São Paulo, domingo, 01 de dezembro de 2002

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Bancos privados já estão prontos para emprestar mais, diz Febraban

DA REPORTAGEM LOCAL

O presidente da Febraban, Gabriel Jorge Ferreira, diz que os bancos privados estão prontos para financiar o desenvolvimento econômico, concedendo mais crédito e financiando menos o déficit público. Mas, para isso, serão necessárias profundas mudanças no país. Ele diz que a legislação atual protege o devedor e facilita o não pagamento de dívidas, o que encarece o custo do dinheiro na ponta do crédito.
Já o juro básico da economia, a Selic, só poderá cair com o recuo da inflação e o ajuste das contas públicas. Veja abaixo trechos da entrevista que ele concedeu à Folha na última quinta-feira.
(SANDRA BALBI)

Folha - Que papel devem ter os bancos privados no financiamento do desenvolvimento econômico?
Gabriel Jorge Ferreira -
Os bancos estão preparados para financiar a retomada do crescimento, têm plenas condições de participar desse novo processo. Tenho apenas insistido, nas conversas com a equipe que assessora o presidente eleito, que é necessário fazer uma revisão na legislação de forma a eliminar fatores que distorcem a qualidade do crédito e da intermediação financeira.

Folha - Que tipo de mudanças são essas?
Ferreira -
Hoje temos um regime jurídico que impacta a qualidade do crédito e eleva o "spread" bancário. A dificuldade que se tem de cobrar o principal é muito grande em função de várias possibilidades que a legislação dá ao devedor de questionar a exigibilidade do crédito. O crédito imobiliário foi o que mais sofreu com isso, pois chegou a níveis de inadimplência de quase 40%.

Folha - Essa inadimplência e a contestação de dívidas por parte dos devedores não decorrem das altas taxas de juros que tornam o débito impagável, em muitos casos?
Ferreira -
Não há dúvida nenhuma que tem esse aspecto, sim. A taxa de juro praticada no Brasil é muito alta em função do ambiente macroeconômico em que nós vivemos. Mas não me parece razoável que, por isso, o devedor deixe de pagar o principal. Isso acarreta uma distorção com repercussão significativa na expansão do crédito. A legislação precisaria ser aprimorada para que fiquem claros os direitos e obrigações do banco e do tomador de recursos.

Folha - E isso permitira reduzir os juros?
Ferreira -
Sem dúvida nenhuma. Estou convencido de que se você tiver uma legislação que discipline a concessão de crédito, ou a regulação das relações entre credor e devedor, não deixando nenhuma dúvida de que recursos protelatórios ou que a pretexto de discutir uma garantia ou encargos o devedor deixe de pagar o principal, nós teremos uma expansão do crédito e uma redução do custo do dinheiro.

Folha - É possível ter crescimento econômico com a taxa básica de juro em 22%?
Ferreira -
Reduzir a taxa básica vai depender naturalmente de decisões sobre um conjunto de medidas: a taxa alta tem o componente da inflação, do déficit público e isso atrasa a discussão das reformas tributária e da previdência. O déficit público, que leva a essa necessidade de ter uma dívida pública alta em relação ao PIB, só se resolve com redução de despesas ou aumento da arrecadação. Ou, então, se continua aumentando o endividamento.

Folha - Será possível ter uma redução da Selic no próximo ano? Os últimos aumentos não geraram uma "gordura" que dão ao novo governo uma boa margem de manobra?
Ferreira -
Sem dúvida, um dia antes da reunião do Copom eu apostava que ele fosse manter a taxa inalterada. Creio que esse reaquecimento da inflação foi muito fruto da súbita desvalorização do real. Essa inflação, no meu modo de ver, reproduz muito mais a alta do dólar que uma tendência inflacionária bem caracterizada. Mas o Copom tomou a decisão baseado em informações, certamente, muito mais completas que ele possui.

Folha - Na sua opinião, o que pode acontecer com os bancos se houver um recuo da taxa Selic? Os bancos vão perder rentabilidade?
Ferreira -
Os bancos vão se ajustar, eles vão se adaptar. Quando houve o Plano Cruzado eles se ajustaram dando crédito. Eles estão prontos para se ajustar às novas regras. Vão diversificar sua atuação, têm um histórico de eficiência e capacidade de reagir.

Folha - Mesmo que implique uma redução das margens de lucro dos bancos?
Ferreira -
A questão de lucro de bancos tem sido muito falada, mas acho que os bancos são instituições extremamente reguladas, têm níveis altíssimos de capitalização, têm regras internacionais a que obedecem e constituem reservas e provisões extremamente elevadas, pois correm riscos altos. E operam com muita eficiência. Mas também há exemplos de insucesso, bancos que fracassaram e foram liquidados.


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