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SAÚDE
Pesquisa com 400 crianças concluiu que as expostas a animais de estimação tiveram a metade das chances de se tornar alérgicas
Estudo diz que cão pode evitar alergia
CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL
Permitir ou não que os filhos
convivam com cães e gatos é uma
dúvida que atormenta a vida de
muitos pais. O senso comum diria
que os pêlos dos animais podem
causar alergias, mas um estudo
publicado no "Jornal da Associação Médica Americana" mostra
que a história não é bem assim.
Um grupo de pesquisadores
analisou 400 crianças durante sete
anos e descobriu que aquelas que
estiveram expostas a dois ou mais
animais de estimação tiveram a
metade das chances de se tornarem alérgicas.
Reações alérgicas são causadas
quando um anticorpo chamado
imunoglobulina-E se associa a
uma célula sanguínea chamada
célula-mestre. Ao se ligar ao anticorpo, a célula-mestre libera
substâncias químicas que causam
as inflamações.
Há pelo menos mais quatro estudos recentes sugerindo que o
convívio nos primeiros anos de
vida com cães e gatos possa permitir que o corpo construa defesas contra os agentes capazes de
produzir alergia (alergênios).
Mas atenção: os pediatras aconselham os pais a manterem as
crianças que já são alérgicas longe
do convívio desses animais para
evitar o agravamento dos sintomas da inflamação.
Em entrevista à Folha, o cientista que liderou o estudo americano, Dennis Ownby, da Faculdade
de Medicina da Geórgia (EUA),
disse acreditar que as endotoxinas (toxina encontrada no interior da célula bacteriana) encontradas na boca de um cachorro ou
de um gato possam ter uma influência positiva no sistema imunológico da criança.
Ele afirma que a saliva, as fezes e
a urina de cães e gatos transferem
muitas bactérias do tipo gram-negativo e isso pode mudar a forma
como o sistema imunológico da
criança reage a essas bactérias,
ajudando a protegê-la contra as
alergias.
Para Ownby, os resultados do
estudo estão de acordo com o que
os médicos chamam de "hipótese
da higiene". A tese é que o sistema
imunológico de pessoas que crescem em um ambiente limpo demais, sem contaminantes ambientais, pode reagir em excesso
quando se depara com substâncias que provocam alergia.
Segundo Charles Naspitz, 66,
presidente do Departamento de
Alergia e Imunologia da Sociedade Brasileira de Pediatria e professor da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), essa tese não
se aplica ao Brasil porque a maioria da população vive em condições de higiene precárias e nem
por isso está livre de alergias.
Segundo Naspitz, um estudo
feito há três anos com 30 mil estudantes brasileiros mostrou que
20% deles eram alérgicos. O Brasil
ocupa o quinto lugar no ranking
de países com maior prevalência
de doenças alérgicas, perdendo
para o Reino Unido, a Austrália, a
Nova Zelândia e os EUA.
Naspitz diz que o estudo, que
envolveu 60 países, revelou ainda
que nos últimos 30 anos houve
um aumento na prevalência de
asma. Uma das hipóteses para explicar esse aumento seria a do excesso de higiene.
Segundo Luisa Karla de Paula
Arruda, 43, professora do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto,
é preciso analisar a pesquisa com
cautela. Ela diz que ainda não é
possível afirmar se o efeito protetor das alergias é realmente originado das endotoxinas encontradas nos animais.
Charles Naspitz lembra que, para que seja desencadeada uma
reação alérgica, é preciso que a
pessoa tenha uma carga genética
que possibilite isso.
"O animal pode, em tese, proteger a maioria dos indivíduos, mas
não posso dizer que isso vá acontecer para o indivíduo A ou B. Na
maioria dos casos, é provável que
a exposição tenha efeito protetor,
mas essa proteção não é de 100%.
Uma parte pode se sensibilizar."
Para a pediatra Maria Regina
Guillaumon, desde que não interfira no desenvolvimento e no
crescimento das crianças, a presença de um bicho de estimação é
benéfica.
Segundo o veterinário Renato
Miracca, 36, o estudo deve provocar muitos questionamentos. "Às
vezes o cão é retirado sumariamente de casa, mas a reação alérgica pode estar sendo causada por
outros fatores, como o cigarro e a
poeira do ambiente", diz.
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