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DANUZA LEÃO
Um dia (de cão) em Nova York
Você chega e a primeira coisa que faz é ir ao PJ Clark comer um hambúrger bem americano. Primeira decepção: o PJ,
aquele monumento da cidade, está em obras, o que é um perigo:
vai que ele reabre decorado por
Philippe Stark? Seria o caso de
condenação do responsável à prisão perpétua ou à cadeira elétrica, para os mais radicais.
Aí você vai passear, olhar as vitrines; apesar de ser domingo, as
lojas estão todas abertas, e as pessoas comprando, comprando,
comprando. Distraída, você anda
quilômetros e quando percebe está exausta, precisando sentar por
uns momentos. Sentar em New
York? Como, onde?
Em Paris existem cafés em cada
esquina, onde se pode ler um jornal tomando um copo de vinho e
vendo o mundo passar, o que é
quase tão cultural quanto entrar
num museu; existem também,
nos grandes boulevards, bancos
nos quais as pessoas se sentam
para fazer quase a mesma coisa
que fazem nos cafés, isto é, nada,
só olhar e viver.
Em Nova York, nem pensar. Se
você está à beira de um desmaio,
as soluções são poucas: ou você
entra numa cafeteria onde tem
que beber ou comer muito rápido
(tem sempre alguém esperando
você sair para se sentar), ou entra
numa loja luxuosíssima e pede
para ver uma coisa bem cara: um
sweater de US$ 1.500, por exemplo. A vendedora trará vários, e aí
você tem que dar a impressão de
estar na dúvida sobre a cor. Nessa
hora, para poder refletir, você tem
o direito a se sentar num banquinho muito chique, muito design,
sem encosto, sem nenhum conforto, mas que é melhor que nada.
Pense, pense, diga que não está
segura quanto ao tom. Enquanto
isso, descanse -e desnecessário
dizer que sem poder acender um
cigarro. Ah, como faria bem ao
corpo e à alma um cigarro nessa
hora; mas não pode.
Você diz que vai pensar, sai, e
como há muita coisa a ver nas vitrines -tudo que existe no mundo-, você sobe a Madison por
uma calçada, para depois voltar
pela outra. Como as ruas são numeradas, de repente se dá conta
de que andou 23 quarteirões; portanto, para voltar para o hotel,
são mais 23. Não vai conseguir,
claro que não vai. Mas Deus às
vezes é pai, e você vê um tipo pub
inglês, onde, às 3h da tarde, pessoas bebem e fumam. Entra e a vida começa a fazer algum sentido.
Quando o hambúrger e as batatas fritas chegam, vê que dariam
para alimentar várias famílias.
Abre a bolsa para pegar um cigarro, mas como em Nova York não
se fuma em lugar algum, deixou
os seus no hotel. Pede um maço e
descobre que a felicidade ainda
existe. Existe, mas custa caro. Preço de um maço, em qualquer lugar da cidade: US$ 7,50 -e ela
esqueceu a calculadora.
Mas como é da geração que
aprendeu a fazer as quatro operações, faz a conta na agenda: comprou o dólar a R$ 3,70, o que significa que aquele maço de cigarros custou exatamente R$ 27,75,
socorro. Comenta com o garçon, e
ele diz: "Aproveite, pois estão tentando aprovar duas novas leis:
uma que proíbe fumar na rua, e
outra dentro de sua própria casa". Que vida.
Claro que todo mundo sabe que
o fumo etc. etc. Mas que o próximo governo, que pretende aumentar os impostos dos cigarros,
seja menos voraz. Não ficou combinado que tortura nunca mais?
PS: Logo depois do segundo turno, Lula falou uma coisa muito
importante à qual ninguém deu
ainda muita importância: o desperdício. Ele tem razão. Num jantar (normal) em casa de um europeu nunca é servido um rosbife,
por exemplo. Se são quatro pessoas, são quatro bifes, de sobremesa é uma fruta ou um doce para cada um, e um pudim inteiro,
nem pensar: pudins, no supermercado, são vendidos em porções individuais. Os alimentos
são comprados diariamente, e
não tem essa história de geladeira
cheia e quase tudo acabar no lixo,
como todas nós, donas de casa,
sabemos. Se a couve-flor sobe
500%, isso não é assunto para a
televisão; as donas de casa substituem por cenoura -compram
duas ou três, nunca um quilo-,
repolho ou beterraba, cujos preços
não foram aumentados, e fim de
papo; elementar, não? Essa educação começa em casa, e como o
próximo governo pretende inovar, uma campanha para ensinar
economia doméstica seria de
grande ajuda, começando pelas
escolas. Nas da Europa, os alunos
almoçam e são obrigados, quando terminam, a passar o pão no
prato e deixar ele limpinho, isto é:
a comer tudo. Dessa forma aprendem a só se servir da quantidade
que vão conseguir comer.
É com coisas aparentemente
banais como essa que as coisas
podem começar a mudar.
E-mail - danuza.leao@uol.com.br
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