|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
COMÉRCIO EXTERIOR
Reunião de Puebla termina em impasse e deve ser retomada em março para tentar acordo mínimo
EUA já não cravam início da Alca para 2005
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A PUEBLA
Os Estados Unidos já não cravam a data de 2005 como prazo
para a conclusão das negociações
da Área de Livre Comércio das
Américas, como previsto no calendário original.
Na entrevista coletiva de encerramento da malograda reunião
do CNC (Comitê de Negociações
Comerciais), Peter Allgeier, com a
dupla autoridade de co-presidente do processo negociador pelos
EUA e de segundo homem do comércio exterior norte-americano,
disse que preferia reter seu julgamento sobre a viabilidade de 2005
até ver o conteúdo do conjunto
comum e obrigatório de direitos e
obrigações a ser construído pelos
34 países da Alca.
Fixar esse conteúdo era o objetivo central da 17ª reunião do CNC,
realizada na cidade mexicana de
Puebla. Mas a reunião terminou
em absoluto impasse, embora
Allgeier tenha preferido dizer que
não se tratava de "um fracasso,
mas de um breve recesso".
Os negociadores decidiram, de
fato, chamar de recesso a interrupção da reunião, que será retomada na "primeira parte de março", segundo Allgeier, sempre em
Puebla. Será de novo a edição 17,
para que não se possa dizer que
houve fracasso neste encontro.
A declaração conjunta dos dois
co-presidentes (o outro é o brasileiro Adhemar Bahadian) explica
o recesso por dois problemas:
1 - "O panorama é inteiramente
novo". De fato, na Conferência
Ministerial de Miami, em novembro, deu-se uma forte guinada nas
negociações, dividindo-as em
dois blocos.
O primeiro seria o conjunto comum e obrigatório para todos. O
segundo serão acordos plurilaterais, mais ambiciosos, mas não
obrigatórios.
A interpretação da delegação
brasileira é a de que não houve
tempo suficiente para que os 34
países absorvessem o que Allgeier
chamou de "recalibração do contexto" das negociações.
2 - Essa interpretação está recolhida no documento final, que diz
que "a tarefa revelou-se muito
complexa". Por isso, "as delegações precisam de mais tempo",
para "realizar consultas em nossas capitais e entre as delegações".
A pergunta que não obteve resposta é óbvia: o que permite esperar que, em três semanas, seja
possível superar impasses que já
duram meses, talvez anos?
O ponto central da discórdia
(agricultura) é o que vem minando todas as negociações comerciais recentes, no âmbito global
(Organização Mundial do Comércio) e no âmbito regional, como é o caso da Alca, ou das negociações entre o Mercosul e a
União Européia.
Proposta
O Mercosul veio com uma proposta ambiciosa, que previa, entre
outros pontos, eliminar os subsídios às exportações e contrabalançar os efeitos distorcivos ao comércio dos subsídios internos,
aplicados principalmente pelos
Estados Unidos.
Houve algum movimento no
sentido de eliminar os subsídios
às exportações, mas os EUA condicionaram-no a um "mecanismo para contrabalançar e/ou dissuadir as importações de produtos agrícolas subsidiados provenientes de países não-membros
da Alca".
Traduzindo: os norte-americanos não querem que os europeus,
cujos subsídios são pesados, se
beneficiem da eliminação dos
subsídios nas Américas.
"Não pedimos coisas impossíveis, mas houve pouca receptividade de outros países", atacou,
em entrevista coletiva do Mercosul, o vice-chanceler argentino
Martín Redrado, presidente de
turno do Mercosul.
Mais: "São os outros que têm
que se mover neste momento".
Resposta indireta de Allgeier, na
coletiva dos co-presidentes: "A
negociação não será bem-sucedida se só um país se mover" (referindo-se aos próprios EUA).
Redrado preferiu não "apontar
dedo acusador" para país nenhum, quando a Folha quis saber
quais seriam os que mostraram
"pouca receptividade". Mas afirmou que "restrições domésticas
estão impedindo avanços", em
óbvia alusão à pressão dos produtores norte-americanos para preservar o protecionismo na área
agrícola.
Retruca, com a mesma frase,
Ángel Villalobos, negociador mexicano: "Pressões domésticas impediram flexibilidade", aludindo,
por sua vez, ao Brasil, país tido como refratário à Alca pelo G14, o
grupo liderado por Estados Unidos, Canadá, Chile, México e Costa Rica, que se opôs ao Mercosul
durante a reunião de Puebla.
Vê-se, por essa troca de chumbo
retórico, que há boas chances de o
"recesso" transformar-se de fato
em "fracasso", quando o CNC retomar sua 17ª reunião, em Puebla.
A menos que Allgeier esteja correto ao avaliar que, depois da mudança decidida em Miami, o processo entrou em uma fase de "tentativa e erro" e de avaliação de
"qual a margem em que cada país
pode operar".
O erro foi cometido na semana
passada. Se será corrigido na nova
tentativa, no próximo mês, é
questão em aberto.
Texto Anterior: Emergentes: Recomendação de papel brasileiro é mantida Próximo Texto: Análise: Surpreendido, Mercosul teve que sair ao ataque Índice
|