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LIÇÕES DA VIDA
Em best-seller recém-lançado, empresário do Pão de Açúcar conta como refez o grupo e revela face religiosa
"Vender mais é tarefa minha, não de Deus", diz Abilio
ADRIANA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
Abilio Diniz, 67, o empresário
que reconstruiu o grupo Pão de
Açúcar, reza todos os dias, vai à
missa aos domingos e é devoto de
santa Rita de Cássia. Diz que no
trabalho é centralizador, mas sabe
delegar tarefas. E bate numa mesma tecla diversas vezes: afirma
que em sua vida já foi pretensioso
demais, quando só precisava ser
determinado. "Você pode ser forte, agressivo, mas não precisa ser
arrogante como já fui. Arrogância
não tá com nada", disse, em entrevista à Folha.
Uma semana e meia após lançar
o livro "Caminhos e Escolhas - O
Equilíbrio Para Uma Vida Mais
Feliz", o empresário é o primeiro
colocado no lista dos autores mais
vendidos na Livraria Cultura e no
site Submarino. No ranking da Livraria Saraiva, está entre os cinco
mais. A sua obra vendeu 30 mil
exemplares (3.000 por dia) e entrou na segunda edição agora.
Na entrevista a seguir, ele fala do
livro e da batalha contra os irmãos
pelo controle do grupo.
Folha - Em seu livro, há um Abilio
conciliador e conselheiro. O sr. mudou e o Pão de Açúcar também?
Abilio Diniz - Não há dúvida nenhuma. O Pão de Açúcar de antes
de 90 era muito arrogante, muito
prepotente e nada humilde. Isso
porque o Pão de Açúcar teve um
sucesso extraordinário até a década de 80, o que trouxe prepotência, arrogância, um sentimento de
que éramos melhores do que os
outros. Felizmente, ao reconstruir
o grupo, minha primeira determinação foi ser humilde. Se temos
ou vamos alcançar o sucesso, tem
de ser pela humildade.
Folha - Sobre delegar tarefas, por
exemplo, ou saber ouvir o outro.
Houve mudança nisso também?
Diniz - Eu aprendi a acentuar características em mim que já eram
boas. Sempre fui uma pessoa que
soube ouvir, porém sempre tive
posições muito fortes. Ao ser convencido por outras pessoas de que
o caminho melhor era diferente
daquele que eu estava tomando,
eu sempre mudei de posição com
muita facilidade. Também sempre fui centralizador por querer
estar razoavelmente informado
de tudo. Mas sempre deleguei e
sempre cobrei o retorno. Não estou mais na função de executivo,
mas estou a par de tudo. Porém
não dou ordens, quem as dá é o
Augusto [Augusto Cruz, presidente do grupo]. Muita gente dizia que isso não ia dar certo. "Imagine o Abilio sentado na mesa ao
lado de todos, sem participar." O
fato é que deu certo.
Folha - O sr. tinha dúvidas sobre
seu próprio afastamento do grupo?
Diniz - Não tinha, pois programamos com muita antecipação.
A troca de comando foi em 1º de
março de 2003, mas os trabalhos
começaram antes -o Augusto
foi convidado em meados de
2002. Trabalhamos com ajuda de
dois psicólogos e ensaiamos muito o que ia acontecer depois.
Folha - Sem arrogância, o sr. teria
chegado aonde chegou?
Diniz - Acho que isso não tem a
ver. Você pode ser forte, agressivo, mas não precisa ser arrogante,
como eu já fui no passado. Para
você conquistar, crescer, ter vitórias, é preciso agressividade, ser
arrojado, mas nada disso tem de
vir acompanhado de arrogância.
Arrogância não tá com nada.
Folha - Foi difícil reconstruir o
Pão de Açúcar, após ter quase quebrado no início dos anos 90?
Diniz - Foi muito difícil, muito
sofrido. Os anos de 1990, 1991 e
1992 foram muito complicados [a
empresa teve de enfrentar a crise
econômica nos anos Collor e a
disputa interna na família Diniz].
Mas as realizações que vieram depois nos davam tanta satisfação
que compensavam as dificuldades que encontrávamos.
Folha - O sr. comenta em sua obra
que poderia ter quebrado com a
empresa...
Diniz - Eu não tinha nada na
época, era avalista de tudo na empresa, então o pouco que eu tinha,
se a empresa fosse embora, ia junto também. Eu tinha muito pouca
coisa material e comparativamente nem tenho muito hoje, só a
participação no grupo.
Folha - Aproveitando que o sr. tocou na questão acionária... Na época da divisão da empresa entre os
irmãos, a separação dos negócios
foi equânime. O sr., que trabalhava
muito pela empresa, se sentiu traído com essa divisão?
Diniz - Acho traição uma palavra
muito forte. Eu me conduzo de
forma um pouco diferente. Em
vez de ficar me queixando dos outros, se fizeram isso ou aquilo de
mau, eu procuro perceber se eu
fiz o que estava a meu alcance.
Nesse caso específico [disputa entre os irmãos], talvez eu tenha sido ingênuo. Mas isso vai ser mais
bem explicado na minha autobiografia, que deve sair em 2006.
Folha - Com certa freqüência o senhor se refere a Deus. Em períodos
em que a situação do grupo ficava
complicada, apelou para Ele?
Diniz - Nunca peço coisas a
Deus, só peço força, saúde e luz.
Não peço para o Pão de Açúcar
vender mais, isso é tarefa minha.
Peço para Ele me iluminar.
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