São Paulo, quinta-feira, 27 de outubro de 2011

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MINHA HISTÓRIA NATÁLIA PAES, 30

Sem direito ao luto

Casal espera há um mês para enterrar filha , cujo corpo sumiu em hospital

RESUMO
A assistente administrativa Natália Paes, 30, perdeu a filha, Isabel, de apenas seis dias, que nasceu prematura, com 26 semanas e 490 g. O bebê morreu em 27 de setembro no Hospital de Clínicas de Niterói (RJ). Quando voltou ao HC, após dois dias em que teve de providenciar registros de nascimento e óbito, o corpo havia sumido. Um mês depois, Natália e o marido, o comerciante Rodrigo Martins, 30, ainda não conseguiram enterrar Isabel.

(...) Depoimento a

DIANA BRITO
DO RIO

Após cinco anos de relacionamento, eu e meu marido decidimos ter um filho. Em abril estava grávida. Em 1º de setembro, a médica pediu que me internasse porque minha gravidez era de alto risco por uma série de fatores, como pouco líquido amniótico e infecção.
Ela me explicou que minha filha iria nascer prematura e a ideia era mantê-la em minha barriga o máximo possível.
Fui para o Hospital de Clínicas de Niterói por ser o mais próximo com UTI neonatal. Dias depois, minha filha piorou e tive que fazer uma cesariana de emergência.
Muito aflita e com medo de perder minha bebê, pedi que não esperassem. Naquela tarde, às 14h36, Isabel nasceu e foi direto para a UTI.
Recebi alta no dia 23. Continuei a visitar minha filha diariamente. Todos no HC já tinham ouvido falar da menininha de meio quilo que não parava de se mexer. Por várias vezes pegamos Isabel segurando uma mangueirinha da incubadora, como um brinquedo.
Quando tudo parecia bem, percebemos algo errado no dia 27. Nossa filha estava pálida e quase não se mexia. Só quando segurei sua mãozinha é que esboçou alguns movimentos.
A doutora nos disse que o quadro havia piorado muito depois de uma hemorragia intracraniana. Minutos depois, recebemos a notícia da morte da minha Isabel.
No dia seguinte, fizemos o registro dela no cartório. No dia 29, enquanto eu aguardava no cemitério, Rodrigo foi ao hospital com um agente funerário para liberar o corpo.
Com parentes e amigos, fiquei mais de duas horas à espera da Isabel. Só no final da noite o Rodrigo chegou lá e me contou que o corpo tinha desaparecido. Eu só sabia chorar.
O que me deixa com mais medo é que ela sumiu logo depois do falecimento. Pode ter um crime muito pior nisso.
Por que alguém ia sumir com ela logo após a morte, quando os órgãos ainda não estavam em decomposição? Se o enfermeiro-chefe diz que por volta das 18h a levou para o setor de necrotério, como às 19h30 ela não estava mais lá?
Como se não bastasse o sofrimento, no dia do registro na 76ª DP (Niterói), o delegado se referiu à minha filha como 'massa', na frente da imprensa. Meu marido contou que ele [delegado] disse que eu não estava em condições de falar com os jornalistas porque, afinal de contas, fui eu quem 'fabricou a massa', mas a 'massa deu defeito'. Ficamos indignados.
Ele ainda disse que o hospital já havia registrado a ocorrência e que a gente poderia se arrepender de fazer outro registro. Falou que não seria bom ficar mexendo muito nas coisas, porque poderiam aparecer outras. Registramos.
Só quero justiça. Isso não pode ficar impune. Tenho o direito de enterrar o corpo da minha filha. Isso não pode ser um sofrimento eterno.


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