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LUÍS NASSIF
Billy Blanco e a gafieira eclética
Na discografia brasileira
da segunda metade do século
20, poucos autores construíram
obra tão rica e diversificada quanto Billy Blanco. Batendo nos 80
anos, Billy foi dos autores fundamentais na transição da música
brasileira do chamado período de
ouro para a era moderna.
Nasceu em Belém (PA), em 1924.
Mudou-se para São Paulo, fez arquitetura no Mackenzie e tornou-se cidadão emérito do Rio, quando conheceu o arquiteto Sérgio
Bernardes -que conseguiu para
ele uma vaga na Faculdade de Arquitetura e Belas Artes do Rio, um
emprego de desenhista no seu escritório e o acesso ao mundo musical carioca da época.
Foi nesse ambiente, no início dos
anos 50, que Billy ajudou a construir a ponte entre os dois períodos
da música brasileira. Sem nenhum formalismo, sem preconceitos, transitou pelo samba sincopado, pelo crônica de costumes, como seu primeiro ídolo, Noel Rosa,
passou pelo samba-canção, compôs sinfonias populares e jamais
parou de compor.
Os compositores que o introduziram no meio musical carioca foram dois coronéis, dos mais brilhantes do período de transição do
samba-canção, Armando Cavalcanti e Klecius Caldas, recentemente morto.
No Rio, o iniciante Billy logo
aproveitou tudo o que tinha direito. De cara passou a conviver com
o multiinstrumentista Aníbal Augusto Sardinha, o Garoto, e Radamés Gnatalli.
Seu primeiro grande sucesso foi
"Estatuto da Gafieira", composto
em 1954 para a então iniciante
Inezita Barroso e que acompanhou o repertório de nossa turma
por todas as décadas seguintes.
Talvez você não conheça essa faceta da Inezita, a de cantora de samba sincopado. Era divertidíssima e
com um balanço agradabilíssimo.
Na infância, meu pai não se cansava de ouvir outra música de
Billy gravada pela deusa cabocla,
o "Moleque Vardemá".
Antes do "Estatuto da Gafieira",
Billy havia conseguido emplacar
sete gravações, com Linda Batista,
Anjos do Inferno e Dick Farney,
além da primeira, "Rotina", com
Mary Gonçalves.
Depois, Aloysio de Oliveira contratou-o para o prestigiado selo
Elenco. No meio desses veteranos
começava a explodir a luz de Tom
Jobim, parceiro de Armando Cavalcanti e de Marino Pinto em algumas canções. Compositor e letrista, Billy foi atrás de Tom e tornou-se seu parceiro antes mesmo
que Tom descobrisse Vinicius de
Moraes. Nasceu daí, entre outros,
a obra-prima "Sinfonia do Rio de
Janeiro", com coro, orquestra e arranjo de Radamés.
Em 1954, ainda com Tom, compôs "Teresa da Praia", uma parceria inesquecível na composição,
para uma parceria inesquecível
na interpretação, Dick Farney e
Lúcio Alves, os dois mais sofisticados cantores da época. Em 1956
compôs "Mocinho Bonito", que
permitiu a Doris Monteiro, a mais
bela cantora que o Brasil produziu, migrar dos boleros mexicanos
para a pré-bossa nova -e, de lá,
para a bossa.
"Piston de Gafieira" é de 1959
("Na gafieira segue o baile calmamente / Com muita gente dando
volta no salão"). Ainda em 1959
conheceu um jovem violonista de
18 anos, de nome Baden Powell,
com quem compôs, na estréia, um
dos clássicos da música brasileira,
o "Samba Triste" ("Samba triste /
a gente faz assim, / eu aqui, você
longe de mim").
E não parou mais. De sua influência maior, Noel Rosa, trouxe
a inspiração para as sátiras de costume, como "A Banca do Distinto", "Mocinho Bonito".
Até o ex-governador da Guanabara Carlos Lacerda foi parceiro
em uma peça de teatro importada
da Broadway, "Como Vencer na
Vida sem Fazer Força", produção
de Alfredo Machado e Oscar Ornstein. Fez a adaptação de 18 músicas da peça enquanto Lacerda se
ocupava de traduzir os diálogos.
Da brilhante geração pré-bossa
nova restam poucos sobreviventes.
Garoto morreu cedo, Bonfá morreu depois. Restam Braguinha e
Dorival Caymmi, anteriores, e
Billy e Johnny Alf, precursores
imediatos.
Longa vida a Billy.
E-mail - Luisnassif@uol.com.br
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