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EXCLUSÃO
Coordenador de ações municipais diz que emancipação econômica de beneficiados esbarrou em estagnação do país
"Tentamos, mas o bonde não passou"
DA REPORTAGEM LOCAL
Com mais de 40 anos, dona Maria foi selecionada para o Começar de Novo. Recebeu R$ 160 por
mês, fez curso de cidadania e ajudou a organizar os estudantes na
saída de uma escola do bairro.
Seis meses depois, porém, o período da bolsa terminou. E dona
Maria voltou a viver de bicos.
Há Marias de Parelheiros a Brasilândia. Do Rio Pequeno a Guainazes. O destino das famílias depois do fim do período de transferência de renda é uma das incógnitas dos programas sociais, pois
nunca houve acompanhamento
dos que perderam as bolsas.
Sem estudos, o governo municipal já admite que a perseguida
emancipação econômica dificilmente chegou à porta dessas pessoas, frisa que até em países desenvolvidos de 10% a 30% da população depende de transferência
de renda, mas confirma que a miséria possivelmente aumentou na
periferia da capital nos últimos
três anos -período em que mais
de meio bilhão de reais foi distribuídos pelos programas sociais.
"Com os índices de desemprego
a que chegamos, não vai me surpreender se a pobreza tiver crescido. Mas poderia ter sido pior. Em
vez de 20% de desempregados,
poderíamos ter 25%. Talvez seja
esse o limite de ação dos municípios -conter essas pessoas fora
do mercado de trabalho", afirma
Marcio Pochmann, secretário de
Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade da prefeitura.
Embora diga que empregos não
eram sua principal preocupação,
o governo reconhece que não chegou exatamente aonde sonhava.
"Acreditávamos que, com a estabilidade monetária e o crescimento econômico, tudo o que nós
faríamos seria pró-cíclico", continua o secretário. "Pegaríamos o
cara que o crescimento normalmente não atinge, tiraríamos da
necessidade de sobrevivência de
curto prazo, daríamos capacitação e deixaríamos pronto para pegar essa onda, esse bonde do crescimento. Tentamos, mas o bonde
não passou. Você pode chegar à
conclusão de que são débeis os resultados, mas não há milagre."
O sumiço do bonde tem reflexo
claro nos resultados obtidos pela
prefeitura nos chamados programas emancipatórios -que pretendem fazer o sujeito passar a garantir sua própria renda. Neles, os
beneficiários não chegaram a 12
mil até agora.
"Os dados mostram que os programas são bastante paliativos,
sem escala e com pouca capacidade de inverter a situação no âmbito municipal. O alcance social
dessas iniciativas só será maior se
elas forem somadas a ações de impacto em setores econômicos
com vocação de geração de emprego", diz o médico Jorge Kayano, 51, pesquisador de indicadores sociais do Instituto Pólis, uma
ONG paulistana com foco no desenvolvimento sustentável.
Kayano não defende a interrupção dos programas, mas sua vinculação a investimento capazes de
gerar novos postos de trabalho.
Carente de resultados, o fantasma do assistencialismo incomoda
o governo. Para a administração
municipal, o que se faz nos programas é exatamente combater
essa forma de política social.
"Estamos evitando o aprofundamento da exclusão, o maniqueísmo, o assistencialismo e o
clientelismo político-eleitoral",
sustenta Pochmann. "Hoje, de cada dez jovens, sete pressionam o
mercado de trabalho. Isso é o estoque da miserabilidade! E nós estamos agindo nele, garantindo
um contingente maior de pessoas
com mais escolaridade. Isso não é
importante?", questiona.
O governo calcula que de cada
R$ 10 de renda transferida, R$ 2
voltem para os cofres públicos em
forma de impostos ou de economia com educação e saúde, pois
os programas estariam reduzindo
doenças ligadas à subnutrição,
evasão escolar e violência.
"Isso é emancipação social e política. E emancipação política não
é votar na Marta. Não me interessa se as pessoas vão sair do programa e votar na Marta. Elas que
votem em quem quiserem. Me interessa é incentivá-las a escrever
de outra forma sua história."
(SÍLVIA CORRÊA)
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