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DANUZA LEÃO
Cuidado com elas
Mulher é assim: tem dias
que acorda impossível, precisando fazer alguma coisa, seja
lá o que for, contanto que seja
uma coisa bem radical.
As idéias mais loucas passam
pela cabeça: ou compra um gato,
ou pega o caderno dos classificados para procurar um apartamento e se mudar, ou inventa de
fazer uma reforma no que mora
(mas uma reforma bem grande,
para enlouquecer bastante).
Pegar um avião para uma cidade desconhecida é uma hipótese,
mas é pouco. Nesses dias, a vontade é virar a vida pelo avesso, e não
dá para ter calma para tomar a
decisão certa: tem que ser hoje.
Hoje e, de preferência, agora.
Os gatos, é complicado: e quando resolver sumir por uma semana, faz o quê?
Depois de perguntar sutilmente
à empregada "você já teve um gatinho?" e receber a resposta, curta
e grossa, "odeio gato", essa possibilidade é resolvida por si só.
Trocar de casa é sempre bom,
mas um processo que demora;
talvez mudar de cidade, quem sabe de país. Não é uma idéia simples, mas é uma idéia, e o sonho
ainda é livre.
Digamos que resolva se mudar
para a Tunísia. Tudo maravilhoso; mas como se faz, num país estranho, para mandar ligar o gás e
a eletricidade, como descobrir como se conectar pela internet, como encontrar o carpinteiro certo,
o bombeiro certo, o técnico certo
para ligar a televisão? Leva tempo
para ter essas conexões, fundamentais para a segurança de
qualquer ser humano que já passou dos 40 (mas tem cabeça de
16). Não, talvez não seja por aí.
Arrastar os móveis e trocar tudo
de lugar pode ajudar; é uma solução amena, pois, se mudar de
idéia, tem volta, só que para seu
estado de espírito atual é pouco.
Hoje é preciso uma atitude mais
definitiva, que comprometa de tal
maneira o presente e o futuro que,
se houver um arrependimento,
não haja volta. É disso que ela está precisando: de uma grande
confusão na vida.
Por que as mulheres têm essa
vocação para o drama? Por que
às vezes precisam jogar -e jogam- tudo para o alto sem medir as consequências, para poderem chorar bastante depois, desesperadas e arrependidas?
Se tivesse um marido, armaria
uma grande quizumba, uma cena de ciúmes, falaria de uma antiga paixão (com uma ameaça
implícita), para ele sair de casa
furioso; depois do alívio inicial, ficaria bem triste, choraria bastante, tomaria um tranquilizante, e,
à noite, com o rabo entre as pernas, pediria para ele voltar.
Quem sabe dar uma festa só para solteiros? Pode pedir a cada
amigo para levar uma garrafa de
bebida e um outro amigo, e a cada mulher, o gelo e uma amiga,
para que novos pares se formassem e, quem sabe, sobrasse alguém para ela. Um alguém de
quem ela não soubesse nada, nem
o nome, mas que fosse irresistível
e que -isso faria parte do jogo-
desaparecesse no dia seguinte para que ela ficasse irremediavelmente apaixonada, coisa que não
acontece há muito tempo.
Ela sabe que é disso que está
precisando: de se apaixonar, nem
que seja pelo porteiro do prédio,
para sentir que continua viva.
Acontece que seu coração ficou
frio, como disse Cartola -foi
mesmo Cartola?-, e o último
marido já se foi há muito tempo,
aliás exatamente num dia como
esse, quando acordou com a cachorra pela última vez.
Como já se conhece, sabe que esse é um bom sinal, que é nessa hora que as coisas acontecem, para
o bem e para o mal, e que é muito
melhor se sentir assim do que ficar inerte, numa semidepressão,
pensando e não fazendo nada.
É nessas horas que a gente percebe que a vida vale a pena.
E-mail -danuza.leao@uol.com.br
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