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GILBERTO DIMENSTEIN
O emprego de mentira
A pesquisa Datafolha divulgada hoje mostra que, se não
ganhar, Lula terá sofrido a maior
derrota eleitoral de que se tem notícia no Brasil, tamanha sua vantagem neste início de segundo
turno. E Serra terá protagonizado
uma virada histórica.
Na semana passada, o principal
questionamento sobre a capacidade que o petista teria de tirar
suas promessas do papel foi divulgado pelo Dieese (Departamento
Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos) -uma
entidade independente, identificada com os interesses dos trabalhadores.
O coordenador técnico do Dieese, Sérgio Mendonça, disse que,
pelo menos no primeiro ano do
próximo presidente eleito -seja
José Serra, seja Lula-, o desemprego continuará alto. Aquelas
promessas de 8 ou 10 milhões de
empregos estarão tão distantes
como a campanha eleitoral.
Para não piorar a situação
ruim que já existe -e absorver
1,5 milhão de novos trabalhadores-, a economia precisaria crescer, no próximo ano, 5% no mínimo. Note: isso para não piorar.
A Fundação Seade (Sistema Estadual de Análise de Dados), com
base no desempenho fraco deste
semestre, prevê um 2003 ruim
-especialmente os seus seis primeiros meses-, o que certamente afetará o prestígio presidencial.
Não existe um só economista
que alardeie a possibilidade de
que a economia cresça tanto. Os
otimistas falam em 2,3%; os pessimistas, em 1%. Traduzindo: na
melhor das hipóteses, se o nível de
emprego permanecer como está
(e como está não está bom para
ninguém, como demonstram as
pesquisas eleitorais que retratam
o ânimo oposicionista), já será
uma boa notícia.
Como estão cercados de economistas qualificados, Lula e Serra
sabem que terão de lidar, a curto
prazo, com a decepção do eleitorado e terão de inventar alguma
pirotecnia.
É compreensível eleitoralmente
a atitude de ambos os candidatos.
Imagine que, amanhã, quando
começará o horário eleitoral gratuito, Lula ou Serra dissesse o seguinte: "Olhe, pessoal, eu não estou aqui para mentir nem para
enganar ninguém. Preparem-se:
menos desemprego só lá por 2004,
e olhe lá. Se vocês quiserem se iludir, tudo bem, votem no meu adversário". E ainda acrescentasse:
"O que posso prometer é tentar
não deixar a situação pior do que
está".
O efeito de tais declarações seria
comparável apenas ao estrago da
descoberta de dinheiro vivo no escritório de Roseana Sarney. A semana acabaria pelo menos em
empate entre os dois candidatos.
Afinal, Lula e Serra juram que desejam o poder para "mudar", o
que significa, em uma palavra,
menos desemprego.
A semana que passou, movida
pelas alianças de segundo turno,
mostrou que a palavra "mudança" presta-se para qualquer coisa.
Até para piadas. José Serra foge,
como pode, da imagem de que é a
continuidade do que "está aí"
-mas também corre atrás do
que está aí, como o PFL. O símbolo daquilo que "está aí", o presidente Fernando Henrique Cardoso, resolveu ficar menos afastado
da campanha, contrariando os
marqueteiros de Serra, que gostariam de vê-lo mais distante.
E o principal símbolo de mudança de "tudo o que está aí", Lula, está recebendo apoio de gente
que "está aí" há muito tempo.
Antonio Carlos Magalhães, Orestes Quércia e José Sarney, por
exemplo. Conta com as simpatias
de Delfim Netto e de Paulo Maluf,
que ainda estão indecisos, mas
insinuam que não vão ficar na
turma dos que defendem "o que
está aí" e podem votar no PT.
Quem for eleito sabe que terá de
se eleger prometendo mudar o
que está aí, mas terá de governar
com o que já está aí. Parece piada
e farsa, mas essa é a principal
questão política brasileira.
P.S. - Está circulando na internet um texto primário e visivelmente fraudado que atribui a
mim ataques contra Lula e Fernando Henrique Cardoso, intitulado "Por que não voto em Lula".
Como é de um primarismo gritante -apareço, por exemplo, como ex-eleitor de Collor-, informei, neste espaço, tratar-se de
uma fraude. Imaginei o caso encerrado. Numa ação orquestrada,
intensificaram, na semana passada, a divulgação desse texto na
internet, fazendo com que meu e-mail se empanturrasse de pedidos
de explicações dos leitores. Fiquei
surpreso ao receber telefonemas
de amigos meus, querendo saber
se aqueles ataques panfletários
eram mesmo meus.
Para piorar, meus dois filhos, de
14 e 12 anos, também me pediram
explicações, porque, por sua vez,
foram indagados por seus amigos
e pelos pais de seus amigos.
Vi como ainda não sabemos
nos defender da internet. Se a internet, de um lado, democratiza a
informação, de outro, facilita a
empulhação. Vou tentar mais
uma vez: esse texto é uma fraude.
Como jornalista da Folha, não
posso, não devo e não quero explicitar meu voto.
E-mail - gdimen@uol.com.br
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