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TRAPAÇA NA ESCOLA
Celular e computador de mão são as novidades a serviço de uma das mais antigas práticas dos alunos
Colar ficou mais fácil com as novas tecnologias
DÉBORA YURI
DA REVISTA
Para ir bem numa prova, o aluno precisa:
a. Estudar
b. Ter aparelho de celular
c. Usar óculos de sol
d. Comprar um palmtop ou calculadora
e. Qualquer uma das anteriores
Acertou quem cravou a alternativa "e" por mais estapafúrdia que
ela pareça: todas as opções citadas
acima estão valendo na busca daquilo que as gerações passadas
chamavam de "nota azul". É a velha cola que todo mundo conhece, mas agora em nova roupagem.
A geração atual não abandonou
os métodos mais rudimentares,
como o papel escondido no estojo
e fórmulas rabiscadas no tênis,
mas ganhou o reforço da tecnologia -celulares que enviam textos
e fotos, computadores de mão e
calculadoras que transmitem
mensagens por raios infravermelhos e o universo inesgotável de
trabalhos que podem ser garimpados na internet.
"Colar hoje não é mais "pescoçar" a prova do outro. Existe a evolução da espécie", diz Alexandre*,
15, aluno do 1º ano do colégio
Bandeirantes, que costuma receber o gabarito dos testes pelo celular. Quem envia é um colega que
sai da sala antes e passa as respostas do banheiro da escola ou de
uma lanchonete próxima.
O Bandeirantes, é bom dizer,
proíbe que os alunos fiquem com
celulares durante as provas. "Mas
nós deixamos escondido no bolso. (...) Nenhum professor nos revista", conta Alexandre.
Nos trabalhos extraclasse, sai o
telefone e entra a internet, já que é
possível achar textos sobre qualquer tema com uns poucos cliques de mouse. "É a coisa mais
comum: copiam, colam e imprimem o trabalho. Uma vez, pedi
uma pesquisa sobre instrumentos
náuticos e recebi seis textos exatamente iguais numa mesma classe", conta Denise Mendes, 40,
professora do colégio Pentágono.
A trapaça hi-tech não é um fenômeno brasileiro. Nos EUA, o
assunto virou motivo para uma
campanha nacional anticola e foi
parar nas páginas -e até na capa- de grandes jornais. "Colar
com aparelhos eletrônicos é a última moda nas salas de aula americanas", disse Peter McLaren, 56,
professor da Escola de Educação
da UCLA (Universidade da Califórnia em Los Angeles) à Revista.
Cardápio
Em escola pública, o dinheiro é
mais curto e o celular, menos usado. "Não tenho grana para isso.
Fico nas minhas colinhas antigas:
escrevo nas pernas e uso calça que
abre do lado, grudo um papel nas
costas da menina da frente e cubro", conta Marina*, 16, da Escola
Estadual Fernão Dias.
Depois de 11 anos colando, nada
mais normal que a prática chegue
também à faculdade. Na FGV
(Fundação Getúlio Vargas), o
computador de mão faz a festa.
"A gente coloca capítulos inteiros
no Palm e depois faz transferência
de arquivos por infravermelho
para os outros", conta Cristina*,
26, que faz especialização em administração.
Pais & mestres
De tão disseminado, o hábito de
colar não chega a enfrentar grandes obstáculos éticos ou atrair
muita condenação, nem mesmo
entre os pais. "Não dá para evitar.
(...) Acho até que faz parte do perfil do adolescente, de desafiar as
regras", acredita a relações-públicas Regina H. da Silva Botelho, 45,
mãe de dois adolescentes.
Para muitos educadores, a trapaça deve ser creditada aos equívocos da metodologia de ensino.
"O conhecimento não precisa ficar retido na memória. Ele está no
livro e pode ser consultado", diz o
pedagogo Antonio G. da Costa,
54, que já trabalhou em projetos
do Unicef (órgão da ONU).
Muitos educadores, porém, não
acreditam na possibilidade de a
escola funcionar sem provas. "A
nota tem de ser aplicada conforme o potencial do aluno, e a prova
ainda é a melhor forma de avaliá-lo", diz Myriam Tricate, 61, diretora do colégio Magno.
Longe das discussões "sérias", a
cola é encarada pelos estudantes
como algo comum no cotidiano e
que poupa tempo para aproveitar
o presente. "Aqui na Poli, ou você
estuda ou vive. A gente corta no
meio, tenta fazer os dois." Nem
ele nem seus colegas acreditam
que isso vá interferir em suas carreiras. "Essas fórmulas estão no livro, você não precisa decorar",
diz Cláudio*, aluno da USP.
* Nomes trocados para preservar os personagens ouvidos
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