São Paulo, domingo, 06 de julho de 2008 |
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Contra "agflação", G8 quer mais estoques
Cúpula dos países ricos vai propor a criação de método de estocagem de grãos para tentar a estabilização de preços
CLÓVIS ROSSI ENVIADO ESPECIAL A TÓQUIO Se não há acordo no G8 para uma atuação ambiciosa em relação a um problema de médio prazo, como é a mudança climática, menos ainda se pode esperar algo forte em um tema muito mais urgente -o da disparada dos preços do petróleo e dos alimentos. Até agora, o passo mais eficaz que os negociadores decidiram levar à consideração dos líderes diz respeito à criação de um mecanismo de estocagem de grãos para tentar estabilizar os preços quando necessário. Seria, de acordo com o jornal "Asahi Shimbun", um modelo similar ao da Agência Internacional de Energia, pelo qual se faz um estoque de petróleo como "colchão" para crises energéticas. No momento, apenas Japão e Alemanha, entre os países do G8, têm sobra de grãos em estoque, certamente porque foram vítimas da fome na esteira da derrota na Segunda Guerra Mundial (1939/45). Se os líderes concordarem com a proposta de seus técnicos, o G8 criará um grupo de especialistas que discutirá detalhes do plano, incluindo cotas para cada nação participante, um sistema de gerenciamento dos inventários e os canais pelos quais os grãos seriam liberados para o mercado. Funcionará? É discutível, embora de fato haja uma significativa redução dos estoques. A FAO (braço da ONU para agricultura e alimentação) calcula que os estoques de cereais estejam no menor nível em 30 anos. Mas os especialistas dizem que a redução dos estoques é apenas um entre os muitos motivos que levaram à chamada "agflação", a disparada de preços dos alimentos, que, pelas contas do Banco Mundial, levará 100 milhões de pessoas à fome neste ano. O principal fator parece ser o crescimento do consumo em países emergentes de grande porte, casos da China e da Índia, sem que a produção tivesse acompanhado a demanda. Dizer é fácil, fazer é difícil A resposta óbvia seria aumentar a produção, tese que o presidente Lula defende uma e outra vez. Mas é igualmente óbvio que demora para que a produção passe a acompanhar o crescimento do consumo e não há nada que o G8 possa fazer para acelerar o ritmo. Outro fator relevante -e polêmico- é a especulação com alimentos nos mercados futuros. Mas enfrentá-los é tema tabu no G8 e na maior parte do mundo. Tanto que o documento final da cúpula de Hokkaido se limitará, pelo menos de acordo com o esboço vazado para a mídia japonesa, a expressar "preocupação" com o excessivo influxo de fundos especulativos nos mercados de alimentação. E ainda acrescentará que "os mercados devem ser abertos e eficientes", linguagem cifrada para garantir que os governos não vão interferir com o livre funcionamento dos mercados. Reforça Tomohiko Taniguchi, subsecretário de Imprensa do Ministério japonês de Relações Exteriores: "Que os governos devem influir nos mercados é fácil de dizer e difícil de fazer". O mesmo raciocínio será aplicado à disparada de preços do petróleo. O G8 dirá o óbvio (que há "grande preocupação", ainda mais que os preços elevados exercem pressão inflacionária em toda a cadeia econômica). Mas não há indício de que a "grande preocupação" se transformará em ações intervencionistas. Produção e consumo A resposta do G8 é a óbvia e antiga teoria da oferta e demanda: pedirá aos países produtores que elevem a produção e, aos consumidores, que reduzam o consumo e que usem fontes alternativas de energia. É aqui que entra o Brasil: "fontes alternativas" é uma expressão que engloba, entre outros, os biocombustíveis. Um deles, o álcool derivado da cana-de-açúcar é uma especialidade brasileira, que, no entanto, enfrenta um problema de imagem por estar sendo misturado no mesmo saco do etanol de milho dos EUA -e este, de fato, reduziu a oferta de milho para alimentação, com a conseqüente alta dos preços. O G8, como em outros temas, fica numa declaração genérica. Dirá que o uso de biocombustíveis derivados de grãos deve ter um enfoque equilibrado entre a produção [para combustível] e a segurança alimentar, se estiver correto o esboço que vazou para a mídia local. Está muito longe do aval amplo que o presidente Lula vem buscando nos foros internacionais de que participa. Texto Anterior: Mercado volátil é desafio para estocagem maior Próximo Texto: Japão quer que Bush fixe metas para gases Índice |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |