|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
GILBERTO DIMENSTEIN
Prioridade de Serra à saúde é social ou eleitoral?
Falta muito tempo para a
eleição, mas, por enquanto, a
vitória programática é do PSDB
na cidade de São Paulo: o partido
está conseguindo impor, na agenda, a saúde como a prioridade
máxima da cidade de São Paulo e
fazendo Marta correr atrás.
Pesquisa Datafolha publicada
ontem revelou dianteira de Marta Suplicy (34%) contra José Serra
(30%) quase no limite da margem de erro. Levando em conta,
porém, as simulações de segundo
turno e as taxas de rejeição, o
candidato tucano é, até este momento, o favorito, com larga margem de vantagem. Parte dessa
vantagem se deve, como sugere a
pesquisa, à exploração do tema
da saúde, apresentado como a
prioridade das prioridades. É um
acerto social ou eleitoral?
É óbvio que esse é um dos assuntos vitais de uma comunidade
e, mais óbvio ainda, que a situação é vexaminosa e que todos os
candidatos têm a obrigação de estar preocupados com o atendimento médico e ambulatorial do
município. Tal tema, entretanto,
está onde está menos pela gravidade da questão que pela conveniência eleitoral.
Quando decidia se saía candidato, Serra viu, em todas as pesquisas, que a saúde constituía a
área mais vulnerável da gestão de
Marta Suplicy; as reclamações
eram generalizadas -especialmente, nos bairros mais pobres. A
pesquisa do Datafolha constata
que, neste momento, a saúde passou a ser a maior preocupação
dos paulistanos, desbancando o
emprego e a segurança -dois assuntos em que um prefeito tem limitada margem de ação.
Uniu-se, então, uma ansiedade
popular a uma biografia. A passagem pelo ministério conferiu a
Serra, mais uma vez segundo as
pesquisas, uma imagem positiva
como gestor na área de saúde.
Uma parte expressiva dos votos
que obteve na sucessão presidencial, na qual foi derrotado por Lula, veio por causa dessa imagem.
Marta Suplicy dispõe de obras
para mostrar em educação, com
os vistosos CEUs, além dos programas de renda mínima e do bilhete único. É difícil, portanto, no
jogo de imagens, atingir Marta
nos quesitos educação, transporte
e renda mínima.
Sobrava ao candidato do PSDB
atar-se ao prestígio do governador Geraldo Alckmin e investir no
tema municipal que lhe é mais familiar -e, pelo jeito, ele está
acertando. A pesquisa do Datafolha indica que Serra cresceu mais
entre as mulheres, sensíveis a
questões de saúde.
Serra falou em distribuir remédios pelos Correios, Marta anunciou, já para agora, a medida. Em
meio a bate-boca, na semana
passada, falou em mais testes pré-natais, Marta jurou que já faz o
que ele promete, cada um acusando o outro de desinformação.
Para completar, a prefeita
anunciou, em grande estilo, os
CEUs da saúde, sem dizer quanto
custarão nem de onde vai tirar o
dinheiro. Serra sentiu o golpe e
disse que aquilo era "obra" de
Duda Mendonça.
Entendem-se, portanto, as razões de Serra e Marta. Um julgamento técnico, frio, fora das conveniências eleitorais, lançaria a
seguinte questão: qual o investimento social de maior retorno?
Não é a saúde. É a educação.
É universalizar a pré-escola,
treinar ainda mais os professores,
aumentar o número de horas em
sala de aula, oferecer mais programas extracurriculares e mais
atividades culturais, bem como
criar mais estímulos à leitura e à
escrita, além de instituir nas escolas programas de prevenção das
drogas, do álcool, das doenças sexualmente transmissíveis e da
violência.
Há estudos e mais estudos que
mostram, matematicamente, como a sociedade recebe de volta
em riqueza cada ano a mais de
escolaridade investido em seus cidadãos. E recebe mais ainda
quando se formam estudantes
empreendedores, protagonistas,
capazes de abrir negócios, de mudar sua comunidade, de aperfeiçoar-se profissionalmente.
Um dos principais sinais da fragilidade do Brasil é justamente
este: a educação ainda não se
transformou em uma obsessão
nacional. A população está tão
presa a seus dramas imediatos,
avassaladores, que não transformou as escolas e, principalmente,
os professores em núcleos essenciais da produção de riqueza comunitária.
O problema é que educação é
uma plantação que só se colhe
muitos anos depois por pessoas
que nem disseminaram as sementes. Não obedece à lógica do tempo real da política e, em especial,
do marketing. Tanto isso é verdade que os CEUs fazem mais sucesso como centros comunitários,
com suas piscinas, teatros e cinemas, do que como escolas. E quase ninguém acompanha o esforço
municipal (e, vamos reconhecer,
há algum esforço) para melhorar
os professores.
PS - Se algum dia quiserem mesmo fazer uma revolução na educação, será necessário, antes de
mais nada, criar uma nova carreira no magistério. Os professores e, em particular, os diretores
terão de aprender não apenas a
lidar com a sala de aula mas a serem empreendedores sociais, gente que mobiliza todos os recursos
disponíveis na comunidade.
Quando se conhece uma boa escola pública, geralmente, eu diria
quase sempre, ou mesmo sempre,
se descobre um diretor que vai
além da sala de aula e atua como
um pedagogo comunitário.
E-mail - gdimen@uol.com.br
Texto Anterior: Sobreviventes Próximo Texto: Maratona: Filas e multidão são parte do lazer dos paulistanos Índice
|