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DANUZA LEÃO
Traições
Você já traiu? Ninguém gosta de confessar, mas é claro
que sim.
Nós todos já traímos, em pequena ou grande escala, e a traição é
apenas a substituição de uma situação que existe -seja ela de
que ordem for- por outra que
nos parece mais atraente. Ao fim e
ao cabo, como dizem além-mar, a
traição não é mais do que a esperança de viver melhor, e quem trai
está pensando só em si mesmo
-com mais ou menos culpa.
Quando você troca de cabeleireiro sem razão só porque ouviu
dizer que surgiu um novo no pedaço, não deixa de ser uma traição. A prova é que, se você, andando na rua, vê o antigo vindo pela
mesma calçada, disfarça e procura não cruzar com ele para não
ouvir o inevitável "você sumiu".
Uma traição boba, mas uma traição, que acontece o tempo todo
com o médico, o dentista, o agente
de viagem, o restaurante, os amigos; é sempre igual, e traidores somos todos.
A traição política é diferente:
trata-se de conveniência, de interesse, uma questão de negócios,
praticamente. Todos querem estar
o mais perto possível do poder,
pois, além do prestígio, há sempre
a possibilidade de vantagens e
empregos para a família. Convenhamos: é preciso respeitar esse tipo de traição. Afinal, é do futuro
dos filhos que se trata e, quando se
fala de filhos, tudo pode ser perdoado, segundo alguns.
Mas existem as traições de
amor, bem mais complicadas. O
fundamento é sempre o mesmo:
quem trai está à procura de mais
bem-estar, mais prazer, mais felicidade. É lícito e acontece o tempo
todo, mas é tão difícil abandonar
quanto ser abandonado. O abandonado passa a duvidar de suas
qualidades -e quem foi deixado
acha que tem alguma?- e nem
consegue saber qual a dor maior:
viver sem a pessoa amada ou
achar que nunca, jamais, vai ser
amado de novo. É duro.
Nenhuma das duas coisas tem a
ver com a realidade, mas nem tente falar de realidade com alguém
que está sofrendo por amor e, já
que estamos tratando do tema,
uma das primeiras obrigações é
perceber quando o amor começa a
acabar. Nessa hora, apaixonar-se
por outra pessoa pode acontecer
com qualquer dos dois, só que a situação de quem se toca primeiro
(e vai embora primeiro) é sempre
melhor. O outro, coitado, fica penando.
É difícil deixar alguém, e há
sempre um preço a pagar: se fosse
possível ir embora sem precisar
conversar, explicar, discutir a relação, tudo bem. Mas quem toma
a decisão vai ter que passar pelo
menos uma madrugada de cão, e
o outro não costuma aliviar. Pensando bem, não deixa de ser uma
certa vingança -absolutamente
normal-, do tipo "você pode ir,
mas vai ter que me rejeitar com
todas as palavras e saber que me
deixou sofrendo". É raro saber de
alguém que, ao ser abandonado,
tenha dito, ao primeiro sinal:
"Vai, mas não explica". Já pensou
o alívio? Quem conseguir fazer isso não sabe o quanto vai se sentir
melhor -ou menos mal, pelo menos. Por quê? Porque o outro vai
ficar na dúvida: "Será que ela tem
alguém e eu não percebi?". Não é
melhor do que chorar?
Mas tem o pior: é quando alguém deixa o outro para ficar só.
Essa é a rejeição total e absoluta.
Não se trata de ser substituída por
uma talvez mais bonita, mais jovem ou mais sexy. Se alguém te
abandona por nada, por ninguém, é o horror total.
Mas isso não costuma acontecer
porque falta à maioria das pessoas
lucidez; elas somente se dão conta
de que o amor acabou quando
acham que estão gostando de outro.
E aí começa tudo de novo.
E-mail - danuza.leao@uol.com.br
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