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EM TRANSE
Em estudo de 2001, banco alertava que fim de incentivo fiscal levaria empresas a fazerem mais dívidas de curto prazo
BNDES avisou governo sobre crise do dólar
ADRIANA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
O próprio governo -na verdade o BNDES- alertou o governo
de que havia grande risco de as
empresas brasileiras passarem
por dificuldades devido a uma seca de dólares -e nada foi feito.
Em estudo elaborado no segundo semestre do ano passado, assinado por técnicos do BNDES,
banco de fomento do governo federal, é recomendada -com certa urgência- a "utilização de instrumentos fiscais como forma de
alongar o prazo de endividamento médio privado" e evitar "riscos
consideráveis ao setor, caso o
mercado externo sofra forte e
inesperada deterioração".
No terreno fiscal, nada mudou.
Esse alongamento nos prazos daria um espaço para as empresas
"respirarem". E num eventual cenário de crise, reforça o banco,
afastaria a possibilidade "de redução nos investimentos do setor
privado no Brasil", informa o
alerta, de junho de 2001.
Cronograma infeliz
Desde o início de 2000, as companhias brasileiras começaram a
reduzir o prazo de vencimento de
seus débitos no exterior.
Em vez de tomarem empréstimos com prazo de 8 ou 10 anos,
passaram a fechar contratos para
pagamento na metade desse prazo. Isso ocorreu em parte porque
o governo decidiu, no final de
1999, acabar com um incentivo
fiscal que estimulava o alongamento dos prazos para emissão
de papéis lá fora.
Resultado: com a mudança nos
prazos, muitas dívidas em dólares
acabaram vencendo agora, num
momento em que a moeda sumiu
do mercado, as linhas dos bancos
para refinanciamento estão fechadas e muitas empresas nem
sequer têm caixa disponível para
arcar com os débitos.
De agosto a dezembro, vencem
cerca de US$ 6,4 bilhões em dívidas externa de empresas e bancos,
segundo levantamento da Folha.
Só neste mês são US$ 2 bilhões
(30% do total).
O estudo informa ainda que "há
clara concentração de vencimentos (...) suscitando riscos consideráveis, caso o mercado externo
sofra forte e inesperada deterioração, principalmente porque as
emissões do setor privado têm se
concentrado no intervalo de um a
três anos de vencimento".
A "inesperada deterioração" no
mercado interno aconteceu. O
dólar disparou e ultrapassou a casa dos R$ 3 na última semana. O
risco-país subiu 2,8% na semana
passada. O Banco Central tem
tentado controlar o mercado com
rações diárias de dólares.
"Está tudo parado. Ninguém faz
nada", diz Márcio Pepino, diretor
do Banco Finantia. "As companhias endividadas até estão tentando renegociar agora para alongar seus prazos. Mas é uma briga
inglória. Os credores não querem
saber de esperar", diz Cláudia
Hausner, diretora da área internacional do banco Banif Primus.
Esse incentivo às companhias, a
que o BNDES se refere, durou
anos. Para emissões no exterior
feitas até o final de 99, e com prazo
de oito anos, o governo liberou as
companhias do pagamento de
Imposto de Renda de 15% sobre o
cupom de juros. A decisão foi tomada em 94. Com isso, elas fizeram dívidas com prazos longos e
se enforcaram menos.
Em janeiro de 2000, a lei 9.950
determinou o fim dessa isenção.
Com a cobrança dos 15% sobre os
juros do cupom da dívida feita, as
empresas passaram a pagar uma
taxa que, na prática, ultrapassava
os 17%, pelas contas do BNDES.
Com isso, só ouve uma saída:
mesmo as empresas que precisavam de capital a longo prazo passaram a fechar financiamentos
mais curtos, sujeitos a menores
taxas de juros, e, logo, com uma
carga fiscal menor.
Há uma lista de grupos que adotaram tal atitude. A Hering captou recursos em julho de 2001,
com vencimento de um ano. Assim como a Eletropaulo (captou
US$ 120 milhões) e a Gerdau (US$
140 milhões).
O período é muito curto, mas as
empresas pagam menos juros e
menos impostos em financiamentos relâmpagos como esses.
Segundo analistas, caso tivessem
a opção da isenção, elas poderiam
ter jogado a data de vencimento
para até oito anos.
Segundo a Receita Federal, foi
necessário rever a isenção devido
a perda que o estímulo às empresas causava aos cofres públicos.
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