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LUÍS NASSIF
Os incríveis Índios Tabajaras
Em 1962 o duo Índios Tabajaras vendeu 1,5 milhão de
cópias de sua gravação do clássico mexicano "Maria Elena".
Ficaram 14 semanas no topo
da lista dos discos mais vendidos no país, outras 17 semanas
na Inglaterra. O LP seguinte
também ficou entre os dez
mais vendidos nos Estados
Unidos. Ao todo, gravaram 48
LPs, muitos dos quais disponíveis no site www.amazon.com.
Ambos são brasileiros, cearenses, nascidos em 1918 na
Serra da Ibiapaba, no município de Tianguá, ao que consta
membros de uma tribo Tabajara. Eles teriam nascido Muçaperê e Herundy, nomes que significam respectivamente "terceiro" e "quarto" de uma fileira de 34 filhos do cacique Ubajara. Teriam saído com a família em 1933, levados para a Serra do Cariri pelo tenente Hildebrando Moreira Lima, segundo o site www.nelsons.com.br,
que tem a história mais detalhada da dupla.
Dali até 1936 foram três anos
de caminhada até chegar ao
Rio de Janeiro. A longa caminhada teria sido feita por 16 índios -os pais e 14 filhos. No
transcorrer dela, teriam conhecido violeiros e cantadores.
Atravessaram Pernambuco,
Alagoas e Bahia. No meio do
caminho, em uma feira do
Nordeste, compraram uma velha viola e passaram a dedilhar
sozinhos o instrumento. Mais
tarde, trocaram a viola por
uma cuia de feijão. Em Salvador (BA) teriam conseguido a
proteção do governador, que
lhes forneceu passagens para o
Rio de Janeiro, onde chegaram
no início de 1937, quase quatro
anos depois.
No Rio, foram registrados como Antenor e Natalício Moreira Lima, sobrenomes do tenente protetor. Em 1945 se apresentaram pela primeira vez como Índios Tabajaras na rádio
Cruzeiro do Sul e foram imediatamente contratados.
Aí começou a vida artística.
Primeiro correram o Brasil.
Em 1957 começaram carreira
internacional pela Argentina,
Venezuela e México. Passaram
a aprimorar a técnica, a estudar teoria com professores diferentes. Natalício se especializou no solo e Antenor trabalhou a harmonia. Incluíram
em seu repertório peças para
violão de Bach, Falla, Albeniz e
Villa-Lobos.
Finalmente seguiram para os
Estados Unidos, com a imagem
de índios sendo bem explorada
pela RCA. Apresentavam-se de
smoking para interpretar músicas eruditas, e de índios para
tocar música popular.
Em 1960 retornaram ao Brasil, aqui ficaram por mais três
anos para depois seguirem novamente para os Estados Unidos, onde estouraram pouco
depois com "Maria Elena".
Deve existir muita lenda nessa história. O fato é que, ao longo dos anos, os Índios Tabajaras foram sendo esquecidos no
universo musical brasileiro, especialmente na confraria do
violão, e mais lembrados pelo
seu lado folclórico. Contribuiu,
em muito, o estilo estandardizado da dupla, tipo "violão-feito-para-dançar", em vigor na
época, e também o repertório,
fortemente calcado na música
mexicana.
Folclore e estandardização à
parte, uma pesquisa nesses sites oferece um quadro surpreendente da dupla. Em todas
as faixas, mesmo nas mais óbvias, há uma técnica refinada,
um estilo de tocar vigoroso,
próprio da escola de João Pernambuco e Dilermando Reis
-com todo respeito pelo mestre, aliás, diria que Natalício
superou Dilermando.
Em algumas faixas especiais,
percebe-se o fenômeno que foram, intérpretes de um patamar superior, ombreando-se
com os maiores violonistas
brasileiros de todos os tempos.
Suas interpretações de "Valsa Criola", do venezuelano Antonio Lauro, e de "Valsa em Dó
Sustenido Menor", de Chopin,
mereciam ser ouvidas por todos os jovens violonistas cultivadores da rapidez suja. "Moonlight Serenade" fica à altura
das melhores interpretações do
grande Oscar Aleman, que se
especializou nela.
Deixaram seguidores de peso. O guitarrista Carlos Santana os menciona como sua lembrança musical mais antiga. O
violonista Chet Atkins, falecido
em 2001, era fã da dupla e gravou um álbum com eles e com
o pianista Floyd Cramer, em
Nashville (EUA).
Pela última informação que
tive, ambos estão vivos e gozando de boa saúde. Merecem
ser devidamente entronizados
no universo dos maiores violonistas brasileiros de todos os
tempos.
E-mail - Luisnassif@uol.com.br
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