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"Inchaço" piora exclusão em Anhanguera
MARIANA VIVEIROS
DA REPORTAGEM LOCAL
Na década passada, o distrito de Anhanguera (zona norte de SP) teve um crescimento populacional médio anual de 21% concentrado em áreas de ocupação irregular (grande parte delas protegidas por questões ambientais), onde o poder público não pode, por lei, colocar nada: asfalto, água encanada, coletas de esgoto e lixo, escolas, transporte, unidades de saúde nem postos policiais. O resultado do inchaço e do descompasso na oferta de serviços levou a
região a uma "ascensão" recorde no ranking da exclusão.
O distrito subiu 47 degraus, passando a ocupar a 23ª posição entre os mais excluídos da capital. A escalada da pobreza e da falta de assistência lá foi quase o dobro da verificada, por exemplo, no Jaraguá (também na zona norte), segundo distrito que mais piorou na cidade e subiu 22 degraus, chegando à 27ª posição no ranking.
As histórias dos moradores dos loteamentos clandestinos em Anhanguera são muito parecidas e mostram, na prática, o perfil traçado por Dirce Koga, colaboradora da versão 2002 do Mapa da Exclusão/Inclusão Social, e pela subprefeita da região, Eva Turin.
São chefes de família que perderam o emprego, deixaram de ter
condições de pagar aluguel, gastaram suas últimas economias num
lote, construíram uma casa como
puderam, puxaram água ilegalmente da rede da Sabesp (companhia estadual de saneamento),
despejam o esgoto em arremedos
de fossas ou na rua, queimam ou
jogam o lixo no meio do mato e
andam longas distâncias a pé para
ter acesso a um serviço público.
Os sonhos também são quase
sempre os mesmos: voltar a trabalhar (a maioria continua desempregada), melhorar as condições de vida no "bairro" ou mudar dali, o quanto antes melhor.
Em outras palavras, alcançar o
patamar dos incluídos na maior e
mais rica cidade do país.
Em busca da inclusão
"Tudo o que eu quero é comprar uma pequena chácara em algum lugar onde possa plantar e criar uns bichinhos", diz Sebastião Antunes Luz, 59, desempregado desde meados dos anos 90.
Nascido em Minas Gerais, ele
foi um dos primeiros a mudar,
com a mulher, Maria de Lourdes,
38, e os cinco filhos dela, para o
Jardim Paineiras -o mais novo
loteamento de Anhanguera, que
tem 90 casas, erguidas em cinco
anos, e outras 50 a caminho.
Fugindo do aluguel e da violência da favela, Tião gastou os R$
1.900 que ganhou ao ser demitido
comprando o terreno e teve de
construir a casa com tábuas. A família não tem chuveiro; toma banho de caneca, com água aquecida no fogão a lenha. "Não podemos pagar gás. Nossa única despesa é com energia, mas já temos
umas quatro contas atrasadas."
Água na torneira
Ciente da situação caótica na região, a Sabesp afirma considerar
Anhanguera área prioritária para
regularização do abastecimento
de água, embora reconheça que é
muito difícil atender à demanda
num terreno tão acidentado e irregularmente ocupado. A companhia espera a liberação de cerca de
R$ 40 milhões, que serão investidos em saneamento no distrito.
Mas o benefício não vai atingir a
parcela da população que vive em
área de proteção ambiental, como
é o caso da dona-de-casa Célia
Maria de França, 26, recém-chegada ao loteamento Itaberaba 2.
Invadindo trecho da serra da
Cantareira, um dos mais importantes mananciais da capital, o
barraco de madeira de Célia foi
construído há pouco mais de um
mês, um ano depois de a Secretaria Municipal da Habitação ter catalogado todos os imóveis do local
e proibido novas obras. "Não sabia que não podia construir", diz
Célia. Ao lado do barraco, uma
grande placa vermelha, com o logotipo da prefeitura avisa da proibição, que ninguém cumpre.
"Quem não tem vontade de viver num lugar melhor? Mas isso
aqui é o que dá para ter agora", diz
ela, enquanto a filha menor, Karoláine, 2, se diverte tomando banho com água tirada de um balde.
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