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DANUZA LEÃO
Perigosa liberdade
Uma das coisas que mais se
quer na vida é ser independente e livre, o que significa não
precisar nunca de ninguém para
nada.
É claro que é sempre bom ganhar o seu próprio dinheiro para
não depender da mesada do pai
ou do marido; a partir dos 16 (oito, para os mais precoces), todos
queremos ser donos dos nossos
próprios narizes -com razão-,
pois, por mais cruel e injusto que
seja, quem assina o cheque é
quem manda.
Quem manda escolhe onde
quer morar, como vai decorar a
casa, para onde viaja, em que colégio vai botar os filhos, que programa de televisão vai assistir
-o famoso poder do controle remoto-, o CD que vão ouvir. O
mundo deveria ser mais democrático? Deveria, respondemos todos em coro. Só que não é, e como
se dizia antigamente, manda
quem pode, obedece quem
tem juízo. A expressão saiu de
moda só para fingir que as coisas
mudaram.
Aí você se prepara para ser autônoma, no trabalho e na vida
pessoal. Não tem patrão, o que
significa que faz seus próprios horários, e dependendo da profissão
pode até escolher trabalhar nos
fins de semana e ficar de pernas
para o ar de segunda a sexta; tem
liberdade maior? Além disso, se
desliga das turmas; quem tem
turma não é livre.
De desligamento em desligamento, não almoça na casa da
mãe nos domingos, não liga para
Natal nem para o Dia das Mães, e
quando os filhos partem para a
vida também não têm a obrigação de almoçar com ela, o que,
aliás, é uma benção: filhos em casa nos feriados significa a obrigação de ir para o fogão. Obrigação,
esse horror.
Pelas mesmas razões, quem é
obcecada pela tal da liberdade
não tem cachorro nem gato; como
faz uma pessoa com um bicho em
casa, quando o que quer é pegar a
estrada no dia e na hora em que
der na telha? Também não deve
ter empregada fixa para não criar
vínculos de amizade inevitáveis,
que obrigam a perguntar se arranjou colégio para o filho e se a
obra da casa ficou pronta -e
ajudar, claro. Ser livre é não ter
que prestar contas da vida a ninguém, ser dona do seu espaço e do
seu tempo, não depender de ninguém e não ter quem dependa dela sob nenhum aspecto, nem financeiro nem afetivo.
Só que tudo tem seu preço, e de
liberdade em liberdade ela vai se
isolando.
O telefone toca cada vez menos
-bem como ela queria-, a correspondência vai rareando e até
aqueles convites para lançamento de livros e exposições de pintura que tanto a irritavam não
chegam mais. É aquela velha
história: ninguém quer ser esquecida, mas não tão completamente
assim; mas, se começar a aceitar
convites, vai ter que retribuir,
olha o problema. TER QUE, o
maior pesadelo de uma pessoa
que sempre colocou a liberdade
como o bem supremo a ser
conquistado.
Ela conquistou, só que às vezes
se sente só e se pergunta: se eu pudesse apertar um botão mágico,
onde gostaria de estar nesse momento, e com quem?
Não precisa nem pensar para
responder: exatamente como está, onde está, ali mesmo, e sozinha. Mas não seria isso a felicidade plena?
Não tem coragem de ir mais
fundo, responde para ela mesma
que "mais ou menos", muda de
assunto e liga a televisão.
E-mail - danuza.leao@uol.com.br
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