São Paulo, domingo, 12 de janeiro de 2003

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ADMINISTRAÇÃO

Alegando que regras de contratação de emergência são restritivas, cooperativa ameaça ficar fora da disputa

Indústria do leite aponta discriminação em compra de SP

SÍLVIA CORRÊA
DA REPORTAGEM LOCAL

Cooperativas de laticínios do Estado de São Paulo ameaçam não participar da disputa pela compra emergencial de leite -lançada na tarde de sexta pelo governo do Estado- alegando que as regras fixadas pelo poder público são "discriminatórias".
A contratação visa restabelecer o fornecimento do Viva Leite, programa que entrega por mês 15 litros de leite a 720 mil famílias carentes e está suspenso desde o dia 1º por entraves licitatórios.
De acordo com a indústria do leite, as regras estabelecidas para a compra de emergência dividem o Estado em áreas muito grandes, fazendo com que a maioria das empresas não tenha condições de atender às quantidades e/ou à logística de distribuição exigidas.
"Não vou dizer que é uma compra dirigida, mas é discriminatória. As regras favorecem meia dúzia. Quem entrega 1 milhão de litros de leite por mês?", diz Benedito Vieira, 58, presidente da Cooperativa de Laticínios de São José dos Campos e da Associação Brasileira da Indústria de Leite Pasteurizado (Abilp).
Convidada a participar da disputa, a cooperativa que Vieira preside não vai apresentar proposta. Para ele, cooperativas menores só têm condições de atender as normas se subcontratarem umas às outras ou dividirem informalmente a distribuição do leite dentro das áreas, o que é ilegal.
A Secretaria de Estado da Agricultura e do Abastecimento nega que os critérios adotados sejam restritivos. Na compra de emergência, o Estado foi dividido em 43 áreas de fornecimento -quatro na capital e Grande SP e 39 no interior. Na menor área da Grande SP, a empresa tem de entregar 1 milhão de litros de leite por mês.
Já no interior, o problema, de acordo com as empresas, não é quantidade, mas logística: na região de São José dos Campos, por exemplo, são apenas 127 mil litros por dia, mas eles devem ser distribuídos por 27 cidades.
"Com essas regras, os pequenos foram alijados da disputa", diz Vieira. "Está difícil, os blocos [áreas" são muito grandes. As grandes têm mais condições, mas para as menores está problemática essa estrutura", completa Antônio Julião, 48, diretor da Cooperativa de Laticínios de Sorocaba.
Julião e seus cooperados se reúnem hoje para decidir se participam ou não da disputa.
O que a indústria de leite quer é que seja reconsiderada a licitação feita no ano passado e anulada no final de dezembro pela secretaria.
Nela, a proposta de 70% das empresas superou o preço máximo fixado pela secretaria -R$ 0,93 por litro. O governo, então, suspendeu a competição alegando falta de interesse público e iniciou uma queda de braço com a indústria. Quer os preços de 2002 -de R$ 0,45 a R$ 0,68 por litro.
Na licitação anulada, a região metropolitana estava dividida em 142 áreas, e o interior, em 606. Pulverizada, a concorrência teve 11 ganhadoras na capital e 45 no interior, acomodando a maior parte das empresas do Estado.
Na segunda-feira, representantes do setor vão tentar uma última negociação com o governo.

Outro lado
O governo de São Paulo diz que a opção por áreas maiores melhora a logística da distribuição do leite -permite um atendimento em escala- e que não há nos quantitativos fixados por região nenhum caráter restritivo.
De acordo com o governo, a delimitação de grandes áreas foi a solução encontrada para agilizar a retomada do fornecimento de leite às famílias carentes.
"Estou na secretaria há uma semana e recebi ordens de retomar a distribuição do leite o mais rápido possível. Se fizéssemos a cotação por mais áreas, demoraríamos muitos dias para abrir as propostas e gerenciar a contratação", diz o secretário da Agricultura e do Abastecimento, Antônio Duarte Nogueira Jr.
Segundo ele, apesar de a lei exigir só três consultas para a compra de emergência, a secretaria convidou para apresentar propostas todas as empresas do seu cadastro -66 no interior e 23 na capital. Da licitação suspensa participaram 13 empresas para a capital e 45 para o interior.
O contrato de emergência vai durar, no máximo, 180 dias. Nesse período, a secretaria deve fazer nova licitação. O governo compra 8% do leite produzido no Estado.
O coordenador da Codeagro (Coordenadoria de Desenvolvimento dos Agronegócios), Moacir Rossetti, 38, se disse surpreso com as alegações dos produtores. O órgão comanda o Viva Leite.
"Primeiro: adensar a distribuição facilita a logística. Além disso, a administração pública não pode abrir uma concorrência de acordo com a conveniência das empresas", disse Rossetti, referindo-se ao fato de a indústria reclamar que as áreas juntam cidades onde têm bases de distribuição com outras nas quais elas não atuam.
"Segundo: na licitação suspensa as próprias empresas declararam sua capacidade e pelo menos 20 delas dizem produzir mais do que o exigido na área com maior consumo [1,8 milhão de litros mensais em um bloco da Grande SP"."
As cooperativas afirmam que ter capacidade industrial não significa ter disponibilidade de dedicar a produção ao governo. (SC)

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