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ANÁLISE
Surpreendido, Mercosul teve que sair ao ataque
DO ENVIADO ESPECIAL A PUEBLA
Na interpretação da
delegação canadense, um
dos motivos para o impasse em
Puebla foi o fato de que o Mercosul teria sido surpreendido pela
proposta do G14, o grupo liderado pelos Estados Unidos e do qual
faz parte o Canadá. Uma proposta
com um nível de ambição muito
baixo em todas as áreas de negociação, até no que é essencial em
zonas de livre comércio, a redução das tarifas de importação.
A surpresa viria do fato de que,
até obter, em Miami, uma configuração "light" da Alca, o Mercosul jogava na defensiva. Queria
evitar abrir seu mercado em investimentos, compras governamentais e serviços, as chamadas
áreas novas do comércio (em
contraposição ao comércio de
bens, agrícolas e não-agrícolas).
Com a nova configuração, todas
as áreas novas ficaram para acordos plurilaterais não obrigatórios.
Foi a vez de o Mercosul sair da
defesa ao ataque, ao apresentar
uma proposta que, na descrição
de Martín Redrado, negociador-chefe e vice-chanceler argentino,
transformaria as Américas em
uma "zona livre de tarifas de importação em 15 anos".
Mas países que, antes, eram liberalizantes (EUA, Canadá, México e Chile), passaram a jogar na
retranca e vetaram a proposta,
alegando que, se não havia ambição nas outras áreas, não cabia
ambição em acesso a mercados
(jargão para reduzir tarifas de importação).
"Não se faz uma área de livre comércio sem real abertura comercial", reclamou, na entrevista coletiva de encerramento, o chefe da
delegação brasileira, o embaixador Luiz Filipe de Macedo Soares.
Frases parecidas foram ouvidas,
em reuniões anteriores, da boca
de negociadores norte-americanos, canadenses, mexicanos.
É claro que o Itamaraty nega
que tenha sido surpreendido pela
desambição dos parceiros. "Não é
verdade. A base do documento
deles já estava pronta em Miami",
diz Antônio Simões, com a experiência de seis anos de negociações só na Alca. Talvez tenha razão. Mas o fato é que o Brasil e os
seus parceiros do Mercosul ficaram com pouca margem de manobra para a barganha comum a
qualquer negociação comercial,
que os diplomatas preferem chamar de "trade off".
Para abrir mais seus mercados
em bens agrícolas e não-agrícolas,
o G14 exigia uma contrapartida
em serviços e investimentos,
principalmente. Para o Mercosul,
era impossível ceder justamente
nas áreas em que mais havia lutado para excluir do conjunto comum e obrigatório decidido na
Ministerial de Miami.
Agora, o jogo recomeça já na
sexta-feira, quando a Coalizão
Empresarial Brasileira se reúne na
Fiesp. Será a primeira oportunidade de tentar unificar o discurso
do empresariado, francamente
divergente em Puebla.
A agricultura gritou contra a desambição do Itamaraty em serviços, investimentos e compras governamentais, achando que poderiam fornecer o "trade off" pedido pelo G14. Mas o setor de serviços estava satisfeitíssimo, ao
passo que a indústria se dividia
conforme o grau de competitividade de seu produto.
Se sair do empresariado um discurso único, ainda será preciso
unificar as posições no próprio
governo, entre Itamaraty, Agricultura e Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Aí
pode haver mudanças na posição
brasileira porque "o limite nas negociações é sempre um trabalho
em andamento", como a Folha
ouviu no Itamaraty.
(CR)
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