|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Eleição faz escala no Qatar, com guerra de patentes
DO ENVIADO ESPECIAL A GENEBRA
A campanha eleitoral de 2002
faz uma escala em Doha nesta semana: o ministro da Saúde, José
Serra, será um dos quatro ministros brasileiros que comparecerão
à reunião da OMC, preocupado
menos com comércio e mais com
a guerra de patentes em que está
envolvido há algum tempo com
os Estados Unidos.
Mais: Serra fez um esforço para
levar outros ministros da Saúde
de países em desenvolvimento ao
Qatar (obteve no mínimo a adesão do colega venezuelano).
O troféu buscado pelo ministro
brasileiro é uma declaração que
diga: "Nada no acordo Trips pode
evitar que os membros (da OMC)
tomem medidas para proteger a
saúde pública".
Trips é a sigla em inglês para Direitos de Propriedade Intelectual
relacionados ao Comércio.
Para simplificar, é o que protege, por exemplo, as patentes para
remédios.
Serra quer ter a liberdade para
comprar remédios em países que
não respeitam patentes ou autorizar firmas brasileiras a fabricar remédios patenteados por multinacionais estrangeiras (licenciamento compulsório), em caso de
crise na saúde pública, como se dá
com a Aids.
Os Estados Unidos se opõem.
Propõem um fraseado que afirma
a plena validade do acordo de
Trips e lembram que ele tem suficiente flexibilidade para "enfrentar crises de saúde pública como a
da Aids e outras pandemias".
Disputa pelo título
As duas propostas de texto figuram no esboço de uma declaração
à margem do documento final de
Doha. A guerra é tão acirrada que
não houve acordo prévio nem
mesmo em torno do título do documento.
O Brasil, com o apoio de 51 países em desenvolvimento, queria
"Trips e Saúde Pública". Os Estados Unidos, com o respaldo da
Suíça, preferem "Trips e acesso a
medicamentos".
A batalha das patentes será, certamente, a mais vistosa em Doha,
até porque é eminentemente política. "Não tem ganhos comerciais", reconhece o embaixador
brasileiro em Genebra, Celso
Amorim.
Vida ou lucro
Tem, sim, um enorme apelo, na
medida em que se trata de "escolher entre a vida e o lucro", título
de entrevista com Amorim que o
jornal francês "Libération" publicou segunda-feira.
O embaixador diz que o título é
um exagero, mas afirma: "O ideal
é não ter que escolher entre a vida
e o lucro. Mas, em certos momentos, é preciso escolher".
O governo norte-americano
acha que essa é uma falsa dicotomia. Na quinta-feira, em conversa
com jornalistas com o compromisso de não-divulgação do nome, um alto funcionário do USTr
disse que "a proteção à propriedade intelectual, tal como prevista
na OMC, pode ser respeitada, e os
países podem ainda assim responder eficazmente à emergências em saúde pública".
Para ele, trata-se apenas de deixar claro para o público que uma
coisa não é incompatível com a
outra.
ONGs e "New York Times"
De todo modo, a causa brasileira tem inequívoco respaldo das
ONGs (Organizações Não-Governamentais) da área. E ganhou o
apoio, na quarta-feira, do jornal
norte-americano "The New York
Times", que, em editorial, copiou
a tese de Celso Amorim sobre a
escolha entre vida e lucro.
O editorial lembra a ofensiva do
próprio governo norte-americano para reduzir o preço do Cipro,
o antibiótico que combate o antraz, e acrescentou: "Para milhões
de doentes de Aids, as patentes
que mantêm altos os preços dos
remédios são uma grande razão
para que o tratamento fique fora
do alcance. O antraz matou um
punhado de americanos até agora. A Aids matou 22 milhões no
mundo todo".
(CR)
Texto Anterior: Batalha de Doha: Reunião da OMC tenta reativar comércio Próximo Texto: Uma sede sob rumores até o penúltimo momento Índice
|