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DANUZA LEÃO
Olho ruim
O olho das pessoas pode ser
uma coisa terrível. Por ele
você sabe, sem que uma só palavra seja dita, se é sim ou se é não
-seja qual for o assunto-, e até
se é talvez. Pelo olho dá para saber se há alguma simpatia pelo
que você está querendo, seja um
convite para jantar, a compra de
um carro ou a tentativa de fazer
um negócio escuso.
Pelo olho se percebe quando alguém é capaz de matar -o brilho
do olho muda e fica frio, com brilho de faca, como dizia uma antiga canção; embora mais raro, fica
muito claro quando o outro se enternece por uma história que está
sendo contada e também quando
fica inteiramente indiferente a
ela. Se está louco para que a pessoa vá embora ou, ao contrário,
inventando assunto para que fique. Até mesmo pelo telefone,
quando não se vê olho nenhum,
dá para sentir o clima; qualquer
clima.
Ruim mesmo é quando existe
uma relação legal entre dois amigos, por exemplo, e um deles -só
um deles- está bem de vida.
Eles, que tantas vezes trocaram
confidências, saíram para se divertir, às vezes quase choraram
um no ombro do outro -quase
porque homem não chora- por
causa de uma vadia qualquer;
mas um dia se encontram num
escritório, um dos dois precisando
de um dinheiro emprestado. Que
vai pagar, é claro, mas não sabe
exatamente quando. Nessa hora
o olho do outro muda e fica frio
como uma pedra de gelo.
Pode ser até que ele empreste
-geralmente uma quantia menor do que o outro precisa-, e
pode ser também que apresente
um papel para ser assinado. E se
for um banqueiro, ainda tem os
juros.
A partir desse momento, as relações entre os dois terão se modificado. Não deveria, mas a vida
não é o que deveria ser, mas o que
é. O que pediu o dinheiro não vai
gostar de assinar nenhum papel
em garantia do empréstimo, o
que emprestou preferiria não
misturar amizade com negócios.
Trincou, e o melhor que teria feito
o mais rico seria entregar um dinheiro na mão, mesmo menor do
que o pretendido, e dizer que é
um presente -e mesmo assim vai
trincar.
Mas tem pior -muito pior. É
quando, depois de uma relação
de muito amor e muita paixão,
um dos dois quer ir embora
-apaixonado por outra pessoa.
É claro que no início ele vai negar de pé junto, vai jurar que não
tem ninguém etc., mas quem está
sendo abandonado é sensível a
qualquer sinal, e um dia não dá
mais para negar. Até que isso
aconteça ele está olhando com remorso, por estar fazendo ela sofrer, com culpa e até pena da mulher que um dia amou. Tudo bem;
faz parte da vida, vai ser duro,
mas um dia vai aparecer outra
pessoa e esse sofrimento vai fazer
parte do passado, como tantos
outros.
Mas duro, duro mesmo, é quando ela percebe que ele olha de outro jeito. Para começar, evita;
olha só o necessário, rapidamente, para que os olhos não se encontrem durante muito tempo. Aí
vem uma conversa sobre o fim de
semana, ela pergunta se as crianças não poderiam ficar com ele, já
que ela tem que fazer a mudança,
só que o fim de semana dele já está mais do que programado.
Nessa hora ele olha para ela como se nunca tivessem sido nem
ao menos amigos e é aí que o olho
muda: fica gelado. E quando você
percebe, fica gelada também.
Gelada por compreender que,
na hora em que o tal do ser humano está cuidando de seus interesses pessoais, vira bicho.
Desse olho a gente nunca esquece, de tão ruim que ele é.
E geralmente é de homem.
E-mail - danuza.leao@uol.com.br
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