São Paulo, domingo, 10 de novembro de 2002

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DANUZA LEÃO

Virando pelo avesso

Dentro de 50 dias teremos um novo governo; já se sente um cheiro de mudança no ar, mas como bem disse Chico Buarque, se você não mudar o Brasil não muda. Então aproveite, porque o tempo ruge.
Passe a valorizar coisas que antes nem via e deixe de lado outras sem as quais achava que a vida não tinha nenhuma graça. Não tenha medo: mudanças renovam o espírito, rejuvenescem e fazem bem à alma.
Comece a praticar: no lugar de ficar fissurada naquele jeans de grife que custa uma fortuna, capriche mais no charme. Talvez assim você faça menos sucesso com alguns amigos, mas isso não tem a menor importância: ou eles também mudam ou ficarão inteiramente fora de moda -e não é isso que sempre te interessou?
Valorize o que é nosso, e nas próximas férias vá conhecer Belém. É uma cidade linda, com casas deslumbrantes, ruas sombreadas por mangueiras que, dependendo da época, estarão carregadas de frutas. A gastronomia é das mais requintadas, e na hora das compras -viagem sem compras não existe- os perfumes exóticos vão embriagar mais o seu olfato do que todos os Chanel nš 5 do mundo. E o melhor: de graça, praticamente.
As grifes estrangeiras passam a fazer parte do passado, e se você comprar um sapato made in Brazil, além de estar economizando dólares, estará fortalecendo a indústria nacional -o que significa mais empregos- e ajudando a equilibrar as contas públicas. E ainda vai ficar no auge da moda, não é o que sempre quis?
No dia em que você ouvir a palavra mercado e não pensar no preço do dólar nem no maldito índice Nasdaq mas sim no mercado hortifrúti, onde se compram mangas, goiabas, cajus, batata doce e aipim, sua vida será infinitamente mais feliz, acredite. E quando alguém pronunciar a palavra bolsa, pense naquela linda que você viu numa loja; esqueça, pelo bem de sua saúde mental, que houve um dia em que bolsa era só a de valores -que maldição. Quando isso acontecer, os assuntos nas mesas de bar, onde se beberá mais chope e menos champanhe, serão mais leves, mais suaves, mais alegres.
Se algum playboy convidar você para passar um fim de semana em Angra -de helicóptero-, recuse. Sua reputação vai ficar não com uma mancha, mas com uma nódoa, daquelas que não saem nem com benzina. E aproveitando: já que Ronaldo, o fenômeno -que não perde uma de fazer seu marketing-, se ofereceu para ajudar no projeto para combater a fome, que ele seja mais generoso e contribua com parte da grana preta que ganhou no comercial daquele celular.
Contribuir só com a imagem, para quem tem tanto dinheiro, é piada. A onda musical vai passar por sérias transformações: saem os ritmos modernos, aqueles que quem passou dos 17 não conhece nem o nome, e entram os forrós, o pagode e o samba nos lugares badalados da cidade -que aliás vão ser outros.
Pessoas vão sair de moda, outras vão entrar, os cabelos tratados com alisamento japonês não vão estar com na-da e o bom mesmo vai ser uma cabeça cheia de cachinhos, cheirando a sabonete Phebo.
É isso mesmo, Lula: aumente os impostos sobre os cigarros -assim eu vou fumar menos-, sobre as bebidas estrangeiras -nossa cerveja é ótima-, e cobre 5% a mais na conta de todos os restaurantes, para ajudar no combate à fome. É justo, 5% não são nada, e se fizer realmente diferença no orçamento, a gente passa a comer menos na rua e fica em casa jogando truco. Na hora de pedir a caipirinha, que ninguém é de ferro, nada de vodca polonesa: peça a sua com cachaça, como aliás fazem os fotógrafos de moda e as top models internacionais que quando visitam o Brasil são tão paparicados.
O Brasil vai passar a ser moda aqui também, no dia em que as pessoas forem avaliadas mais pelo que pensam e fazem do que pela marca de relógio que usam ou pela etiqueta do tênis, aí sim, terá acontecido a grande mudança.
E se você quiser fazer parte dela, a hora é agora.

E-mail - danuza.leao@uol.com.br

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