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OPINIÃO ECONÔMICA
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PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Começo hoje com um episódio verídico, que me foi contado por testemunhas oculares.
Aconteceu há muito tempo. Vinicius de Moraes, Tom Jobim e um
grupo de amigos e familiares estavam em um restaurante no Leblon quando entrou Ibrahim
Sued, a grande figura do colunismo social da época. Ibrahim dirigiu-se à mesa deles e houve efusiva troca de cumprimentos e abraços. Depois que o colunista se
afastou, um dos presentes virou-se para o Vinicius e perguntou:
"Afinal, que tal o Ibrahim?". E o
Vinicius: "É uma boa pessoa, mas
não vale nada".
Essa frase resume grande parte
do panorama nacional, não é
mesmo? O Brasil está repleto de
boas pessoas que nada valem.
Lembrei-me da história a propósito da equipe econômica do governo. Não os conheço todos pessoalmente, mas tenho certeza absoluta de que são pessoas bem-comportadas, educadas, de boa
índole, que estudaram em boas
escolas, freqüentaram boas universidades etc. E, no entanto, de
posse de condições extraordinariamente favoráveis, conseguem o
milagre de produzir um crescimento econômico pífio, muito
abaixo da média mundial.
Logo antes do Carnaval, o IBGE
informou o resultado do PIB para
2005. Foi um vexame, como se sabe. O PIB, que é a medida do valor adicionado por todas as atividades econômicas, cresceu 2,3%.
O PIB por habitante, míseros
0,8%. A formação bruta de capital fixo, que inclui a construção
civil e a aquisição de máquinas e
equipamentos, apresentou expansão de apenas 1,6%.
Enquanto isso, a China e a Venezuela cresceram 10% em termos reais. A Argentina, 9%. A Índia e o Paquistão, 8%. A Rússia e
a Turquia, 7%. A África do Sul, a
Coréia do Sul e a Indonésia, 5%.
Entre os principais países emergentes, só um, o México, registrou
crescimento medíocre no ano passado, mesmo assim um pouco superior ao do Brasil. O PIB mexicano aumentou 2,7% na comparação do quarto trimestre de 2005
com o mesmo período de 2004. O
dado correspondente para o Brasil é 1,4%.
Dá para responsabilizar diretamente a equipe econômica? Creio
que sim. O potencial de crescimento da economia brasileira parece inegável. Na maioria dos setores, a capacidade de produção
está subaproveitada ou pode ser
rapidamente ampliada em resposta a estímulos de demanda.
Grande parte da força de trabalho encontra-se desempregada ou
subempregada.
Os choques de oferta foram relativamente pequenos em 2005. A
quebra de safra de alguns produtos importantes e a ocorrência de
febre aftosa em Mato Grosso do
Sul e no Paraná contribuíram para o baixo crescimento da agropecuária. Um fator não-econômico,
a crise do "mensalão", pode ter levado ao cancelamento ou adiamento de investimentos.
Mas a agropecuária pesa relativamente pouco no PIB e, além
disso, o seu fraco desempenho deve ser atribuído, em parte, à política econômica, especialmente à
valorização cambial. A crise política teve impacto limitado. Nem
chegou a provocar grandes turbulências no mercado financeiro.
Não vamos esquecer que os próprios defensores da política econômica passaram o ano inteiro
alardeando que a economia estava "blindada" contra os efeitos da
crise política, uma suposta prova
da sabedoria da "parte sadia" do
governo (a Fazenda e o Banco
Central).
A verdade é que essa "parte sadia" do governo sufocou o crescimento da economia com o tripé:
a) política fiscal apertada (superávits primários crescentes); b)
acentuada apreciação do real em
relação a moedas estrangeiras; e
c) taxas de juro escorchantes.
A política de juros foi a causa
central do pífio crescimento, não
só porque restringiu diretamente
o consumo e o investimento privados, mas também porque contribuiu para produzir a apreciação cambial e para induzir o governo a aumentar o superávit fiscal primário.
Em resumo, com políticas desnecessariamente apertadas, a
equipe econômica, especialmente
o Banco Central, retraiu a demanda agregada e gerou mais
um ano de estagnação. No final
das contas, o governo Lula não
apresentará resultados muito diferentes dos do governo FHC em
termos de crescimento econômico. Equipes econômicas semelhantes, políticas semelhantes, resultados semelhantes.
O brasileiro já tentou se livrar
desse tipo de pessoa em 2002.
Conseguirá nas eleições deste
ano?
Paulo Nogueira Batista Jr., 50, economista e professor da FGV-EAESP, escreve às quintas-feiras nesta coluna. É autor
do livro "O Brasil e a Economia Internacional: Recuperação e Defesa da Autonomia Nacional" (Campus/Elsevier, 2005).
E-mail:
pnbjr@attglobal.net
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