São Paulo, domingo, 21 de dezembro de 2003 |
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GILBERTO DIMENSTEIN A verdadeira herança maldita
A expectativa de vida do
homem brasileiro é de 67
anos; a da mulher é de 75 anos.
Essa diferença de oito anos explica-se não apenas pela genética
-as mulheres tendem a viver
mais do que os homens- mas
também pela mais inquietante
estatística nacional: como informou o IBGE na quarta-feira, a
violência não pára de aumentar.
E, segundo os números divulgados, de cada dez mortes de rapazes entre 15 e 24 anos, sete são
provocadas por atos de violência. Numa entrevista coletiva, o secretário da Segurança Pública de São Paulo, Saulo de Castro Abreu Filho, lavou as mãos publicamente, ao dizer que o poder de polícia chegou ao "limite". "A polícia está chegando ao limite da repressão. O que é repressão? É prisão. Temos 124 mil presos em São Paulo. Já não existe mais lugar para colocar os presos." Vivemos o paradoxo, incômodo de ser reconhecido, de que, no regime democrático, se tem produzido muito mais violência do que nos tempos da ditadura - o que revela, no mínimo, uma incompetência coletiva de promover a inclusão social. Se o Estado mais rico do país não sabe onde colocar os presos e se o seu secretário da Segurança acredita que a polícia tenha chegado a seu limite, imagine o resto. Mais um ano se encerra e podemos dizer, sem exagero, que o país não levou a sério a questão da violência. Pode-se argumentar que faltam recursos, que a crise econômica provoca limitações orçamentárias, que a polícia sofre de carências crônicas, que o nível de desemprego assumiu proporções gigantescas. Pode-se argumentar que a exclusão que germina há séculos no país é que é a nossa verdadeira herança maldita. Para o grau de selvageria a que estamos submetidos, funcionaria apenas um esforço nacional que envolvesse de modo coordenado o presidente, os governadores e os prefeitos, associados à comunidade. Isso significa, para começar, estabelecer uma política de juventude que atue preventivamente nas áreas de risco. Na falta de um projeto, abre-se espaço para "mágicas" do tipo diminuição da maioridade penal. O problema é que cada um tem o seu programa, alguns dos quais bastante interessantes. Mas é onde prevalece a engenharia de parcerias que se encontram os melhores resultados. O trágico disso é que os milhares de boas experiências brasileiras -nem precisamos ir lá fora à procura de tecnologia social- ensinam que é possível prevenir, com baixo custo, a violência. Sei que muitas ações estão ocorrendo: aumenta o número de empresas preocupadas com questões sociais, cresce o número de voluntários, avolumam-se experiências valiosas no setor público, fazendo notáveis avanços. Mas isso ainda é pouco. E-mail - gdimen@uol.com.br Texto Anterior: Muito além dos Jardins Próximo Texto: Panorâmica - Rio: Empresários de Ronaldo são presos Índice |
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