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COMPORTAMENTO
Na fauna urbana, homens e mulheres agem como peruas, tigrões, cachorros loucos, gazelas, ursos e pit boys
Tribos paulistanas também se identificam com animais
PAULO SAMPAIO
DA REVISTA
É uma seleção natural: para garantir a sobrevivência da espécie
na fauna diversificada da metrópole, os semelhantes se identificam, se juntam, ocupam territórios e compartilham códigos. Por
analogia, algumas espécies acabam identificadas com animais:
daí surgem peruas, tigrões, cachorros loucos, gazelas e, mais recentemente, os ursos.
Os bichos urbanos que compõem a fauna paulistana têm
comportamentos peculiares que
torna sua identificação fácil.
Elas andam nas nuvens
Gazela é um mamífero de pernas longuíssimas, olhar perdido e
um jeito esquisito de se mover. É a
única espécie humana que leva
tombos e reaprende a andar depois de adulto. "Eu fazia teste para
o Fashion Week e não passava.
Demorei uns seis meses para
aprender a andar", conta Virgínia
Zambuzi, 1,08 m de pernas (1,78
m, 52 kg).
Para manter-se, uma gazela não
come, só cisca. Zambuzi conta
que teve de perder 20 quilos para
virar modelo. Com o "book" numa mão e a mãe na outra, elas
passam a adolescência fazendo o
circuito agência, teste, desfile e fotos. "Book" mesmo, só o próprio.
"Nunca li um livro inteiro, não tenho paciência de ficar parada",
resume Marina Juchem, 15, 1,07
m de pernas.
Gazela iniciante tem mais horas
de sala de espera do que de passarela e passa muita vontade. "Amo
praia, mas não posso tomar sol;
sou gaúcha, mas não como carne
vermelha e adoro chocolate, mas
tenho que maneirar", diz Francinni Veiga, 20.
O melhor amigo do cão
Pit boy é um ser bombado, de
estrutura física sarada, cabeça raspada e que tem o mérito de tornar
o cão pit bull e a luta de jiu-jítsu
indissociáveis. "Tem gente que
compra primeiro o cachorro, depois se matricula na academia.
Faz parte da imagem de bad boy",
define o estudante Guilherme
Santos, 19, 43,5 cm de bíceps.
Cachorro bravo e músculos
bombados são duas faces da mesma moeda. "Quanto maior você
é, melhor a auto-estima, tá ligado?
Eu já tive a cabeça raspada e me
lembro que, quando eu esbarrava
em alguém na balada, ouvia um
pedido de desculpas, tipo: "Desculpaí meu, foi mal, belezaí..." Se
você está acompanhado dos cachorros, aí ninguém chega perto",
diz André Tullio, 23, dois pit bull.
Os pit boys elegem uma música-tema da categoria, "Retrato de um
Playboy Parte 2", de Gabriel, O
Pensador: "Sou playboy, filhinho
de papai/Eu tenho um pit bull/E
imito o que ele faz". Santos sintetiza: "É impossível não se identificar, meu!"
Garras sempre afiadas
A estatística associando moto e
paquera diz muito quando se trata de definir o autêntico espírito
tigrão: "Até mil cilindradas, 30%
da cantada está garantida. Acima
disso, você tem 90% [de chance"
de levar a moça", acredita o engenheiro João Vilela, 56, divorciado,
três filhos e uma namorada 19
anos mais nova.
Dono de uma reluzente Kawasaki 1.500, Vilela está 500 cilindradas acima dos 90%. Usa um óculos tipo "Homem Aranha", colete
de couro, jeans e bota. O empresário Ronald Paciullo tem 200 cilindradas a menos de chances com
as gatas: sua moto é uma Royal
Star 1.300.
Os dois frequentam um circuito
de bares do bairro Vila Olímpia
que vira reduto de tigrões nas tardes de sábado e domingo, quando
eles dão vazão a seu lado "boy".
"A gente é jovem no estado de
espírito. A turma se reúne aqui no
sabadão para fazer bagunça com
os amigos, desestressar, e rola
uma azaração também", diz o
corretor César Cavalcante, 44, o
Cavalka, que usa cavanhaque,
rayban preto, jaquetão de couro
com o adesivo de seu motoclube e
calça jeans muito justa.
Pelúcia natural
"Bear", em inglês, quer dizer urso e, no universo homossexual
norte-americano, também designa o gay gordo e peludo. A ideologia -reforçar a auto-estima dos
gordinhos em um universo povoado por "bombados com barriga tanquinho"- conquistou seu
espaço na fauna paulistana.
"Entre os gays, existe uma obrigação de ser sarado e quem não é
dificilmente se sente à vontade
dançando em uma boate", reclama Israel Copel, 31, 1,78 m, 115 kg.
Para se contrapor à estética dominante, eles fazem uma festa em
um bar dos Jardins que, dizem, é
frequentada por 50% de admiradores, os caçadores de ursos.
Eles dizem que se atraem por tipos físicos semelhantes e juram
que dispensariam Brad Pitt para
correr atrás do apresentador Jô
Soares, que chamam de "urso polar" (gordo de pêlos brancos).
Plumagem de grife
Ela pode estar no deserto, na floresta ou na neve: contanto que haja uma possibilidade de gastar dinheiro, a perua sobrevive. Para
ela, perdas pessoais são resolvidas
indo às compras; perda de liquidações não são resolvidas nunca.
Ser humano desprovido de culpa, a perua desembolsa boladas se
o objeto for de grife -e o dinheiro, do pai ou marido. "Sou machista e submissa, adoro um homem me dando ordens e pagando as minhas contas", diz Mônica
de Lucca, 48, divorciada.
As peruas têm fixação por grifes, não apenas para roupas, mas
até para médicos e cabeleireiros.
Grife por grife, juntando tudo, no
dia da entrevista Lucca estava vestindo mais de R$ 15 mil.
Malucos por carniça
O autêntico cachorro louco faz
como Gilberto Restivo, 37, o
Trem, e apresenta o atestado:
múltiplas fraturas nas duas pernas, escobriações pelo corpo e alguns dentes quebrados. "Rodo
250 km por dia, passo a vida em
cima da moto, de vez em quando
eu caio. Na semana passada, atropelei um cara", conta Trem.
O apelido "cachorro louco" vem
das manobras malucas com motos pequenas e barulhentas. O
glossário da espécie inclui expressões como "tomei um chão" (queda), "levei um retrovisor" (batida), "pé de breque" (motorista
barbeiro) e "montei uma cavala"
(moto maior).
A maioria diz ser apaixonada
pela própria moto, mesmo que
seja uma "carniça" (pequena e
torta, cheia de multas). Entre uma
corrida e outra, comem um "dogão" ou, se estão no centro de São
Paulo, vão a um restaurante que
cobra R$ 1 pela refeição.
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www.uol.com.br/revista
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