São Paulo, domingo, 20 de julho de 2008

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Aqueduto secular é redescoberto no Rio

A 350 m de altitude, obra abasteceu pioneira fábrica de tecidos; mata escondeu todo o sistema, inclusive a trilha de acesso

Mesmo abandonada, obra está conservada; descoberta foi feita por dirigentes de ONG, com ajuda de ex-funcionário da fábrica

SERGIO TORRES
DA SUCURSAL DO RIO

Desaparecido em meio à floresta virgem no alto da serra do rio da Prata (zona oeste do Rio), a 350 m de altitude, um aqueduto de cem anos que abasteceu a pioneira fábrica de tecidos Bangu foi localizado neste ano por exploradores e vistoriado em junho por técnicos do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).
O aqueduto é formado por duas represas, um reservatório de pedras com capacidade de armazenar até 550 mil litros, calhas e tubulações de ferro fundidas na Inglaterra e que seguiam por 7,5 km até as proximidades da fábrica, por cima da copa das árvores, a 20 m do solo, em alguns trechos.
Com a chegada de água encanada à indústria, no século passado, o aqueduto foi desativado. Não houve preocupação de preservar o lugar, nem por parte das autoridades municipais e estaduais nem pela direção da fábrica. A mata cobriu tudo, até a trilha de acesso a partir da localidade de rio da Prata.
Com o passar dos anos, consolidou-se o abandono da rara estrutura de captação e distribuição de água para a fábrica, origem da urbanização de parte da zona oeste carioca.
Não eram conhecidos nem mapas que indicassem a localização do aqueduto, obra de engenharia grandiosa por levar, há mais de cem anos, maquinários pesados e em grande quantidade ao coração do maciço da Pedra Branca, ponto mais alto do município do Rio, a 1.024 m em relação ao nível do mar.

Redescoberta
Coube a dois dirigentes da ONG (organização não-governamental) SOS Floresta da Pedra Branca a façanha de descobrir, em bom estado, mas ameaçado por saqueadores, o aqueduto inaugurado em 1908.
Excursionistas experientes, desde 1974, do Parque Estadual da Pedra Branca, o apicultor Adilson Antônio de Lacerda, 69, e o guia Aldo Pedro Leal, 54, costumam percorrer o maciço para vistoriar açudes e reservatórios que possam vir a ser aproveitados como pontos de abastecimento de helicópteros no combate a incêndios florestais, comuns na região.
Pesquisas em documentos antigos do acervo da ONG revelaram a existência no passado de duas represas que captavam a água dos rios da Prata e Virgem Maria para o abastecimento da fábrica Bangu. Faltava a eles, no entanto, uma indicação precisa do local.
A dupla subiu a serra do rio da Prata várias vezes, mas fracassou na busca ao reservatório. Chegaram a imaginar que nada mais restava até que, em uma trilha, encontraram Higino Nunes de Castro, 65.
Explicaram a ele o que buscavam. Surpreenderam-se com a resposta: Castro foi por 40 anos administrador do reservatório, contratado pela fábrica. Levou-os até o local.
Mesmo com o fechamento da empresa, em 2005, e a aposentadoria como servente, manteve o hábito diário de subir a serra até o reservatório. Chega bem cedo, cuida dos cachorros e pássaros que cria em um casebre, e desce ao final da tarde.
Embora em completo abandono, a estrutura de alvenaria das represas e do reservatório está preservada, já que, na construção, supervisionada pelo especialista francês Joan Vidal, a Companhia Progresso Industrial do Brasil (dona da fábrica) empregou enormes blocos de pedra, cortados todos no mesmo tamanho e até hoje solidamente encaixados.
O mato tomou conta do leito do reservatório, esvaziado anos atrás por Castro, já que a água parada atraía mosquitos.
Com 5 m de profundidade, 10 m de largura e 12 m de comprimento, o reservatório levava, por dia, 5,2 milhões de litros de água à fábrica.


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