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GILBERTO DIMENSTEIN
Uma solução chamada bolsa-universidade
Ao propor a estatização de
vagas nos cursos de faculdades privadas para facilitar o acesso de estudantes mais pobres ao
ensino superior, o Ministério da
Educação terá a oportunidade de
ampliar uma das mais interessantes estratégias sociais já surgidas no país: a bolsa-universidade.
Em termos de engenharia de inclusão social, a bolsa-universidade está para o ensino superior como a bolsa-escola está para o ensino fundamental. Ainda pouco
conhecida, a experiência, desenvolvida em São Paulo e em Goiás,
é daquelas propostas que, pela
simplicidade e pela eficiência, serão, mais cedo ou mais tarde, disseminadas. Daí o interesse pela
experiência demonstrado pelo
ministro Tarso Genro.
Para ter paga a sua mensalidade, o aluno é obrigado a prestar
serviços comunitários. Não está,
portanto, recebendo um favor,
mas, sim, fazendo uma troca.
No caso de São Paulo, os custos
da bolsa são repartidos entre o
governo estadual e a faculdade. A
contrapartida é trabalhar como
educador em escolas públicas nos
finais de semana. O programa
conta com a parceria da Unesco e
do Instituto Ayrton Senna na capacitação desses estudantes para
atuar nas escolas.
Acaba de ser divulgada uma
avaliação externa da Unesp (Universidade Estadual Paulista) sobre a experiência, realizada em
São Paulo, de abrir as escolas públicas nos fins de semana -iniciativa que contou com a participação de universitários. Caíram
os índices de violência, os furtos,
as depredações e as pichações.
A participação dos universitários, na visão de pais, alunos e
professores, foi apontada como
"ótima". Mesmo assim, a avaliação dos técnicos é que muito ainda deve ser feito na formação desses estudantes como agentes comunitários de educação.
A experiência demonstrou ter,
pelo menos, quatro óbvias vantagens: 1) o aluno sem recursos adquire condições de cursar uma faculdade; 2) o contato com um desafio concreto amplia habilidades
profissionais e até intelectuais; 3)
a escola pública ganha apoio de
uma mão-de-obra qualificada; 4)
o país produz mais gente com melhor formação educacional.
Em São Paulo, por exemplo,
existe mais uma modalidade de
contrapartida, que ainda está em
teste. Em troca da bolsa, os estudantes são treinados para prestar
serviço de atendimento nos hospitais, acolhendo e encaminhando
os pacientes. Quem já teve o "privilégio" de ir a um hospital público sabe como é tumultuado o
atendimento.
Para tornar-se um modelo, o
projeto ainda tem muito a ser
aperfeiçoado. Talvez o menor dos
problemas seja o financeiro. Não
é fácil capacitar os jovens, nem
sempre as escolas estão preparadas para recebê-los e nem sempre
a comunidade está disposta a se
envolver. Discutível é também o
fato de que muitas faculdades
que recebem dinheiro pela bolsa
são ruins e acabam usufruindo de
recursos públicos.
Apesar dos naturais problemas
de algo que se inicia, esse modelo
de inclusão social é, até mesmo,
uma alternativa para o ensino superior público. Os leitores desta
coluna sabem que, há tempos, tenho apontado a injustiça da gratuidade universitária para alunos de classe média e alta. A cobrança de mensalidade é uma entre tantas alternativas de arrecadação de recursos.
É, naturalmente, difícil cobrar
as mensalidades. Uma saída intermediária seria exigir a contrapartida em serviços comunitários,
o que ampliaria os programas de
extensão na universidade. Imagine quantas centenas de milhares
de estudantes serviriam em creches, asilos, favelas, hospitais, escolas, cooperativas, museus, parques, centros de saúde.
Poucos debates são mais reveladores da verdadeira agenda nacional -essa que é feita nas ruas,
e não nos gabinetes- do que as
alternativas de acesso dos mais
pobres ao ensino superior. A contemporaneidade aqui está na
combinação do acesso mais democrático à universidade com a
criação de mecanismos institucionais que possibilitam aos indivíduos o exercício de ações públicas capazes de tornar cada um
responsável não só pelo seu destino mas também pelo de sua comunidade. Essa é, sem dúvida,
uma resposta ao narcisismo coletivo e à sua reverência exacerbada ao individualismo.
Quem sai mais beneficiado dessa experiência é o estudante. Afinal, já se sabe que estudantes que
se envolvem em desafios têm mais
propensão a desenvolver habilidades profissionais -e o que as
empresas querem hoje são pessoas capazes de lidar com problemas concretos.
PS - Muitas vezes, o principal
custo da corrupção não é o financeiro, mas a energia que drena
dos homens públicos, que, quando poderiam estar discutindo temas essenciais, são engolfados pelas questões éticas e morais. O que
estamos presenciando é mais um
exemplo dessa crônica dispersão.
O caso Waldomiro Diniz abateu
o governo e, a considerar as denúncias que se avolumam, vai
abatê-lo ainda mais. O ministro
da Educação, Tarso Genro, por
exemplo, está neste momento
mais preocupado em se defender
das acusações (sem provas, diga-se) de que estaria envolvido em
arrecadações de fundos clandestinas durante as eleições do que em
implementar medidas que melhorem a universidade.
E-mail - gdimen@uol.com.br
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