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TRÂNSITO
Os 5 condenados por matar ou ferir no tráfego da capital paulista em 2000 e 2001 apenas prestaram serviços à comunidade
Código não pune culpado de morte com prisão em SP
EDUARDO ATHAYDE
DO "AGORA"
Quatro anos e oito meses depois
de o Código de Trânsito Brasileiro
entrar em vigor, matar ou ferir no
tráfego paulistano raramente leva
o culpado pelo acidente à cadeia.
Em 2000 e 2001, a 1ª Delegacia
de Crimes de Trânsito do Detran
(Departamento Estadual de Trânsito) identificou 52 pessoas que
foram consideradas pela polícia
culpadas por atropelamentos ou
por acidentes que resultaram em
morte ou lesão corporal grave.
Desses 52 casos, a reportagem
teve acesso a 45 processos e em
nenhum deles a Justiça determinou a prisão do motorista. Pelo
contrário, em 30 deles, houve o
arquivamento do processo e, em
apenas cinco, condenação. Todas
elas, porém, de caráter de prestação de serviços à sociedade.
"Na maioria dos casos, a punição se limita à entrega de cestas
básicas a entidades sociais ou a
prestações de serviços à comunidade", afirmou Casen Mazloun,
juiz federal da 1ª Vara Criminal de
São Paulo. Os outros dez processos estão em andamento.
Na maioria dos casos de processos arquivados, ocorreu omissão
de socorro. Também houve situações em que o réu não tinha carteira de habilitação ou trafegava
em velocidade acima do permitido. "É a total desmoralização da
Justiça criminal", afirmou o presidente da Associação Brasileira
dos Advogados Criminalistas,
Luiz Flávio Borges D'Urso.
Falta de punição
O ex-juiz da 1ª Vara de Delitos
de Trânsito de Curitiba e atual desembargador do Tribunal de Justiça do Paraná, Octávio César Valeixo, fez uma pesquisa entre 1980
e 1990 que mostrou que, em apenas 3% dos casos de crimes de
trânsito ocorridos no Brasil, a Justiça condenou o responsável. "Infelizmente, 12 anos depois a situação continua praticamente a mesma", disse.
A falta de punição está alicerçada nas brechas legais previstas no
código, na falta de critérios da Justiça e na dificuldade de encontrar
testemunhas e provas materiais
do acidente ou atropelamento.
"É praticamente impossível alguém ser preso por cometer um
crime de trânsito", disse o promotor de Justiça e coordenador do
Centro de Apoio Operacional da
Promotoria de Justiça Criminal,
Rodrigo Canellas Dias.
A ineficiência policial em localizar o culpado pelo acidente ou pelo atropelamento pode ser apontada como um dos fatores que
contribuem para a impunidade.
Em 1998, a 1ª Delegacia da Divisão de Crimes de Trânsito do Detran -que tem como principal finalidade investigar crimes de
trânsito ocorridos na cidade de
São Paulo- recebeu 262 casos
para serem investigados. Cerca de
90% deles são referentes a atropelamentos e a acidentes com ou
sem vítimas fatais.
Dos 262 casos, em apenas 26, ou
seja, em 10%, o órgão estadual
conseguiu identificar o culpado
pelo acidente ou pelo atropelamento. Em 1999, dos 255 casos registrados, em apenas 30, os policiais conseguiram chegar ao provável culpado, o que corresponde
a 12%. Em 2000, houve 196 crimes
de trânsito e, em 41 deles, o culpado foi localizado, o que representa
21%. No ano passado, foram 181
casos e 35 solucionados, ou 19%.
Investigação
A situação de ineficácia da polícia pode ser ainda maior. A 1ª Delegacia do Detran investiga apenas casos em que a vítima morre
no local ou aqueles em que as delegacias de polícia comuns não
conseguem achar o culpado pelo
crime de trânsito.
A Secretaria de Estado da Segurança Pública, contudo, não dispõe de dados específicos sobre os
crimes de trânsito solucionados
pelas delegacias comuns. Para
agravar a situação, os casos investigados pelo Detran representam
apenas cerca de 20% dos crimes
de trânsito ocorridos na capital.
Segundo a CET (Companhia de
Engenharia de Tráfego), de 1998 a
2001, 2.416 pessoas morreram
atropeladas em São Paulo. "A falta de um controle por parte da Secretaria da Segurança Pública demonstra o total desprezo que as
autoridades têm com a questão
do trânsito", disse Salomão Rabinovich, diretor do Cepat (Centro
de Psicologia Aplicada ao Trânsito) e presidente da Avitran (Associação das Vítimas de Trânsito).
De acordo com a CET, os números de atropelamento na cidade
podem ser maiores. Isso porque
muitos dos atestados de óbito de
vítimas do trânsito não informam
a causa exata da morte e os dados
da companhia levam em consideração apenas casos em que o IML
(Instituto Médico Legal) indica
como causa da morte lesões provocadas por acidentes de trânsito.
Para Roberto Scaringella, ex-secretário municipal dos Transportes e atual consultor de trânsito, a
não-regulamentação do artigo do
Código de Trânsito Brasileiro que
prevê a obrigatoriedade da inspeção veicular contribui para o
grande número de acidentes.
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