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DANUZA LEÃO
Revolta feminina
São 5h da tarde de sexta-feira
e minha impressora pifou. Fui
tentar sei lá o que, me embaralhei, troquei todos os fios e o Velox
foi para o espaço -e tente pedir
um técnico deles na sua casa para
saber o que é bom para a tosse.
Na última hora e meia tive que
pedir na farmácia uma caixa de
Lexotan (no paralelo), meu amigo das horas más me mandou
três, eu tive que pagar todas elas,
o garoto não tinha troco, desceu e
voltou -e eu atendendo o porteiro eletrônico e abrindo a porta.
Chegaram as duas cadeiras que
eu tinha mandado consertar,
meu braço sem gesso está um pavor, faço fisioterapia (sozinha) o
dia inteiro, continuo escrevendo
com dois dedos, o gato está deitado no meu peito, entre o teclado
do computador e meu pescoço e
daqui a pouco vou fazer uma nebulização, com o gato querendo
comer o fio do aparelho.
Cada vez que o telefone toca eu
tenho que sair correndo para
atender lá dentro -as últimas
três foram para a empregada-, e
me ligaram também da loja de
tapetes para me dar um orçamento. Isso numa tarde de sexta.
Meus filhos sumiram; uma está
em São Paulo, o outro foi meditar
no fim de semana; eu não tenho
com quem me queixar e estou
precisando muito. Eu preciso falar, gritar, perguntar de que cor
deve ser meu sofá, alguém tem
que me dizer que deve ser roxo
para eu poder discordar bastante,
mas não estou mais agüentando
discordar de mim mesma sozinha, com um braço meio inútil. E
detalhe: gorda.
É claro que em sete semanas parada, com um braço engessado,
sem fazer um só exercício, qual é
a alegria que você pode ter? Comer, é claro. E eu comi; e muito,
graças a Deus.
Contrariando o calendário, foram travessas e travessas de rabanadas, bolo de chocolate com cobertura, latas e latas de doce de
leite argentino, a coisa melhor (e
mais doce) do mundo, melhor do
que um namorado novo. Ainda
por cima descobri um restaurante
onde tem feijoada todos os dias
da semana, de segunda a segunda, no almoço e no jantar. O torresmo é de gritar, de tão bom -e
sem pelo-, e têm sido duas por
semana, Deus seja louvado.
Agora, eu queria saber por que
razão tenho que ser magra. As
que eu acho divinas são todas
normais: Andie MacDowell, Sharon Stone, Madonna, nenhuma é
um espeto. Espeto mesmo, só as
manequins e mais ninguém. Ai,
como a vida é difícil.
Passei décadas com fome, elegendo a magreza como a maior
graça a ser alcançada, e tinha me
esquecido do que era uma vida
normal, beliscando uma batatinha frita aqui, comendo uma empadinha de camarão ali e tirando
do meu vocabulário a palavra
dieta, único assunto entre as mulheres -dependendo da idade,
dieta e homem. E sendo feliz; comer faz as pessoas muito felizes.
Não quero mais saber de saladas e peito de peru defumado;
quero muitos pães para passar no
azeite, costelinhas de porco, lingüicinhas fritas -e sem limite.
Cansei de ser escrava do manequim 38 e pretendo ser 42 vendo o
quanto a vida pode ser melhor do
que foi nos últimos anos.
Para completar a tarde de sexta
acabam de me ligar do dentista
confirmando a hora para segunda. Razão mais do que suficiente
para eu descer e comer um sanduíche de queijo com banana
com um refrigerante.
E que não seja light.
PS.: Ainda por cima deixei de fumar e recebi um e-mail recebendo
muitos elogios. A vida está muito
insuportável.
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