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CRIME ORGANIZADO
Ações de combate se ressentem de uma união de esforços federais e estaduais e entre as várias instâncias
Equipe de trabalho deverá unir Poderes
ELIANE CANTANHÊDE
DIRETORA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
ANDREA MICHAEL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A guerra ao crime organizado
não está começando do zero. Já há
16 projetos para endurecer a lei,
1.549 páginas de informações colhidas em duas CPIs, 945 indiciados e cerca de 300 presos. O que
continua faltando é vontade política para juntar esforços federais e
estaduais e entre as várias instâncias de poder.
Para preencher a lacuna, o Ministério da Justiça e ex-integrantes da CPI do Narcotráfico, encerrada em dezembro de 2000, estão
discutindo a formação de uma
equipe permanente de trabalho
conjunto unindo Executivo, Legislativo, Judiciário e Ministério
Público. No Congresso, foi criada
a Comissão Permanente de Segurança Pública.
Uma análise preliminar indica
que os processos não são concluídos, alimentando a impunidade
-e suas consequências a favor do
próprio crime organizado e contra os ânimos da sociedade.
As investigações são feitas e há
prisões, mas na hora de condenar
a lentidão impera. Junte-se a isso
a lavagem de dinheiro, que sustenta os criminosos e coloca em
xeque as ações de combate às facções do crime organizado.
A CPI do Narcotráfico, que propôs o indiciamento de 800 pessoas supostamente ligadas ao negócio, não avançou nesse tema.
"Os lavadores de dinheiro são a
categoria emergente nos segmentos do crime", diz o delegado Getúlio Bezerra, responsável pela
Coordenação Geral de Prevenção
e Repressão a Entorpecentes da
Polícia Federal e professor da
Academia Nacional de Polícia.
"Se não se combater a lavagem
de dinheiro, nada feito, é tudo
perda de tempo. Um líder criminoso vai para a cadeia, mas vêm
outro e outro, e o crime continua
sem fim", acrescenta o relator da
CPI, deputado agora reeleito Moroni Torgan (PFL-CE).
Essa CPI indiciou 824 pessoas
em todo o país sob suspeita de envolvimento com o narcotráfico.
Como desdobramento, a CPI do
Roubo de Carga, encerrada em
dezembro de 2002, indiciou mais
121 suspeitos.
Esse conjunto inclui alguns dos
mais famosos criminosos do país,
que estão até hoje nas manchetes
dos jornais, como Fernandinho
Beira-Mar, capaz de fechar o comércio de bairros inteiros no Rio
de Janeiro a partir da cadeia. Apesar da demonstração de força, ele
nem é, hoje, o mais importante
personagem do narcotráfico.
Mais forte ainda é Leonardo Mendonça, preso em Goiânia.
Enquanto Beira-Mar se destaca
mais internamente, Mendonça lidera a "exportação" de drogas pesadas para os grandes mercados
mundiais, como os Estados Unidos. Ele é citado no relatório final
da CPI do Narcotráfico no item
"Conexão Suriname".
Segundo o delegado Bezerra, o
tráfico internacional é o ramo
mais importante da rede, "pelo
seu potencial ofensivo, pelo dano
social que causa, pelo sentimento
de insegurança generalizado, pela
dependência das pessoas". Além
de ser, também, o mais rentável.
Estima-se que o negócio movimente entre US$ 300 bilhões e
US$ 500 bilhões no mundo.
Além de Mendonça e Beira-Mar, foram listados personagens
já bastante conhecidos nacionalmente, como os ex-deputados federais Hildebrando Pascoal e José
Alecsandro, hoje presos no Acre,
e o ex-presidente da Assembléia
Legislativa do Espírito Santo José
Carlos Gratz.
Gratz foi investigado pela CPI
por suposto envolvimento na rede de cassinos e jogo de bicho. Em
resposta, classificou o relatório de
"papel higiênico usado". Está preso sob acusação de crime eleitoral.
Engrenagem
A engrenagem do crime organizado se articula em todo o país,
unindo ações de São Paulo ao
Acre, de Goiás ao Maranhão. Começa com o narcotráfico e acaba
com a lavagem de dinheiro. Entre
os dois, há uma longa e variada
lista de negócios: tráfico de armas,
roubo de carga e de carros, sequestro, pistolagem, além dos
chamados "crimes invisíveis"
-leia-se: "corrupção".
O tráfico de armas e de cargas
azeita a engrenagem, porque são
comercializadas nas fronteiras
em troca de drogas, com um número alarmante: calcula-se que
cerca de 90% das armas que circulam no Brasil sejam ilegais. Em
operações variadas, que não visavam diretamente armas, a Polícia
Federal apreendeu 238 unidades
no ano passado. A mais comum
foi o revólver calibre 38.
Entre os "crimes invisíveis" incluem-se, por exemplo, os desvios
da Previdência Social, que tornaram famosa a advogada Jorgina
de Freitas, condenada a 14 anos e
cumprindo pena em regime semi-aberto no Rio.
Em 2002, uma força-tarefa que
envolve Ministério Público, auditores, procuradores e policiais federais analisou 10.799 processos
de irregularidades. Constatou que
o conjunto já havia produzido
prejuízos de R$ 772,5 milhões para o INSS.
Esse conjunto é classificado de
"crime organizado" porque reúne, de acordo com a Academia de
Polícia, características como cadeia de comando, planejamento
empresarial, controle territorial e
antijuridicidade -que significa a
capacidade "técnica" de escapar
da polícia e da Justiça, inclusive
corrompendo autoridades.
Entre os 16 projetos para recrudescimento da lei penal propostos
pela CPI do Narcotráfico, destacam-se: aplicação de pena em dobro para quem usar crianças e
adolescentes; facilitação de bloqueio de bens de suspeitos; aumento das possibilidades de quebra de sigilos fiscal e bancário.
A intenção, nestes dois últimos
casos, é tirar o fôlego financeiro
dos criminosos. É isso que alimenta suas atividades mesmo
quando estão presos.
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