhecimentos e troca experiências na
USP, a maior universidade pública brasileira. "Nós vivemos realidades muito diferentes. Eu também sei coisas que eles, na universidade, não sabem."
A sua porta de entrada para o
mundo acadêmico é a Cidade do
Conhecimento, programa institucionalizado pela Universidade de
São Paulo no mês passado.
Elos criativos
Seguindo seu processo de consolidação, a Cidade do Conhecimento coloca em prática neste semestre dois projetos cruciais para
atingir o seu objetivo principal,
que é formar redes de conhecimento com a participação ativa
de setores da sociedade.
O projeto Gestão de Mídias Digitais, do qual Francinete participa, começou há três semanas e
agrega 170 monitores de postos
públicos de acesso gratuito à internet, instalados, em sua maioria, na periferia da capital.
Já o Dicionário do Trabalho Vivo é uma iniciativa que cria uma
rede de discussão para tratar de
temas relacionados ao emprego.
Nela estão reunidos alunos do ensino médio e da universidade,
professores, especialistas e pessoas ligadas a comissões municipais de emprego, entre outros.
Nesse universo heterogêneo, são
formados subgrupos para discutir temas específicos e consolidá-los na forma de verbetes.
Os dois projetos somam-se a
um mais antigo, o Educar na Sociedade da Informação, voltado a
professores do ensino fundamental e médio e que está em sua segunda edição neste ano.
Via de mão dupla
A Cidade do Conhecimento
pretende tornar mais democrático o acesso à universidade.
A tecnologia possibilita a mais
pessoas -numa escala, teoricamente, ilimitada- o acesso ao
que é produzido na instituição. A
proposta é que os grupos, unidos
em rede, troquem experiências e
informações, produzam conhecimento e tragam questões que estimulem o debate e a pesquisa.
"É um novo espaço público, em
que ensino, pesquisa e extensão se
associam ao fomento de comunidades organizadas digitalmente.
A hipótese é que as economias capazes de desenvolver essas redes
sejam mais competitivas. Na academia, isso é conhecido como
pesquisa-ação", resume o diretor
acadêmico da Cidade do Conhecimento, o economista e sociólogo Gilson Schwartz, 42.
A interação criativa é vista como
um processo de mão dupla. "Sou
um entusiasta do projeto. É muito
importante que a universidade
não fique isolada. A troca ajuda a
entender a sociedade de uma forma mais ampla e a agir como ela
deseja", diz Vahan Agopyan, 50,
diretor da Escola Politécnica, uma
das unidades da USP que dão suporte à Cidade do Conhecimento.
"A Politécnica defende o relacionamento com o meio em que a
universidade se insere. Achamos
que ele tem de ser mais intenso
ainda. Queremos mais."
O pró-reitor de Cultura e Extensão Universitária, Adilson Avansi
de Abreu, 58, analisa a iniciativa
no contexto do processo de valorização das atividades de extensão, que passou a ocorrer de forma mais acentuada na USP a partir de 1988. "No ano passado, por
exemplo, tivemos mais alunos de
extensão do que a soma dos alunos da graduação e da pós-graduação. É um processo positivo,
que valoriza a relação da universidade com a comunidade."
Na avaliação de Imre Simon, 59,
coordenador do grupo de estudos
de informação e comunicação do
Instituto de Estudos Avançados
da USP, a Cidade do Conhecimento "está indo muito bem". Ele
pondera que o programa funciona como um laboratório.
"Não sabemos os limites do
processo e até que ponto podemos produzir conhecimentos novos com essa sistemática. Todos
estão aprendendo", diz Simon.
Thomas Rose, 47, engenheiro
do IPT (Instituto de Pesquisas
Tecnológicas), deu uma palestra
na Cidade sobre os meios tecnológicos e a educação a distância. Ele
destaca o papel da tecnologia.
"O desenvolvimento da web é
uma ameaça ao modelo tradicional de universidade. Nesse contexto, ela tem de mudar."
Alexandre Loloian, 53, coordenador do Observatório do Futuro
do Trabalho, da Secretaria de Estado do Emprego e Relações do
Trabalho, ressalta o caráter social
do programa. "A interatividade é
importante para descobrir formas de inclusão social. Queremos
invadir a USP. Conhecimento para quem precisa dele!"
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