São Paulo, domingo, 25 de julho de 2004

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NA RUA

Com aparelhos de rádio, televisão e acessórios, veículos utilizados para recolher papel e metal viram alvo de roubos

Catadores equipam as carroças e atraem até ladrões

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DO "AGORA"

Nas rodas, calotas modernas. Na cabine, um aparelho de som e uma televisão portátil, além de enfeites pendurados no pára-brisa. Retrovisores ajudam a ter uma visão melhor do trânsito. É a descrição do veículo de Otaviano Tibutino Cordeiro Filho, 39. Mas ele não dirige um carro possante. Na verdade, usa suas parcas economias para "turbinar" seu instrumento de trabalho: tem uma carroça e vive de catar papel e metal nas ruas para revender.
Os apetrechos que deixam seu "carro" mais bonito, entretanto, são um chamariz para uma nova modalidade criminosa na capital paulista: os roubos de carroça.
"Estacionei perto de casa e fui descansar. Ao acordar, ela não estava lá", conta Cordeiro Filho, que teve um prejuízo superior a R$ 285 por causa do furto de seu veículo -junto com a carroça (cujo valor ele não soma, mas que chega a custar R$ 170 num serralheiro) foram levados um rádio de R$ 100, uma TV pequena (R$ 120), dois pneus novos (R$ 35) e R$ 30.
Segundo vítimas, os ladrões geralmente são viciados em drogas, que revendem os utensílios da carroça ou trocam por pedras de crack ou cigarros de maconha.
Com andanças que duram até 15 horas por dia, Cordeiro Filho conseguiu montar um novo veículo. Sua nova carroça tem uma cabine pintada de amarelo. Dispõe ainda de rádio, TV, antenas, lanternas, retrovisores, dois alto-falantes, um banco para levar as filhas -de um e dois anos- e até câmbio. A tampa de vidro de um fogão serve de pára-brisa.
Pernambucano que atua como catador há quatro anos, ele arrecada mensalmente de R$ 150 a R$ 200. Já trabalhou em padarias e pastelarias. "Se eu arranjasse outro emprego, largaria a carroça. É muito cansativo", disse ele, que mora na favela do Moinho, no Bom Retiro (centro). Em busca de um bom carregamento de metais, ele já "viajou" até Osasco (Grande São Paulo). "Fui num dia e voltei no outro. No caminho de volta, fui vendendo tudo", afirmou.

"Luxo"
Segundo levantamento do Instituto Polis, há cerca de 12 mil catadores de papel na capital.
Para suportar a peregrinação diária em busca de metais e papelão, Cosmo de Souza, 28, faz questão de, ao menos, ter um luxo. "Fico o dia todo ouvindo CDs de rap, senão eu estresso", diz. Para ter esse prazer, Souza instalou um toca-CDs da marca Pioneer -cultuada pelos amantes de som em automóveis- em sua carroça.
Duas caixas de som emitem o rap. "Carrego duas baterias de carro para poder ouvir o dia inteiro", diz o fã do rapper NDee Naldinho e dos Racionais MC's.
Há alguns meses, num "descuido", furtaram a frente removível do toca-CDs. "Já tentaram roubar a carroça inteira. Agora comprei uma corrente grossa para prendê-la." E ele adotou um "guardião": Bethoveen, uma mistura de pastor alemão com rottweiler.


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