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ANO DO DRAGÃO
Empresas pressionam por aumento de preço, enquanto trabalhadores já falam em reajuste salarial automático
Inflação pode reviver indexação e gatilho
FÁTIMA FERNANDES
DA REPORTAGEM LOCAL
A pressão das empresas e dos
trabalhadores por aumentos de
preços e de salários traz à tona
dois temas que foram enterrados
no governo Fernando Henrique
Cardoso: a indexação de preços e
o gatilho salarial.
Entre os empresários há o medo
generalizado em pronunciar essas
duas palavras, já que ninguém
tem saudade da ciranda inflacionária que o país vivia no final dos
anos 80 e início dos anos 90.
Mas o fato é que a inflação anual
na casa dos dois dígitos leva patrões e empregados a pensar -e
também a ressuscitar- formas
de se defender da alta dos preços.
Há três meses o IGP-M e o IGP-DI, que refletem em parte os preços no atacado, superam 10% no
período de 12 meses. Em outubro,
o IGP-M bateu em 16,34%. Em setembro, o IGP-DI atingiu 14,28%.
As construtoras, por exemplo,
já querem flexibilizar reajustes no
caso de contratos inferiores a um
ano -isto é, assim que os preços
do cimento e do tijolo sobem, elas
aumentam o custo da obra do
cliente na mesma proporção.
Reajuste automático
Os trabalhadores, por sua vez,
começam a levar para a mesa de
negociação salarial a reposição
automática da inflação: o gatilho.
O Sindicato dos Metalúrgicos de
São José dos Campos e Região
quer, por exemplo, 3% de reajuste
toda vez que a inflação atingir esse
mesmo percentual. A FUP (Federação Única dos Petroleiros) pede
2% na pauta de reivindicações. As
negociações entre eles e os patrões estão em andamento.
Desde que o dólar começou a
subir, em junho, as indústrias informam que os custos também
estão mais altos, já que parte das
matérias-primas é importada
-as empresas têm de desembolsar mais reais na hora de pagar
pelo insumo estrangeiro.
Por um ou dois meses, informam, deu para segurar os aumentos (ou parte deles) porque
havia a expectativa de queda do
dólar. Mas como a cotação da
moeda americana continua em
alta, a pressão para repassar aumento de custo para os preços está cada vez maior. Esse cenário
alimenta a expectativa de alta da
inflação e, como consequência, da
indexação e do gatilho salarial.
"Se existe demanda para reindexação é porque existe expectativa de inflação crescente. O mercado tem de resistir para que isso
não aconteça. Mas, se caminhar
para isso, está destruída a estabilidade do país construída pelo Plano Real", diz Juarez Rizzieri, pesquisador da Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas).
Sensação de disparada
A Fipe prevê inflação de 5,5% a
6% para este ano. Especialistas em
preços consideram que, se essa taxa ultrapassar 10% e persistir, já
não tem mais como segurar a indexação e o gatilho salarial. Dizem também que existe no ar a
sensação de que os preços podem
disparar porque o governo petista
seria mais tolerante com a inflação do que foi o governo tucano.
"A pressão para aumentos de
preços é muito forte. Há casos de
empresas que precisam fazer reajustes de até 50%", diz Fábio Mestriner, presidente da Abre (Associação Brasileira de Embalagem).
Com exceção do vidro, as principais matérias-primas usadas pelo
setor -como papel, papelão, aço,
alumínio e resinas plásticas-
têm cotação internacional.
De janeiro a setembro, os custos
da indústria eletroeletrônica subiram 36%, segundo levantamento
da Eletros (associação dos fabricantes). As empresas conseguiram repassar para os preços entre
8% e 10%. Esperam, neste final de
ano, repassar o restante, já que o
consumo estará mais aquecido e o
consumidor terá mais dinheiro
no bolso por causa do pagamento
da primeira parcela do 13º salário,
até dia 30 deste mês.
A indústria de brinquedos vai
tentar reajustar em cerca de 18%
os preços dos produtos como
consequência do aumento de custos com insumos e mão-de-obra.
"A indústria e os fornecedores de
matérias-primas estão em pé de
guerra", afirma Synésio Batista da
Costa, presidente da Abrinq.
Novidade para disfarçar
O lançamento de novos produtos é a maneira que os fabricantes
encontraram para repassar aumentos sem ouvir tantas reclamações dos lojistas. Cerca de 800
brinquedos já foram lançados para o Dia das Crianças e mais 400
estarão nas lojas até o Natal.
Os empresários ouvidos pela
Folha informam que o fraco consumo segura parte dos aumentos.
"Só que há um limite, até para não
abalar a sobrevivência das empresas", diz Roberto Faldini, diretor
da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). Ele
diz que os aumentos efetuados
pelas indústrias devem ficar entre
5% e 10%, dependendo do setor.
O movimento de aumento de
preços também foi detectado pelo
Ibre (Instituto Brasileiro de Economia) da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Das 1.225 indústrias
ouvidas em outubro, 45% informaram que pretendem aumentar
preços neste final de ano. Em
igual período de 2001, época em
que o dólar também estava em alta, esse percentual era de 35%.
"As indústrias estão com expectativa de aumento de preços e a
indexação vem quase naturalmente quando a inflação persiste
por mais tempo. Mas as empresas
acreditam na inversão dessa tendência", afirma Salomão Quadros, coordenador de análises
econômicas do Ibre.
O país já viveu fenômeno parecido em 1999, na desvalorização
do real. "Só que, agora, está durando mais tempo, também devido à eleição. Haverá repasse de
custos aos preços, não há como
evitar isso. Mas não creio que seja
um movimento permanente."
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