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Ibrahim Eris diz que atual gestão do Banco Central exagerou na alta dos juros e levou indústria à recessão
Ex-presidente do BC vê "fim da lua-de-mel"
GUILHERME BARROS
EDITOR DO PAINEL S.A.
O ex-presidente do Banco Central Ibrahim Eris, 58, presidente
da Eris Consultores, acha que a
lua-de-mel do mercado com o governo Lula acabou -de forma
abrupta e mais rápida do que se
imaginava. Para ele, as contradições do governo estão vindo à tona. "Essas vacilações e contradições dão a idéia de que o governo
Lula não é o mesmo do Banco
Central e do Ministério da Fazenda", afirma Eris.
Crítico desde o início da política
do Banco Central de Henrique
Meirelles, Eris não isenta totalmente o BC da atual turbulência
que o país atravessa. O Banco
Central, segundo ele, cometeu
muitos erros. "A calibragem dos
juros foi errada e levou a indústria
à recessão", diz ele. A não-intervenção no câmbio foi outro erro,
na opinião de Eris. "O câmbio é
importante demais para ser tratado como se fosse banana."
A seguir, trechos da entrevista.
Folha - A que fator o sr. atribui a
alta do dólar dos últimos dias?
Ibrahim Eris - No início do ano,
os mercados reagiram de forma
extremamente positiva às surpreendentes políticas monetária e
fiscal do governo, à forte retórica
de respeito aos contratos e ao aparente compromisso com a execução rápida das reformas.
O resultado foi o que vimos ao
longo do primeiro semestre: queda do índice de inflação, do risco
Brasil e do dólar. O câmbio chegou a R$ 2,80, um nível que somente seria sustentável se o país
vivesse eternamente com as absurdas taxas de juros do primeiro
semestre e no quadro recessivo
que decorre dessas taxas.
Infelizmente, ao longo dos meses, os mercados começaram a
descobrir que o purismo ortodoxo do Banco Central e do Ministério da Fazenda constituía somente uma das faces deste governo. A
retórica de manutenção de contratos encontrou seus limites nas
atitudes do Miro Teixeira [ministro das Comunicações], que, aparentemente, em certos momentos, teve apoio do presidente da
República.
As reformas se revelaram a cada
dia mais pífias, com sérias dificuldades de chegar a um entendimento com o Congresso para garantir a votação mesmo dessas
versões diluídas.
Simultaneamente, a cada dia está ficando mais clara a falta de capacidade deste governo de apresentar um programa social com
objetivos claros e que seja factível.
O governo também se mostra
sem capacidade de reagir aos atos
de duvidosa legalidade de movimentos como o MST. Essas vacilações e contradições dão a idéia
de que o governo Lula não é o
mesmo do Banco Central e do Ministério da Fazenda, mas algo diferente. O mercado parece estar
no escuro tentando tatear o bicho
para entender qual é o contorno
desse elefante. A subida do dólar
dos últimos dias tem de ser analisada com esse pano de fundo. As
contradições estão vindo à tona.
A lua-de-mel com o governo acabou e de uma maneira abrupta.
Folha - O sr. acha preocupante essa subida do dólar?
Eris - Esse movimento de subida
do dólar é saudável. O país precisa
de uma moeda mais desvalorizada. O problema é que, infelizmente, teremos de enfrentar mais uma
vez a volta da volatilidade do câmbio. Não compreendo como o
Banco Central assistiu à chegada
do dólar a R$ 2,80 sem fazer nada.
Desde o início, o BC adotou uma
política equivocada.
Folha - Quais foram os erros do
Banco Central?
Eris - Para começar, foi totalmente desnecessária a alta dos juros. Hoje não há como justificar
que um país com a atual inflação
mantenha uma taxa real de juros
de 16% a 17% ao ano. É incompreensível para mim discutir se os
juros devem cair um ponto percentual ou 1,5 ponto percentual. A
discussão deve ser se os juros
caem quatro, seis ou oito pontos
percentuais.
A calibragem dos juros foi errada e levou a indústria à recessão.
A economia só não entrou em recessão totalmente graças ao desempenho da agricultura. O equívoco na calibragem do juro foi tão
grande que a previsão da inflação
para o ano que vem ficou abaixo
do centro da meta.
O segundo grande erro do Banco Central foi a visão que ele tem
sobre câmbio flutuante. Política
de câmbio flutuante não significa
que o BC não possa intervir no
câmbio. Em nenhum país do
mundo é assim. O BC pode, sim,
intervir para neutralizar as distorções existentes na economia. O
câmbio é um preço importante
demais para ser tratado como banana. Você pode dizer que não
precisa intervir no mercado de
bananas, mas não no câmbio.
Folha - Qual a razão dos erros?
Eris - Não importa a razão, desde
que se corrija o erro. O fato é que o
BC avaliou erroneamente os rumos da economia e demorou para
baixar os juros. Ou melhor, está
demorando para baixar os juros.
Eu queria saber qual é o modelo
econométrico que indica que os
juros devem ser de 24,5%. O Banco Central não pode ser um computador que roda um modelo e
cospe um número. Não é para isso que existem diretores. Senão,
teríamos um computador em vez
de uma diretoria no BC.
Folha - Essas atitudes do BC foram responsáveis por essa nova
turbulência na economia?
Eris - O Banco Central pode ser
responsabilizado por não eliminar a volatilidade do câmbio, mas
o que está provocando essa nova
turbulência é a mudança efetiva
do quadro econômico e a percepção do mercado das indefinições
do governo. O mercado está descobrindo que o governo pode ser
um outro bicho, diferente do que
aparentava nos primeiros seis
meses. As contradições do governo estão vindo à tona.
Qual é o verdadeiro Lula? É o
Lula de antigamente, que aparece
com o boné do MST, ou o Lula
novo de Meirelles?
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