|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
MERCADO TENSO
Cálculos projetam que o endividamento público pode chegar a 60% do PIB brasileiro ao final de 2003
Nó da dívida permanece no governo Lula
Bruno Stuckert - 1º.ago.03/Folha Imagem
|
O ministro Palocci (Fazenda), que vê a alta da dívida como um entrave para o crescimento do país |
CÍNTIA CARDOSO
JOSÉ ALAN DIAS
DA REPORTAGEM LOCAL
O grande nó estrutural da economia brasileira será uma incômoda companhia no governo Lula: a relação dívida/PIB, apontada
pelo ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho, como o principal obstáculo ao crescimento, vai
aumentar. Na melhor das hipóteses, permanecerá nos níveis atuais
pelos próximos dois anos.
Cálculos feitos pela consultoria
GlobalInvest apontam que, ao final de 2003, o total da dívida pública brasileira corresponderá a
60% do PIB (Produto Interno
Bruto). A estimativa da GlobalInvest considera como variantes:
crescimento de 1,2% do PIB, taxa
média Selic de 24% (hoje ela está
em 24,5%) e uma cotação do dólar, para dezembro, de R$ 3,40.
Em 2002, o coeficiente dívida/
PIB fechou em 55,89%, após atingir, em setembro, o pico de 63,9%,
com a disparada do dólar.
""Não se conseguirá baixar essa
relação com o crescimento medíocre da economia dos últimos
anos. Os credores vêem o Brasil
como aquele sujeito que deve
muito ao banco, mas tem o salário
pequeno. Os riscos para a sustentabilidade da dívida são enormes", diz Marcelo Ávila, economista-chefe da GlobalInvest.
O economista qualifica como
excepcional o superávit primário
obtido pelo governo no primeiro
semestre. ""Pena que não dê nem
para pagar os juros." É verdade:
entre janeiro e junho, o governo
obteve superávit primário de
5,41% do PIB -equivalente a R$
40 bilhões. A meta acordada com
o FMI (Fundo Monetário Internacional) previa 4,25%.
Mas, apenas de juros, o país teve
de pagar R$ 74,3 bilhões. Ou seja,
o governo precisou desembolsar
mais R$ 34,3 bilhões (ou 4,63% do
PIB) para cobrir o rombo.
"Se o Brasil não equilibrar e não
controlar um eventual crescimento da relação entre dívida pública
e PIB, poderá enfrentar sérios
problemas em pouco tempo. Mas
é difícil prever quando isso poderá acontecer", avalia Eugenio Alemán, coordenador de estudos latino-americanos da consultoria
americana Global Insight.
Na avaliação do economista
Walter Molano, da corretora BCP
Securities, à equação do desequilíbrio da relação dívida/PIB soma-se o patamar elevado da Selic
(taxa básica de juros). "Crescimento é a maior prioridade do
Brasil. É o único meio de estabilizar a relação dívida/PIB. No entanto as astronômicas taxas de juros são o maior obstáculo para o
crescimento", declarou Molano.
"O Banco Central precisa ceifar
as taxas de juros agora, antes que
seja tarde demais", avalia.
Juros altos, além de segurar a
atividade econômica, também resultam em expansão da dívida,
uma vez que metade do endividamento do governo é atrelada à Selic. Ávila, da GlobalInvest, calcula
que a diminuição em um ponto
percentual da Selic representaria
economia de US$ 4 bilhões ao
longo de 12 meses no pagamento
de juros.
O banco Lloyds TSB apresenta
três cenários para o comportamento da relação dívida/PIB. No
panorama mais pessimista, com
um crescimento do PIB de 1%
neste ano, o coeficiente fecharia o
ano em 57,6%. Mantidas as mesmas variantes em 2004, o percentual saltaria para 60,6%.
No segundo cenário, tido como
neutro e mais provável sob a ótica
do banco, o PIB cresceria 1,5%
neste ano e 2,5% em 2004. Diante
disso, a relação dívida/PIB ficaria
em 56,1% e 56,2%, respectivamente. "Não antevemos um crescimento abrupto da relação dívida/PIB. Ela deve ficar estável e
apresentar tendência de queda a
partir de 2005", afirma Odair
Abate, do Lloyds TSB.
Abate argumenta que o cenário
""ameno" delineado pelo banco
está subordinado à capacidade do
governo de aprovar as reformas
tributária e previdenciária.
Isso porque um desfecho considerado adequado pelo mercado
poderia impulsionar o aumento
de fluxos de capitais ao Brasil.
Maior entrada de recursos ajudaria a estabilizar a cotação do dólar
e a diminuir o risco de pressões
inflacionárias provocadas pelo
efeito do câmbio sobre os preços.
Em julho do ano passado, o então diretor de Política Econômica
do Banco Central, Ilan Goldfajn,
preparou um estudo sobre a sustentabilidade da dívida pública
brasileira. O documento se tornaria o principal instrumento brasileiro para negociar um acordo de
US$ 30 bilhões com o FMI. O estudo de Goldfajn projetava um
crescimento "modesto" de 3,5%
do PIB e a manutenção do superávit primário em 3,75%.
A estimativa do ex-diretor, a
partir dessa base, era que a dívida
fechasse 2003 em 58,3% do PIB.
Depois da crise cambial e do crescimento mirrado da economia
em 2002 -1,5%-, o novo governo se viu obrigado a aumentar em
dois pontos percentuais a poupança para pagamento de juros.
Mesmo assim, corre o risco de fechar este ano com o coeficiente de
dívida maior do que no ano passado. Em junho de 2003 a relação
dívida/PIB ficou em 55,2%.
"O superávit aumentou ao mesmo tempo em que o pagamento
dos juros cresceu. A dívida em valores nominais continua em alta e,
em termos percentuais sobre o
PIB, também. É algo que precisa
ser controlado", diz Alemán, da
Global Insight.
Texto Anterior: Frase Próximo Texto: Ex-presidente do BC vê "fim da lua-de-mel" Índice
|