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DANUZA LEÃO
Opções de vida
A vida é muito interessante
e não pára de mudar; ou somos nós que mudamos a vida o
tempo todo? Por isso não consigo
imaginar, admitir, acreditar,
conceber que alguém possa se
cansar de viver ou ter um minuto
de tédio durante a vida.
Bem, como eu já contei, passei
dois meses com o braço engessado, e durante esse tempo a única
roupa que podia usar era uma camiseta de homem bem grandona,
para que o braço com gesso passasse pela manga. Providenciei
quatro -R$ 18 cada uma-, nas
Lojas Americanas: duas brancas,
uma preta, uma azul-marinho, e
como fiquei com medo de escorregar de novo, sapato, só tênis.
Durante esses dois meses, esse
foi meu uniforme, e no quesito
moda nunca fui mais feliz. Agora,
que posso usar o que quiser, me
deu o maior cansaço de roupa,
porque percebi que tanto faz se a
camiseta for Chanel -US$ 350-
ou do camelô. A não ser as pessoas que só pensam nisso, têm um
olho de microscópio e sabem, ao
primeiro relance, onde foi comprado o botão de sua blusa, ninguém está nem aí. Durante o espaço de uma vida são tantas horas pensando em roupa, tanto dinheiro gasto em roupa, e daí? É
bem possível que essa vaidade
volte, mas vou ter muitas saudades do tempo em que não pensei
durante um só minuto no que eu
ia usar.
Voltando ao assunto dieta: já
contei que nesses dois meses entrei nos mais deliciosos prazeres
do paladar, e o resultado foram
quatro quilos a mais, coisa que ja-mais me aconteceu. Entrei naquela de "eu quero é ser feliz",
mas na última quarta-feira fui
me vestir para sair, o zíper da calça não fechou e estou sem saber o
meu destino: se entro em depressão ou se assumo que virei uma
gordinha. Parafraseando o deputado José Genoino: quem sempre
foi gordinha é uma coisa, quem
sempre foi magrinha e fica gordinha é outra coisa.
Fiquei pensando na minha antiga vida de magra. A qualquer
hora do dia ou da noite, se eu via
na TV ou numa foto um pedaço
de pizza com queijo derretendo
-como é lindo!- ou um Sonho
de Valsa, imediatamente vinham, em cadeia, diferentes sensações: a do desejo, seguida imediatamente pela frustração de
não poder provar do fruto proibido, e, se provasse, a culpa acompanhada do castigo: os quilos que
nem tardam nem falham. E isso é
justo?
Tenho uma amiga que mora
em Paris e que há 25 anos não come um chocolate. Detalhe: ela
adora chocolate.
A vida é sempre um problema
de custo/benefício; no caso dela, o
benefício é um só: quando entra
nos lugares, ouvir das amigas "como você está magra, que coisa
maravilhosa, como faz para conseguir manter esse corpinho de
sílfide" etc. e tal. A partir daí a
noite está resolvida, e o único assunto será dieta, dieta, dieta -e
ginástica. Uma bebida na mão e,
a cada bandeja de canapé que
passa, vários sofrimentos: desejo,
frustração e culpa. Ou sofre pelo
desejo não realizado, ou come
quatro e vai morrer de culpa, e de
qualquer maneira vai ficar frustrada porque gostaria de ter comido 38. Isso lá é vida?
Outro dia vi Sharon Stone na
TV, com um vestido bem decotado; dava para contar todos os ossos do seu colo, e me lembrou um
esqueleto. Será que é por aí?
Como diz uma amiga, prazer
faz bem à saúde, e não sei se viver
para ser magra é dos objetivos
mais nobres do ser humano. Sendo assim, tenho que fazer uma
opção: ou continuo gordinha, ou
volto à vida que todo mundo sabe, ou providencio dois gessos
móveis, um para o braço e outro
para a perna.
Dessa maneira o assunto moda
fica automaticamente superado,
e ninguém nunca vai reparar se
estou gorda ou magra.
Felizes mesmo são as muçulmanas, que só tiram as burcas em casa, para os maridos -que, aliás,
a-do-ram uma mulher bem cheinha.
E-mail - danuza.leao@uol.com.br
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