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Para especialistas, adolescentes já vivem em prisão
AURELIANO BIANCARELLI
DA REPORTAGEM LOCAL
Na prática, a redução da idade
penal já vem ocorrendo, os infratores nas Febens estão sendo tratados como adultos em prisões,
dizem especialistas.
"O sistema prisional já está instalado para os infratores, independentemente da idade. Na prática, pelo menos no Estado de São
Paulo, já houve a redução da idade penal. Os adolescentes têm horário para tomar sol, ficam nas celas como castigo, sem falar na violência que sofrem. O ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente)
nem foi implantado ainda e já estão querendo mudá-lo."
Quem afirma é a professora da
PUC Maria de Lourdes Trassi Ferreira, que estuda a relação entre
violência e adolescência a partir
dos anos 60. No ano passado, ela
participou de um mapeamento
nacional sobre adolescentes em
privação de liberdade coordenado pelo Ministério da Justiça. A
conclusão é que muitos saíam
piores do que entravam.
"Eles deixam a Febem brutalizados, desumanizados, mais perigosos", diz a professora da PUC.
Para ela, a "Febem é uma instituição arcaica que conserva resquícios da ditadura, como a tortura".
"A Febem substituiu a educação
pela violência", diz Ana Bahia
Bock, presidente do Conselho Regional de Psicologia. "Ainda há
orientadores e educadores que
acreditam na tortura como forma
de tratar os infratores mais graves. A violência pode ter reduzido, mas os ninjas continuam lá."
Os ninjas não são lendas -"são
funcionários encapuzados que
entram nos alojamentos e espancam os menores", ela explica.
Bock diz que relatos dessas
ações foram levados ao Ministério
Público dois anos atrás.
A Sub-Secretaria de Promoção
dos Direitos da Criança e do Adolescente, ligada à Presidência da
República, defende a internação
como último recurso, com melhoria das unidades de internação, e prioridade absoluta às medidas em meio aberto. "A internação é um estigma que marca o
adolescente pelo resto da vida",
diz a psicóloga Juliana Murad, assessora técnica da sub-secretaria.
Só o Estado de São Paulo tem
6.500 internos em 70 unidades.
Futuro sem cadeia
A professora da PUC afirma que
os adolescentes precisam ser responsabilizados por seus atos e alguns mantidos em meio fechado.
"Mas têm de ser tratados com dignidade e humanidade. Nada justifica outra atitude."
Para Ana Bock, o desafio está
em adequar a instituição. E "em
lidar com jovens que vivem num
meio altamente consumista e em
grande desigualdade social e econômica". Na sua opinião, os pais
de classe média sofrem com o tiro
que seus filhos podem levar, e os
pobres sofrem o terror de verem
os seus filhos darem o tiro.
"Não é de estranhar que esses
meninos ajam assim. A surpresa é
se fossem bonzinhos. O que estamos assistindo é o que construímos. A sociedade quer transformar os meninos em bodes expiatórios, mas o fato é que só sabemos tratar a violência com mais
violência, não com educação."
Anos atrás, quando outra campanha pela redução da idade penal foi levantada, o Conselho de
Psicologia lançou a frase "O futuro do Brasil não merece cadeia".
Como presidente de um conselho de classe, Ana Bock diz que a
grande frustração dos psicólogos
é não conseguir convencer a sociedade de que "a violência gera
mais violência". "Não somos ouvidos. Isso nos deixa indignados e
impotentes", afirma.
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