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LUÍS NASSIF
O rei do riso
É curioso como, mais e
mais, o humorismo vai se
restringindo a uma classe menos
sofisticada, menos abrangente
de público. Nem se pense que tenha sido um gênero "fino". Ao
longo da minha infância, da
adolescência, mesmo na maturidade dos anos 70, o humorismo
no rádio e na televisão costumava ser óbvio, às vezes grosso, às
vezes um pouco mais sofisticado,
mas era um gênero de ampla
aceitação em todas as classes.
Havia o humorismo popular
dos rádios e das duplas caipiras,
de Alvarenga e Ranchinho, Jararaca e Ratinho, Zé Fidélis, que
era um executivo da Antarctica
que, nas horas vagas, fazia seus
shows de humor.
O humor caipira foi uma constante já no teatro de revista, antes mesmo de Cornélio Pires e do
Capitão Furtado. Os programas
de rádio criaram um padrão
que, mais tarde, derivou para o
cinema da Atlântida e, depois,
ajudou a consolidar o grande
padrão Globo de entretenimento.
"Balança Mas Não Cai", humorístico do rádio, era um programa ouvido em todo o país.
Quadros como "o primo pobre e
o primo rico", "meu marido Oscar", sobreviveram ao rádio e se
tornaram sucesso em televisão.
Sem contar os filmes da Atlântida, os clássicos de Oscarito, Ankito, Grande Otelo, Zeloni, Zé
Trindade e o humorismo caipira
de Mazzaropi.
Creio que foi nos anos 60 que
começou a ressurgir o showman,
o humorista capaz de, sozinho,
sustentar um show, e que desapareceu com o fim dos cassinos.
O início da televisão consagrou
a versatilidade de Chico Anysio e
Jô Soares, o histrionismo irresistível de Golias, o mais engraçado
sujeito que já conheci, de Costinha e de Colé. Quem não se lembra de Chocolate, o grande compositor, que sobrevivia de quadros humorísticos? Nos quadros
-"esquetes", como se chamava
na época- sempre havia o bicha, o machão, o negão desdentado, a mulher burra e outros tipos politicamente incorretos.
Meu modelo de humorista, o
campeão absoluto dos anos 60,
homem capaz de bater recordes
de bilheteria e de venda de discos, casando histrionismo com
humor inteligente foi Zé Vasconcelos. Assim como Golias, ele era
engraçado até de olhar. Era e
ainda é um contador de causo
clássico, o sujeito que desenvolve
a piada, marca as nuances, explora as pausas, cria o suspense.
Seus dois LPs lançados nos
anos 60 bateram todos os recordes de vendagem. Quem não se
lembra do esquete do programa
de calouro conduzido por Ary
Barroso, e do negão que pede para cantar um "sambinha" -a
própria "Aquarela do Brasil"?
Ou então a história do sujeito
que teve o pneu do carro furado
e vai até a primeira casa na estrada procurar um macaco. No
caminho, vai imaginando o que
o dono da casa vai falar, desenvolve o diálogo imaginário, supõe que o sujeito vá recusar o
macaco. Quando o dono abre a
porta da casa, antes que abra a
boca recebe uma saraivada de
impropérios.
Eram situações absolutamente
banais, mas transformadas em
peças clássicas de humor pela
maneira como Zé Vasconcelos
contava. Seu sucesso foi tão amplo que ele chegou a pensar em
montar sua própria Disneylândia. Comprou terrenos enormes
na beira da via Dutra, começou
a montar seu parque, o dinheiro
acabou e ele perdeu o rumo.
Durante anos, Zé Vasconcelos
foi o padrão máximo de humorista brasileiro. O desastre financeiro acabou afetando a sua atividade. Nos anos seguintes murchou, cedendo espaço para um
trio que dominou a televisão nos
anos seguintes, Chico Anysio e
Jô, com seus múltiplos personagens, e Golias vivendo um personagem único.
Depois, Zé Vasconcelos retomou a carreira, fazendo pontas
em programas humorísticos de
televisão, assim como outros que
experimentaram momentos de
enorme apogeu, como Ivon
Cury.
Foi muito ajudado por Chico
Anysio -um "coronel" nordestino capaz de casar episódios do
mais abjeto machismo com uma
generosidade exemplar para
com os colegas humoristas.
Ainda hoje, quando consigo
encontrá-lo em algum canal, de
imediato me vêm à lembrança
as risadas irresistíveis que provocava no seu Oscar.
Para mim, sempre será o rei do
riso.
E-mail - LNassif@uol.com.br
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