|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TRABALHO INFANTIL
Quase um em cada quatro menores de 14 anos, 24,3%, faz bico em feiras ou atua como ambulante
62.290 crianças trabalham em São Paulo
MELISSA DINIZ
DA REPORTAGEM LOCAL
Quinta-feira, 22h30, os termômetros registram 15C em São
Paulo. Apesar do frio e da chuva,
Luana, 7, vende balas e chicletes
em bares da cidade. Como ela,
62.290 crianças da região metropolitana de São Paulo, entre cinco
e 14 anos, trabalham -24,3% na
feira ou como ambulantes.
Os dados são resultado de um
estudo feito pela professora Ana
Lúcia Kassouf, do departamento
de economia da Esalq (Escola Superior de Agricultura Luiz de
Queiroz), da USP de Piracicaba,
baseado nas informações da Pnad
(Pesquisa Nacional por Amostra
de Domicílios) de 99, que contém
as informações mais recentes sobre trabalho infantil no Brasil.
No estudo, a professora faz uma
atualização dos números presentes em sua tese de livre-docência,
defendida na Universidade de São
Paulo, em 1999, na qual aborda o
trabalho de crianças no país.
Com base na Pnad, Ana Lúcia
também estudou a contribuição
de crianças de cinco a 14 anos na
renda familiar. A pesquisadora
aponta que, para 35% das famílias
da região urbana do país e para
46% das famílias da zona rural, a
participação das crianças na renda é maior do que 20%.
Para Ana Lúcia, os dados revelam que as características socioeconômicas das famílias levam as
crianças a trabalhar. "Não é só a
renda baixa que contribui, mas o
grau de escolaridade dos pais
também. Só com incentivo as
crianças estudam e saem do ciclo
de pobreza em que estão hoje".
Segundo a professora, não há
dúvidas de que o trabalho -proibido para menores de 16 anos no
Brasil, com exceção dos casos em
que os adolescentes são aprendizes- seja ruim, mas, em alguns
casos, afirma, os pais não têm alternativa para sobreviver se não
contarem com a ajuda dos filhos.
Apesar da proibição, o Unicef
estima que cerca de 4 milhões de
crianças entre cinco e 16 anos trabalhem no Brasil. Para psicólogos, o trabalho na infância faz
com que a criança pule uma fase
do desenvolvimento, o que pode
transformá-la num adulto precoce e sem expectativas.
Luana (para preservar a identidade das crianças, os nomes são
fictícios), que ganha em média R$
160 por mês, diz que o dinheiro é
usado para comprar roupas e comida. Ela e os sete irmãos vendem
balas à noite nos bares da Vila
Madalena, zona oeste da capital.
A menina chega por volta de
20h e só vai embora às 5h. Do alado de fora do bar, seu irmão, de 11
anos, a observa, mas Luana está
com fome e come alguns dos doces que tem para vender. No dia
seguinte, ela ainda vai à escola.
A poucos metros dali, João Carlos, 14, tenta convencer os fregueses de um bar a engraxar os sapatos. "Já cuidei de carro, já trabalhei na feira e já vendi bala", conta
o menino, que começou a trabalhar com 11 anos e, desde então,
abandonou a escola. "Estou comprando o material aos poucos.
Não gosto da escola, mas vou ficar
engraxando sapatos a vida toda?"
A vendedora de flores artificiais
Marina, 9, aluna da terceira série,
diz que um amigo a convidou para trabalhar. "Ganho uma "caixinha" e aproveito para comprar
roupas e ir à lanchonete", diz.
Donos de bares afirmam que
sempre há um adulto ao lado das
crianças. "Às vezes é algum parente, mas também acontece de
darem dinheiro para a mãe e trazer as crianças", diz um proprietário que não quis se identificar.
Texto Anterior: Outro lado: 'Existem outros interesses' Próximo Texto: Fórum quer pôr fim à prática Índice
|