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GILBERTO DIMENSTEIN
Paulo Malula e José Serruf
Uma parte da explicação para o bom desempenho de Paulo Maluf nas pesquisas eleitorais
- ele conta com 43% das intenções de voto- está nas estatísticas criminais divulgadas na semana passada: o número de sequestros no primeiro semestre
deste ano dobrou em comparação
com o verificado no mesmo período de 2001.
Mesmo que o número de sequestros tivesse caído pela metade (o
que já seria uma notável realização), não desapareceria o ambiente claustrofóbico provocado
pela insegurança.
A violência fez do morador de
São Paulo, especialmente o da região metropolitana, uma espécie
de subcidadão, limitado em direitos elementares como o de ir e vir.
Sobressai a percepção generalizada de pânico, há pouca paciência
para as justificativas sociais da
criminalidade e ainda menos para os argumentos das autoridades
policiais que afirmam que aumentam os investimentos em segurança.
Maluf colhe bons resultados do
caos urbano ao apresentar-se como o governador que espantaria
os marginais, numa tática de
"prendo-e-arrebento". Insinua
que, nessa guerra, transgredir a
lei seria um mal menor -o que
reforça o senso comum, para o
qual os direitos humanos apenas
asseguram privilégios aos delinquentes.
Ele ganha votos dizendo, em essência, que bandido bom é bandido morto, numa defesa do extermínio aceita por largos segmentos
da sociedade.
Esse discurso ajudou a atrair para Maluf 40% dos eleitores de Lula e 50% dos eleitores de José Serra, os quais, por enquanto, estão
virando solenemente as costas para os candidatos do PT e do PSDB
em São Paulo.
O eleitores de Malula e Serruf
não se sentem incomodados em
misturar os votos, escolhendo um
candidato a governador que se
mostra a encarnação do meganha
às antigas -cronicamente acusado pelo PT e pelo PSDB de delinquência administrativa - e candidatos a presidente que se notabilizaram pela defesa dos direitos
humanos, ambos vítimas da polícia.
Educadores têm notado como os
alunos percebem cada vez mais a
política como uma atividade sem
princípios, orientada basicamente pela, digamos, ética da vitória.
Tal visão é uma das muitas razões
que tornam difícil a tarefa de fazer o jovem se interessar pela história do Brasil, esta muitas vezes
encarada como um encadeamento de fatos e nomes oficiais. Vida
pública torna-se quase sinônimo
de esperteza ou de enganação. A
imensa maioria dos jovens imagina que os políticos podem diferenciar-se aqui e ali, mas, em essência, são todos iguais. E o fato é
que, na maioria das vezes, nem
querem analisar as diferenças.
Mas o efeito Malula ou Serruf
não é provocado apenas pela desinformação do eleitor. Como
nunca, o cinismo está predominando na política brasileira - é
uma das marcas registradas destas eleições. Então vejamos.
O PL de Lula é o PL de Maluf.
Discute-se até a possibilidade de o
empresário José Alencar, vice do
candidato do PT, subir no palanque de Maluf. Para confundir ainda mais, o PL está, no Rio, com
Rosinha, mulher de Garotinho,
candidato ao governo do Rio.
O marqueteiro Duda Mendonça, que, com a criação de uma
imagem "light", levou Maluf à vitória na eleição para a Prefeitura
de São Paulo e, depois, seu sucessor, Celso Pitta, desenha a imagem "light" de Lula.
Na sucessão paulista passada,
viam-se outdoors em que Paulo
Maluf aparecia ao lado de Fernando Henrique Cardoso. Tal tipo de aliança não é coisa do passado: sabe-se que, pelos bastidores, há um acerto federal entre os
tucanos e o ex-prefeito. Maluf não
bate em Serra, Serra não bate em
Maluf - assim como Lula não
bate em Maluf e Maluf não bate
em Lula. Lula, aliás, não bate em
Quércia, que não bate em Lula. O
partido de Quércia, como se sabe,
é o PMDB, que está com Serra.
A obviedade é que ninguém pode acusar ninguém. Ciro Gomes
conseguiu a proeza de colocar numa mesma trincheira ex-colloridos, Antônio Carlos Magalhães, ex-comunistas e Leonel Brizola. Se eu escrevesse, há poucos
anos, sobre tal possibilidade,
iriam dizer que este colunista estava irremediavelmente maluco.
A grande aquisição de Ciro, na
semana passada, veio da cúpula
do PFL, mais precisamente de seu
presidente, Jorge Bornhausen. O
maior inimigo de Ciro é Serra, a
quem acusa, sem meias palavras,
de desonesto. Serra classificou-o
de "genérico" de Collor. Ambos
sempre estiveram juntos no mesmo partido, defendendo o mesmo
candidato a presidente e o mesmo
governo.
O PFL de Ciro é o mesmo PFL de
Geraldo Alckimin, que, por sua
vez, é o maior adversário de Paulo
Maluf. Sem contar que parte do
PFL também está com Serra.
Aquelas misturas estranhas que
aparecem na intenção de voto dos
eleitores de Maluf são exatamente
as mesmas misturas estranhas dos
candidatos brasileiros.
Criou-se, assim, a seguinte situação: o partido que não está, diretamente ou indiretamente com
Maluf, que jogue a primeira pedra.
PS- Ao investigar experiências
de combate à violência no Brasil,
um grupo de jovens pôs em circulação, na semana passada, uma
leitura obrigatória para todos os
candidatos. Trata-se do suplemento lançado pelo programa de
trainees da Folha, que mostra como algumas comunidades conseguiriam melhorar seus níveis de
segurança. Para quem não leu, reproduzo os textos, ao lado do relato de outras experiências. Estão
na página do Aprendiz: www.aprendiz.com.br
E-mail - gdimen@uol.com.br
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