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GILBERTO DIMENSTEIN
Como jogar emprego fora
Está nas mãos do ministro
do Trabalho, Jacques Wagner, a possibilidade de lançar o
mais amplo programa de que se
tem notícia para a juventude brasileira de 17 a 21 anos -o que, a
médio e longo prazo, tanto ou
mais do que o investimento em
repressão, ajudaria a combater a
criminalidade com eficiência.
Batizado de Primeiro Emprego,
o projeto prevê um gasto de R$
550 milhões só em 2003 para abrir
400 mil vagas temporárias para
jovens. As empresas receberiam
R$ 200 mensais por contratação,
para custear os encargos trabalhistas e preparar o jovem para o
mercado de trabalho.
O foco está certo -a inclusão
dos jovens é a prioridade das
prioridades se quisermos enfrentar a guerra urbana-, mas o plano corre o sério risco de se transformar em um monumental fiasco e em uma fonte de desperdício
de recursos.
O objetivo do projeto é irretocável. O Brasil sofre uma crise de
empregos, cujas maiores vítimas,
a julgar pelas estatísticas, são os
jovens, principalmente de baixa
escolaridade. É, portanto, obviamente necessário que se criem vagas, transformando-as em oportunidades de profissionalização.
Sobre as mais diversas experiências de inclusão de jovens, a
começar por Salvador, cidade
próxima de Jacques Wagner, passando por Nova York e por São
Paulo, vou dizer o que vi (e não
apenas o que li): só dar emprego é
jogar dinheiro fora. O fato pode
até virar notícia de jornal e enaltecer os políticos, mas não resolve
o problema.
A produção de conhecimento está cada vez mais veloz e exige reciclagem permanente -essa é
outra obviedade. Sem uma base
educacional capaz de estimular a
autonomia de pesquisa, a capacidade de associar idéias e informações, a expressão e a aprendizagem contínua, o jovem até consegue um emprego, mas está ameaçado de perdê-lo rapidamente.
Primeira conclusão: devem ser
mantidos os investimentos na
melhoria das escolas públicas e da
educação infantil, mas, em especial, no aperfeiçoamento do ensino médio. Isso significa aprimorar os currículos e treinar os professores.
Ao lado das habilidades cognitivas -o saber-, os projetos com
melhores resultados investem solidamente no aprender a ser e no
aprender a conviver. Ou seja, discute-se com o educando quem ele
é e de onde vem. Com base nisso,
ele é convidado a traçar um projeto de vida, identificando-se com
uma perspectiva. Aprende a se relacionar com o outro, a respeitar e
a negociar, condições indispensáveis para o trabalho em equipe.
Nesses dois tópicos -ser e conviver-, são debatidos temas como drogas, álcool, sexualidade,
afeto e família. Sabemos como o
envolvimento da família, onde
nasce ou deixa de nascer a identidade, é decisivo para a formação
de valores.
Englobar as habilidades de ser,
de saber, de fazer e de aprender é
o que podemos chamar de proporcionar educação integral. É
claro que isso não é fácil. Mas
muita gente, dentro e fora do governo, tem amargado decepções
por não fazer ações articuladas.
São pessoas que fazem projetos
"bonitinhos", ganham as luzes da
mídia e iludem, mas que, por falta de método, não fincam raízes.
Muitas ONGs viram seu esforço
desperdiçado ao tentarem entrar
na rede pública com propostas experimentais, que, por falta de articulação, não trouxeram bons
resultados, ou ao desenvolverem
projetos com ênfase só no fazer,
ou seja, na formação profissional.
O óbvio dos óbvios é que a ofensiva para gerar empregos precisa
ter o Ministério do Trabalho como uma de suas partes, mas deve,
necessariamente, caso não queira
ser apenas uma jogada de marketing, abranger, nos mais variados
níveis, os responsáveis pelas políticas de educação, de saúde e de
assistência social.
PS - A experiência, em escala
pública, mais instigante que conheço vem sendo realizada pela
Secretaria Municipal do Trabalho de São Paulo. Para promover
o jovem, articulam-se os recursos
federais com os estaduais. Concede-se a ele uma bolsa em contrapartida à sua participação em
atividades comunitárias, educacionais ou de formação profissional. O ponto mais importante do
projeto -ainda em fase de teste- é a montagem, em parceria
com outras secretarias, universidades e ONGs, de um currículo
básico com os passos para atingir
uma educação integral.
E-mail - gdimen@uol.com.br
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