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DANUZA LEÃO
Na crista da onda
Se você é daquelas que gostam de estar sempre muito,
mas muito na moda, fique sabendo: não há nada mais moderno,
nos dias de hoje, do que dar uma
de antiga.
Começando pela casa: alguns
móveis devem ter um ar de herança de família, assim como a
louça, os talheres e os cristais. E
atenção: para acrescentar um
charme a essas lembranças, o
ideal é que elas venham acompanhadas de uma historinha, tipo
"essa sopeira foi de minha bisavó,
que ganhou de presente de casamento dos Silva, de Botucatu, depois foi para a minha avó, para
minha mãe e agora está comigo"
-chiquérrimo, não? Tanto os Silva quanto a própria família devem ter raízes bem fincadas na
terra, pois não há nada mais na
moda do que pertencer à aristocracia rural (mas basta ser do interior para dar o maior pé). As
pessoas têm que sentir o cheiro
dos seus antepassados, para não
pensarem que você brotou de
uma árvore.
Quando convidar alguém para
jantar, diga, como quem não quer
nada, que a galinha (caipira, claro) que estão comendo veio da fazenda, que a receita é de família e
que a cozinheira é neta da empregada de seus avós. Depois do café,
um licor de jenipapo de fabricação caseira vai fechar com chave
de ouro esse jantar tão chique -e
tão simples.
Ah, outra coisa: nada de jogo
americano colorido ou com estampas, comprado em Nova
York: toalha branca bordada de
branco, se possível de linho, e
também de família (se tiver um
furinho, melhor ainda, é vintage).
As flores devem ter sido arrumadas nos vasos por você mesma, e
atenção à sutileza: colhidas do
seu próprio jardim.
As crianças devem ter nomes
antigos, tipo Maria Leopoldina
ou Maria Leocádia, e deverão vir
à sala depois do jantar para o boa-noite: as meninas de cabelo comprido e liso, tendo no pescoço um
cordãozinho de ouro com uma
medalha que pertenceu a uma
avó distante. A mãe deve recomendar que rezem antes de dormir, pois nessa casa reinam a tradição, a moral e os bons costumes,
valores que não podem ser comprados num shopping.
Os casamentos devem ser bem à
moda antiga, e à festa devem ser
convidados todos os parentes, sobretudo os que ainda moram no
interior, o que é chiquérrimo. O
bolo e os doces terão sido feitos
pela mesma doceira que fez todos
os casamentos da família, e se a
grinalda que foi da mãe não tiver
sido comida pelas traças e a noiva
usar, aí é show. O padre, que todos conhecem e chamam pelo nome, foi quem batizou a família
inteira, e em sua oração deve explicar, durante longuíssimos minutos, o que é um casamento de
verdade.
A cerimônia acontecerá dentro
das mais antigas tradições, pois a
moda no século 21 é fazer de conta que se vive no século 19; mas,
em nome do pensamento liberal,
é permitido que a noiva esteja ligeiramente grávida.
Nunca, nessa família, alguém
teve problemas de drogas ou de
sexo, e dos que roubaram, traíram, delataram e passaram os irmãos para trás na hora da herança, ninguém fala.
Na festa, alguém vai beber demais e dar algum tipo de vexame,
o que faz parte, e é bem capaz de
contar histórias escabrosas do
passado, mas como a culpa vai ser
toda da bebida, não se fala mais
nisso.
Aí a festa acaba e chega o grande momento da mãe da noiva. É
quando ela abre a porta de casa
meio de pilequinho, tira os sapatos de salto 12, o vestido apertado,
se joga na cama com um prato de
bem-casados e pensa aliviada
que, com a filha casada, resolveu
um problema.
Mal sabe ela.
E-mail - danuza.leao@uol.com.br
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