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ANÁLISE
Fundos de pensão dos EUA estão à beira do colapso
MARY WILLIAMS WALSH
DO "NEW YORK TIMES"
O governo dos EUA deu
início a uma campanha calibrada para atrair atenção aos planos de pensão corporativos, que
estariam a caminho do colapso.
Há propostas que poderiam mudar fundamentalmente esse setor
com patrimônio de US$ 1,6 trilhão, alterando a maneira pela
qual o dinheiro das aposentadorias é depositado e investido.
O controlador geral das finanças do governo colocou a Pension
Benefit Guaranty Corporation, a
agência governamental que garante as pensões, em uma lista de
operações governamentais de "alto risco". Elaine Chao, a secretária
do Trabalho, declarou que o sistema, criado décadas atrás, "está,
infelizmente, em risco".
O secretário do Tesouro John
Snow, ex-presidente de companhia ferroviária responsável por
um fundo de US$ 1,3 bilhão, advertiu recentemente que um colapso financeiro semelhante ao do
setor de poupança e empréstimos
imobiliários, em 1989, poderia estar para acontecer.
Steven Kandarian, diretor-executivo da Pension Benefit Guaranty Corporation, fez um discurso no qual previu uma possível
"transferência geral de receita".
Embora os funcionários do governo desejem sublinhar os perigos para os benefícios de aposentadoria com os quais milhões de
americanos contam, eles não desejam apavorar os consumidores,
perturbar os mercados financeiros ou irritar as empresas que já
colocam bilhões no sistema.
Mas alguns analistas, lendo as
entrelinhas, dizem acreditar que
os funcionários não estejam apenas conclamando as empresas a
investir mais em seus debilitados
fundos de pensão -uma perspectiva dolorosa quando há um
aperto de caixa-, mas também
indicando um remédio mais radical, o de encorajar os fundos a reduzir sua pesada dependência dos
mercados de ações.
Em questão estão as pensões de
benefícios definidos, aquelas sob
as quais empregadores contribuem ao longo dos anos para que
seus funcionários recebam um estipêndio mensal predeterminado,
quando se aposentarem, até a
morte. Hoje, cerca de 44 milhões
de trabalhadores do setor privado
e aposentados estão cobertos por
planos desse tipo. Três anos de
forças negativas no mercado reduziram em bilhões de dólares o
valor desses fundos, causando a
concordata de alguns fundos e
deixando os restantes cerca de
US$ 350 bilhões abaixo do montante necessário a cumprir as promessas aos trabalhadores.
Fuga do risco
Até recentemente, a idéia de que
o edifício das pensões fora erigido
sobre uma base defeituosa só era
defendida por um pequeno número de especialistas financeiros,
e era considerada heresia por
quase todos os demais. Mas, depois de alguns anos de queda nas
Bolsas, vem ganhando prestígio o
argumento de que os administradores de fundos deveriam, em lugar de recorrer às ações como
vêm fazendo nos últimos anos,
aplicar em investimentos previsíveis, nos títulos públicos, cujo
vencimento acontecerá na época
em que o dinheiro das pensões se
tornar necessário, acompanhando as idades de aposentadoria dos
trabalhadores.
Essa opinião vem ganhando terreno entre os acadêmicos e está
sendo tratada de maneira mais
considerada por líderes importantes do mundo financeiro, que
vêm incorporando parte de seu
raciocínio às propostas que apresentam sobre as pensões.
As medidas oferecidas até agora
têm pouca semelhança às propostas debatidas no começo de julho
durante uma rancorosa sessão do
Comitê de Alocações Orçamentárias da Câmara. O projeto de lei da
Câmara para as pensões é mais
generoso para as empresas. Se
aprovado, pode reduzir em dezenas de bilhões de dólares os montantes que as empresas pagariam
aos seus fundos de pensão nos
próximos três anos. As empresas
defendem a abordagem proposta
pelo projeto e esperam tornar
permanentes as mudanças.
Funcionários do Tesouro dizem
que essa abordagem colocaria em
risco os benefícios, especialmente
em empresas com trabalhadores
mais velhos, que solicitarão aposentadoria mais cedo.
"A verdade sobre o tema é que
mais dinheiro é necessário nos
planos de pensão, para garantir
que os trabalhadores mais velhos
recebam o dinheiro que merecem
depois de décadas de esforço árduo", disse Peter Fisher, subsecretário para finanças internas, em
depoimento a um subcomitê da
Câmara no começo de julho.
O alto número de concordatas
de fundos de pensão já enfraqueceu seriamente a agência federal
de seguros de aposentadoria, o
que gera temores quanto à necessidade de um resgate. A agência
ainda dispõe de fluxo de caixa suficiente para cobrir os pagamentos dos aposentados, mas por enquanto. Seu déficit cresceu para
um montante recorde, e ela não é
capaz de continuar absorvendo
planos de pensão insolventes por
período indefinido.
Sem que a maioria dos norte-americanos saiba, um pequeno
grupo de especialistas em finanças vêm já há alguns anos defendendo a posição de que os fundos
de pensão estão em risco porque
seus administradores investem
demais em ações. Esses analistas
foram vaiados durante os anos de
boom das Bolsas, na década de 90,
mas depois de três anos de baixa
seus argumentos começam a ser
levados em consideração.
Administradores de fundos de
todos os tipos investem em ações,
evidentemente, e ninguém está
questionando o uso de ações pelos fundos mútuos, fundações ou
universidades. Mas os fundos de
pensão são diferentes, de acordo
com esse raciocínio, e requerem
estratégia diferente: ações, talvez,
enquanto os trabalhadores são jovens, mas posteriormente, à medida que envelheçam, uma carteira ultraconservadora de títulos
públicos, com vencimentos cada
vez mais curtos à medida que eles
se aproximem da aposentadoria.
Esse tipo de investimento para
pensões saiu de moda nos anos 60
e hoje em dia é pouco utilizado. A
suposição dominante é que, a longo prazo, as ações ofereçam retornos superiores aos dos títulos públicos, e portanto parecem ser um
investimento mais barato.
Aposta arriscada
As implicações de uma retomada das velhas estratégias podem
ser profundas. Os fundos de pensão, com ativos de US$ 1,6 trilhão,
respondem por uma importante
parcela dos mercados de ações.
As sugestões de que as pensões estariam mais seguras caso o dinheiro fosse investido em outras
partes não foram recebidas com
agrado em Wall Street.
Na verdade, os administradores
dos fundos parecem estar optando por riscos mais altos ainda, em
lugar de reduzi-los. A composição
das carteiras não é divulgada, em
geral, de modo que as tendências
são difíceis de acompanhar. Mas
indícios isolados sugerem que os
administradores estão se voltando a operações de hedge, imobiliárias, mercados emergentes e
outros investimentos de risco, em
um esforço por recuperar suas
perdas nos mercados de ações.
Tradução de Paulo Migliacci
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