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SAÚDE
78% dos casos de rouquidão na infância têm como origem nódulos; uso inadequado da voz pode originar problema
Calo nas cordas vocais deixa criança rouca
BERTA MARCHIORI
DA REDAÇÃO
Depois de jogar uma partida de
futebol com os amigos do prédio,
Fabrizio Fancio aparece rouco para falar com a Folha. Engana-se
quem pensa que ele se esgoelou
durante o jogo. Aquela voz, mais
grave e áspera do que à das outras
crianças de oito anos, é consequência da tensão que sentiu ao
sofrer uma falta feia e dos calos
que tem em suas cordas vocais.
Quase sempre associados a cantores e professores, os nódulos
nas pregas vocais -nome correto
para a expressão usada acima-
também aparecem em crianças.
Pesquisas indicam de 3% a 8%
de incidência de disfonia (alteração de voz, principalmente rouquidão) infantil na população. E
cerca de 78% dos casos de rouquidão constante em crianças têm
como origem nódulos.
O otorrinolaringologista Denilson Fomin, 37, da USP-Ribeirão
Preto e do hospital Albert Einstein, atenta para o fato de que nem
toda rouquidão é causada por nódulos e ressalta a importância de
se fazer um diagnóstico preciso. O
médico deve analisar a história
clínica da criança e fazer um exame chamado laringoscopia.
O nódulo é uma inflamação na
mucosa que reveste a prega vocal,
causada por trauma constante.
Quando abusamos da voz, ou se a
usamos inadequadamente, com
muita força ou tensionando o
pescoço, as pregas vocais ficam
em atrito, lesionando-as. Se esse
comportamento é constante, a
mucosa não consegue se recuperar, e os nódulos podem aparecer.
Como a voz é produzida pela vibração do ar passando pelas pregas, se elas estão lesionadas, a
criança geralmente fica rouca, pode apresentar falhas na voz, escape de ar (voz soprosa) ou ainda fazer um esforço visível para falar.
Esse é o caso do são-paulino Fabrizio. Sua mãe, a secretária bilíngue Liliana Fancio, 46, conta que,
desde pequeno, de tanta força que
Fabrizio fazia para falar, as veias
de seu pescoço chegavam a saltar.
Os nódulos foram detectados
quando ele tinha quatro ou cinco
anos, em uma laringoscopia.
A mãe diz que ele chega a perder
a voz quando fica nervoso, mesmo sem gritar excessivamente. De
acordo com ela, Fabrizio, um garoto muito independente e ativo,
acaba descarregando a tensão do
dia-a-dia nas pregas vocais.
A fonoaudióloga de Fabrizio,
Flávia Villin Denunci, 40, ligada à
PUC-SP e ao Hospital do Servidor
Público Municipal, é uma das
adeptas da tese de que a forma como a criança lida com as frustrações também tem papel fundamental no desenvolvimento ou
não dos nódulos. Sem negar outros fatores, defende que crianças
que não conseguem expressar
suas emoções eficientemente tendem a ter o problema.
Entre esses fatores, explica a fonoaudióloga Mara Behlau, 47, diretora do Centro de Estudos da
Voz, em São Paulo, e ex-presidente da Sociedade Brasileira de Laringologia e Voz, estão a própria
laringe infantil -mais predisposta ao problema devido à imaturidade dos tecidos e cartilagens-,
ambiente familiar e escolar competitivo e ruidoso, além de outros
problemas físicos, como alergia.
O tratamento é feito com terapia fonoaudiológica, acompanhada por um otorrinolaringologista.
A cirurgia é rara.
Se não for tratado, diz a fonoaudióloga Zuleica Camargo, 37, da
PUC e do Centro de Especialização em Fonoaudiologia Clínica, o
nódulo tende a continuar, podendo originar problemas na comunicação oral. Ela diz que, se a
criança tiver o nódulo durante a
fase de aquisição de linguagem
(até os seis anos), poderá ter dificuldade em transmitir alguns
sons e até na escrita. Fomin explica ainda que o não-tratamento
poderá levar o nódulo a se tornar
uma cicatriz permanente, o que
deixaria o paciente com uma voz
rouca constante.
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