|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Utilização de polígrafo é inconstitucional; nem mesmo a polícia pode usar o aparelho sem autorização judicial
Detector de mentira seleciona trabalhador
DA REPORTAGEM LOCAL
A "lista negra" não é o único tipo de discriminação sofrido pelo
trabalhador brasileiro. A Folha levantou casos de empregados que
tiveram até de passar por detector
de mentiras para conseguir uma
vaga e ou permanecer nela.
Em junho, Benedito Valentini,
juiz da 36ª Vara Trabalhista de
São Paulo, condenou a American
Airlines a pagar uma indenização
de cerca de R$ 190 mil para Rita de
Cássia Martinhão Irigoyen, 36,
por entender que ela sofreu danos
morais a ser submetida a detector
de mentiras (polígrafo). A empresa recorreu da decisão por considerar que Rita de Cássia saiu da
empresa por outros motivos.
Rita de Cássia trabalhou seis
anos -até 2000- no setor de
inspeção de segurança da aeronave e de passageiros da American
Airlines. Durante esse período teve de passar várias vezes pelo polígrafo -o aparelho que realiza o
teste é parecido com o que executa o eletrocardiograma.
"Todo funcionário que trabalhava na área de segurança era
obrigado a passar pelo detector de
mentiras na hora da admissão e
depois uma vez por ano para reavaliação. E quem se recusava a fazer o teste era demitido."
Ela admite que saiu da companhia por causa de desentendimentos com sua chefia, mas que
sempre contestou o fato de ser
obrigada a passar pelo polígrafo.
Ela diz que a American informa
que faz teste por motivos de segurança das aeronaves e dos passageiros, mas as perguntas feitas, segundo ela, não tratam disso -são
exclusivamente pessoais.
Algumas das perguntas, diz,
que foram feitas a ela: se reside em
casa própria, se esteve hospitalizada nos últimos dez anos, se usa
bebidas alcoólicas, se tem antecedentes de desonestidade, se cometeu violações de trânsito, se teve sua habilitação suspensa, se deve para alguém e, ainda, se em
emprego anterior roubou algo de
valor maior de R$ 70.
A American Airlines admite
que usa o detector de mentiras
por considerar necessário para
manter a segurança dos passageiros (leia texto ao lado).
Escândalo
"Isso é um escândalo. Utilizar
polígrafo no país é proibido por
lei. Fere a Constituição Federal
-artigo 5º inciso 10º- e outros,
que tratam da proteção da honra
da vida privada. Nem a autoridade policial pode colocar bandido
no polígrafo", diz Luís Carlos Moro, advogado que cuida da ação
movida por Rita de Cássia.
Cristiane Saldanha, 33, ex-supervisora de segurança da American, também busca indenização
na Justiça por ter sido submetida
ao detector de mentiras. "Passar
por essa situação foi humilhante,
eu me senti mais do que insultada, mais do que estuprada."
Ela conta que trabalhou na
companhia por cinco anos, e passou pelo teste do polígrafo em 97.
"No ano anterior, estava grávida
e não me interrogaram porque a
pressão era muito grande. Presenciei até um funcionário desmaiando quando soube que teria
de passar pelo detector de mentiras. É um trauma. Você fica de
costas para a parede com um funcionário que vem dos Estados
Unidos para aplicar o teste."
Cristiane, que hoje trabalha como autônoma na promoção de
eventos, diz ter sido demitida por
problemas com sua chefia. "Perguntei qual foi meu erro ao meu
chefe até porque não queria falhar
no próximo emprego, mas não
deram explicações. Fui mandada
para o departamento pessoal para
acertar minhas contas. Essa é a
forma que o trabalhador é tratado
no país."
(FF e CR)
Texto Anterior: Parente de quem vai à Justiça também fica sem emprego Próximo Texto: Terror explica procedimento, afirma empresa Índice
|